segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Carta a uma amiga

Minha querida,o nosso Reino não é deste mundo nem do Outro. O nosso Reino singra no intermediário, que só pode ser alcançado pela arte:seja ela qual for: escultura, música, pintura, dança, teatro, poesia, prosa, dona de casa. Escuto o que grafou Cecília Meireles: "Irmão das coisas fugidias, não sou alegre nem sou triste, sou poeta". Não devemos ser felizes nem infelizes, mas atentos à grande árvore que cresce no ouvido. Nosso reino não deste mundo nem do Outro. Nosso Reino é a serenidade livre. Devemos estar atentos à pulsão e pulsão nada mais é que do "discernimento vital". A arte: discernimento deste discernimento. Se somos ditadores, somos fel. Se discernimos, acordamos a pétala que respira na sombra. E pulsão, o que também pode ser? Um objeto jamais fixável de uma vez por todas. É como se disséssemos que estamos aqui para fixar o que habita no invisível. Palavras do poeta Dennis Radünz: "O invisível é o excesso de não ser". E o que chamamos Arte nada mais é que o ato de fixar o discernimento: a pulsão. E a cura? Escutar, no símbolo, pulsão de vida. Se vejo um jarro d'água, por exemplo, tenho consciência de que ele é, ali onde posso vê-lo dentro de mim, apenas uma imagem fugidia. Para captar esta imagem fugidia, antes devo ter uma espécie de afeto por esta imagem. Depois tentar fixá-la com os meios que a Arte me oferenda. Não é ao significante (à palavra) que se deve escutar, mas à vida, ao afeto, que já traz em si sua plêiade de significantes (palavras). Agora me entenda, minha amiga: trago algo em minha alma que se parece muito contigo. O meu lado feminino está em sintonia com teu mistério feminino. Contudo não devo confundir você com minha alma. Mas você tem sido minha mestra, sim, e por isto me sinto tocado pela tua existência. Eu devo cuidar de minha alma e desejar que cuides de ti. Antes de amar a você, devo amar este Reino que não é deste mundo e que se entrelaça a meus oboés. Isto aprendi, por isto te escrevo agora.
Um beijo.
Fernando José Karl

A respiração das mulheres

Por Fernando Karl
Mulheres em flor no fundo do rio respiram se eu sonho com elas. O rio é um diamante líqüido e eu investigo mulheres em flor. Por cima de minha cama, se eu acordar, elas somem. Por isso olham, compenetradas, as mulheres que vêm à tona do rio. Voam entre caaobás e barcos. Voam e sabem, com pavor, que devem cultivar meu sono. Nele é que estão floridas, ao lado de ventos que, vindos do alto, suavizam a respiração do meu sonho.

A sagração dos ventos

Por Fernando Karl
O pesadelo de K.: "Nunca estive aqui. Respiro ao modo antigo, e a matéria clara de uma Cassiopéia, que move cristal de rocha e músculo, turva-me ainda mais do que o Deus da respiração. Manah, em sânscrito: 'mente'. O vocábulo santo — Deus — igualmente do sânscrito, é grafado D'jeus e significa 'lua clara no céu: mente silenciosa, sem sonhar'. No sono já sei que o sonho é uma astúcia da vigília. No pesadelo do sono estou no calabouço, vocifero, estou no calabouço, amarrado a um tronco e à espera do interrogatório noturno. Uma nova estrela ventila as vértebras e nelas eu teclo uns acordes da Sagração da Primavera, de Stravinski. Lá, acima dos claustros altos e românicos do castelo de pedra, os ventos nunca dormem. Aqui, no calabouço, a alma cativa, chagada toda, está em carne viva. Neste lugar de lodo amor não há e o peixe de escuro dorso pétreo dilacera, com seus dois aguçados dentes de morsa, com seus dois graúdos dentes de morsa o calafrio escalavra a alma sensível. Calabouço, onde eu dormia num catre rude, mas limpo. Ali me curvei ao vasto Vazio, tendo nas mãos caules frágeis. Naquela noite em que enfiaram homens, mulheres e crianças nas câmaras de gás, naquela noite eu atravessei o pátio gelado do calabouço e, à sombra noturna de árvores, encontrei o Vazio sentado num dos bancos rociados pela neblina. O Vazio com a cabeça enterrada entre as mãos".

domingo, 26 de outubro de 2008

Pobres 15 em breve!

