sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Que venham os 50

Elaine Tavares
Quando eu tinha 20 anos me assombrava um medo: fazer quarenta. Mas, esse medo não era do prosaico envelhecer, que sempre achei muito charmoso. Não! Era o medo de perder a consciência de classe. Naqueles dias eu reparava que as pessoas, passados os 40 anos de vida, mesmo as mais aguerridas e militantes, iam desmilinguindo, esmorecendo, perdendo a radicalidade. Alguns viajavam para a França, outros compravam casas gigantes, e outros simplesmente se rendiam ao sistema repetindo o mantra: “não há como lutar contra isso”. Então eu tinha medo. E eu? O que faria quando todas as ilusões se perdessem aos 40 anos? E, na medida em que esse tempo chegava, eu ia estremecendo.
Então veio um dia a manhã dos 40. Acordei sem pressa, a cabeça espiando por baixo da coberta. Aquele radiante dia de maio poderia ser meu fim. Ressabiada, saí da cama e corri ao espelho, nada mudara. Ufa. Tomei banho e saí para a rua. Tudo normal. A indignação no ponto do ônibus sinalizou que eu estava bem. No trabalho, arrumei algumas encrencas. Hum... Tudo certo. Os dias passaram e eu seguia firme, sem claudicar.
Agora aqui estou. Já se passaram oito anos do fatídico 40 e eu ainda sei quem sou. Nas lutas pelo transporte, pela moradia, pela segurança, pelo HU público, pela Vale, pela Embraer, contra o Lula, contra os transgênicos, pela universidade, pela comunicação livre, pela minha categoria. Nas passeatas, nos encontros, nos debates, pelos trabalhadores, contra a opressão. Faço revista, faço jornal, escrevo blogs, crio páginas, faço as palavras voarem. Sei quem sou e onde estou. Sei pelo que lutar e não me deixo render pelo canto da sereia da babilônia em chamas.
Outro dia, durante um ato, me vi no reflexo da vitrine. Ali estava, na minha madurez. Os cabelos revoltos, a pele cansada, a bunda já caída. Mas os meus olhos... Ah!...estavam cheios de eternidade! Então, num átimo, vi a guria de 20, que um dia eu fui, sorrir pra mim. Ali estava eu. Inteira! Que me esperem os 50... Ainda tenho todas as minhas ilusões.

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