A edição número 15 de Pobres & Nojentas circula na próxima semana com reportagem especial sobre a privatização da saúde em Santa Catarina. Não perca! À venda na banca da UFSC e na da Catedral, em Florianópolis.
Imagem de Leopoldo Nogueira

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Equipe da Pobres na rua



A loira da equipe da Pobres & Nojentas, Marcela Cornelli, trabalhando na manifestação realizada nesta quarta-feira, 22, em Florianópolis.
Os bancários e bancárias da base do SEEB Florianópolis e Região, que completam 15 dias em Greve nesta quarta-feira, e os servidores do Hemosc e Cepon, que entraram em greve nesta segunda (20), fizeram um Ato conjunto no Largo da Catedral, entre as agências do Banco do Brasil e do BESC, no Centro de Florianópolis. Também estavam representados os servidores da UFSC e dos previdenciários.
Marcela irá assinar, na próxima edição da Pobres, que circula no final de outubro, reportagem sobre a privatização da saúde em Santa Catarina. Dá-lhe, loira querida!!!

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Os gatos, esses anjos


Elaine Tavares
Os gatos que vivem na minha casa são incríveis demais. Todos os dias eles ensinam coisas belas sobre ser família, por exemplo. A Juanita deu à luz dois gatinhos, o Tupac e a Anita, e a Bartolina, que é mãe da Juanita e, portanto, avó dos dois pequenos, não os deixa sozinhos nunca. Elas (mãe e filha) dormem abraçadas enquanto amamentam (ambas) os fedelhinhos. Já o pai, bueno... Este fica pelo pátio, como um rei.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Nildo Ouriques é o convidado de "Diálogos com o Conhecimento"

O Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina e a Assembléia Legislativa promovem no dia 20 de outubro, segunda-feira, às 10 horas, na Sala de Imprensa da ALESC, a primeira edição de “Diálogos com o Conhecimento” com o professor de Economia da UFSC Nildo Ouriques. O tema será a crise nos Estados Unidos e na economia mundial.“Diálogos com o Conhecimento” é um projeto que tem a seguinte dinâmica: realização de uma ação mensal para aproximar o Sindicato dos Jornalistas dos filiados e esses das temáticas relevantes para ampliar o conhecimento para a vida para o trabalho.
A proposta do “Diálogos” é organizar uma conversa em pequeno grupo – prioritariamente formado de jornalistas – com pessoas especializadas em determinadas áreas do conhecimento, seja ele formal ou popular. O objetivo é que a pessoa possa apresentar um panorama sobre o assunto em foco e ser sabatinada pelos jornalistas, promovendo assim uma melhor compreensão acerca dos temas complexos da conjuntura e propiciando a melhoria da qualidade dos textos.
Com este projeto pretendemos fazer com que os jornalistas possam ficar sempre em dia com os temas mais quentes da atualidade, priorizando um olhar independente e alternativo sobre os fatos.Não perca! O SJSC e a ALESC irão divulgar os Diálogos sempre com antecedência para que os jornalistas organizem a agenda e participem.

Dia 20/10 - 10h - Sala de Imprensa da ALESC

Saúde à venda em Santa Catarina


Quinta-feira, 16 de outubro, chuvosa em Florianópolis, mas a gente do movimento sindical e popular fez caminhada da Assembléia Legislativa até o Terminal Central do transporte coletivo para denunciar a privatização da saúde em Santa Catarina. O Hemosc e o Cepon (sangue e derivados e tratamento oncológico, respectivamente) agora estão nas mãos de uma Organização Social, que desorganizou as duas unidades de saúde para fazê-las dar lucro. Essa história será contada na edição de setembro/outubro de Pobres & Nojentas.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Crise? E eu com isso?

Por Elaine Tavares - jornalista

É o que mais se ouve no rádio e na TV - essa fábrica que vive da mais valia ideológica, como bem analisou o grande pensador venezuelano Ludovico Silva - “a crise, a crise, a crise”. Começou lá nos Estados Unidos e quase ninguém sabe muito bem por que. Os locutores falam de uma quebra nos bancos causada pelo não pagamento das hipotecas e as pessoas, jantando, não conseguem entender o que isso significa. Bueno, ao que parece, as pessoas pegaram empréstimos para comprar moradia e agora não têm dinheiro para pagar. Fico pensando na política do governo Lula que, por conta do “crescimento da economia” fez convênios com Bancos para garantir que os trabalhadores pudessem se endividar de forma tranqüila e sem qualquer entrave, com desconto em folha. A CUT aprovou a idéia e o povo começou a corrida aos bancos para tirar dinheiro e consumir, consumir, consumir. Penso que é um pouco por aí o que aconteceu por lá, na nave mãe.
Também, na televisão, já se começa a ver reportagens sobre o aumento do preço disso e daquilo, e os jornalistas avisam em tom de ameaça: “é a crise, ela vai pegar todo mundo”. É quase como a trilha sonora do Tropa de Elite. Ninguém vai escapar. Assim, pelas ruas, as pessoas vão internalizando a idéia de que há uma crise, portanto, é normal que os preços comecem a subir. Vem a pedagogia do medo e os pequenos burgueses principiam a comprar bastante carne para congelar nos abarrotados freezers, esta peça escrota da acumulação sem necessidade. Já os que não têm freezer... que se danem! “Estamos todos no mesmo barco”, dizem os economistas e analistas de TV. Só que esta é mais uma mentira do sistema. Podemos até estar no mesmo barco, mas a divisão de classe garante que haja os que tomam champanhe na cobertura e os que remam nas galés. No final, quem é que salva o barco mesmo? São os remadores, sempre os remadores. O povo das galés!
Nos noticiários internacionais chegam as notícias de gente que perdeu tudo o que tinha. Choro e ranger de dentes. Mas ninguém pergunta por que motivo afinal esta gente entrou na onda das aplicações voláteis da bolsa. A promessa capitalista do lucro fácil, sem esforço. Bota a grana ali e ela vai render, pronto. Poucos são os que falam dos riscos do sistema. É que o capitalismo é bom de propaganda e tem o controle da fábrica de ideologia. E lá se vão as velhinhas e os trabalhadores comprar ações. Aqui no Brasil também há um incentivo para que os trabalhadores usem seu décimo terceiro salário ou suas economias e apostem no cassino financeiro. E pasmem, existem sindicatos e centrais que fazem campanha para que isso aconteça. A idéia de que o trabalhador comum pode ser um empreendedor é hegemônica.
E as emissoras de TV, com seus oráculos bonitinhos, se apressam a falar que, se é preciso que as gentes apertem os cintos por conta da crise, não é necessário temer. O estado já interveio. Já colocou bilhões de dólares para salvar os banqueiros, afinal, como poderíamos viver sem bancos? Já os que apostaram suas economias nos cassinos financeiros, bom eles tinham de saber que havia riscos. Perderam e pronto. Paradoxalmente serão eles os que salvarão os banqueiros, pois afinal, o dinheiro público de quem é?
O capitalismo é bicho esperto, tem seus pedagogos da beleza, do engano, da ideologia embotadora. Vai minando a consciência de classe. Pois, o que fazer, se os sindicatos brasileiros, em sua quase esmagadora maioria, estão domados? O que fazer se as centrais sindicais gerem fundos de pensão e fazem campanha para que os trabalhadores se endividem? Como falar de socialismo e de distribuição da riqueza num tempo em que as pessoas estão em retirada, tentando salvar o que lhes resta da enganação do capital? Poucos são os que se dão conta de que a questão não é a crise em si, o salvar-se agora, o apertar o cinto esperando a tormenta passar. Esta é a tormenta mesma. E ela só está mais forte no momento, mas é a mesma ventania capitalista que tudo arrasa, até as consciências, todo o santo dia e todo dia santo.
Para os trabalhadores está dado o desafio. Vivemos até agora um tempo de arar a terra, de estudar, de desvelar os horrores econômicos impostos pelo sistema. E também estão aí os exemplos do que pode fazer a luta coletiva que tem como pilar mestre a idéia de povo – gente em luta. Está aí a Venezuela, o Equador, a Bolívia, onde a falência de instituições como sindicatos, governos e partidos levou ao crescimento dos movimentos sociais a às transformações cada dia mais radicais. Não dá para sentar diante da TV e acreditar que o capitalismo acabou. Ele é matreiro, manhoso e se recompõe muito rapidinho, a história nos mostra.
As crises cíclicas do capital mostram o quanto este sistema é predador e a cada uma delas fica claríssimo que quem perde sempre são “los de abajo”. Então é preciso sair às ruas, pedagogicamente retirando o véu do engano,” explicando, provocando a consciência de classe. É hora de movimento, de semear. Mas, fundamentalmente, é hora de anunciar a boa nova: sim, é possível viver de outro jeito, organizar a vida de outra forma. Exemplos há e é tempo de espalhar a notícia.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

P&N 15 no forno!

A equipe de P&N já está produzindo a edição 15 da revista Pobres & Nojentas, que deve circular no final do mês. Aguarde assuntos quentes, textos tinindo de bons!

domingo, 12 de outubro de 2008

Bom dia!



Míriam Santini de Abreu
Dos livros das séries de infância eu adorava o poema As meninas, de Cecília Meireles:
Arabela
abria a janela.

Carolina
erguia a cortina.

E Maria
olhava e sorria:
"Bom dia!"

Arabela
foi sempre a mais bela.

Carolina
a mais sábia menina.

E Maria
Apenas sorria:
"Bom dia!"

Pensaremos em cada menina
que vivia naquela janela;
uma que se chamava Arabela,
outra que se chamou Carolina.
Mas a nossa profunda saudade
é Maria, Maria, Maria,
que dizia com voz de amizade:
"Bom dia!"

E então encontro essa velha casinha, na beira de uma estrada, e penso nas três meninas. Eu sempre quis ser Maria, saindo janela afora tal como a arvoreta, com cheiro de sol, espalhando bons dias. Janela aberta, cortina erguida - o esforço de Marta. E Maria, célere aos pés do Criador, a sorrir...

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Bancários em greve e na luta

Cena rara no mundo do trabalho hoje em dia: assembléia lotada. Imagem potente. Homens, mulheres e o menino, bancários em greve, trabalhadores no setor que mais lucrou no país. Eles exigem aumento real de 5% (a proposta dos patrões é de apenas 0,35% acima da inflação), valorização dos pisos salariais, participação nos lucros e resultados (PLR) maior e simplificada, fim das metas abusivas e do assédio moral. Notícia completa abaixo:

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Declaração de amor

Elaine Tavares, jornalista

“É hora das fornalhas, e não há de se ver senão a luz”. José Martí
De novo, junto com a aurora, vem o meu comandante. Este homem lindo que num tempo mágico juntou teoria e ação. Homem moral, homem ético, revolucionário, apaixonado e apaixonante. El Che, Ernesto. O guri asmático, arfante e renitente. O mocinho indômito, curioso e rebelde. O caminhante desta Abya Yala, assombrado com as gentes. O médico generoso, o soldado disciplinado, o homem charmoso, o político coerente. Tinha como obsessão a conseqüência prática de cada posição política que defendia. Não era homem de discurso vazio.
“Há que estudar, e estudar, e estudar. O bom revolucionário precisa ser o mais próximo do perfeito. Perfeito em casa, no trabalho, no partido, na vida”. E era assim que ele mesmo fazia. Leitor compulsivo, trabalhador incansável, militante conseqüente. Nunca se vitimizou. Mesmo nas horas mais duras, quando o ar lhe faltava em plena selva, ele prosseguia sem proferir um ai. Sabia bem que aquele que se entrega a algo, com tanto amor, o faz sem alarde.
Este homem único fez concreta a palavra solidariedade quando percorreu as veias abertas de “nuestra América” e tomou partido junto aos empobrecidos. Todas as lutas que travou foram em nome do sonho de ver um mundo livre, justo, soberano, de riquezas repartidas. Morreu de pé, olhando no olho do carrasco. Seus olhos abertos, mesmo na morte, miravam o futuro. Ele não sabia, mas jamais estaria morto. Seu rosto cavalga nos peitos daqueles que amam a vida e sonham com o socialismo. Suas palavras ecoam nas cabeças dos que seguem a luta para vencer o capitalismo opressor.
“Será necessária uma guerra longa, uma guerra cruel. Que ninguém se engane quando for iniciá-la e que ninguém vacile por temor aos resultados que possa trazer ao seu povo. É quase a única esperança de vitória”. Aqui seguimos, comandante, amigo, subindo nuestras sierras maestras. Venceremos? Não importa... O que vale é subir a montanha, seguindo tua sombra gigante, tua querida presença. Lá na frente, o mundo novo, aquele, com o qual sonhamos, nos espera! E, em cada passo, vamos fazendo acontecer...

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Efeitos luminosos-eleitorais

Foto da muvuca no centro de Florianópolis na sexta antes da eleição. A qualidade é terrível, mas o efeito de luz ficou delicioso.

domingo, 5 de outubro de 2008

Céu bíblico

Ficará assim o céu às vesperas da grande onda?

Foto de Rogério Pedro dos Santos

Novidades da Pobres

Quem são essas pessoas? Onde elas estão? Veja na próxima edição da Pobres & Nojentas, que circula no final de outubro! A foto é de Ricardo Casarini.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Apetitosos "monstrinhos"

Míriam Santini de Abreu

Dois sabores de infância que me comovem: o de alcachofra e o de favas. Me regalo com ambas e volto a ter 12 anos. Que prazer imenso era pescar uma alcachofra dentre as 4 ou 5 que a mãe colocava para cozinhar numa panelona, fazer a salmourinha e, uma a uma, sugar a folhas!
E então, quando elas começam a ficar macias, surge o miolo, branco, carnudo, cheio de pêlos. Cresci amando alcachofras, esses “monstrinhos”. A mãe as chama de artichokes.
E as favas! Ah, cozinhá-las e abri-las, a parte interna da vagem delicada como um veludo. E dentro as favas enfileiradas, parecendo mentex verde, com aquele gosto e cheiro de mato orvalhado.
Benditas sejam as alcachofras e as favas!