sexta-feira, 29 de junho de 2012

A FARSA DO VETO

Nós, cidadãos e entidades civis autônomas, vimos a público expressar nossa decepção e indignação com o dito VETO PARCIAL determinado pela presidenta Dilma Roussef ao Projeto de Lei relativo ao Código Florestal, no dia 25 de maio passado. Queremos deixar bem claro que a nosso ver, a presidenta ignorou drasticamente a vontade expressa pela população e pela sociedade civil organizada e compromissos assumidos pelo Brasil em nível internacional, como a Convenção sobre Diversidade Biológica, Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, entre outros. Além disto, Dilma descumpriu frontalmente suas promessas de campanha, entre elas a de que não aceitaria leis que aumentassem o desmatamento.

Muito se escuta que o apoio e a pressão do povo sobre o governo são fundamentais para que este possa assumir com coragem um papel mais ousado nas suas políticas, principalmente porque o fortaleceria no enfrentamento com os setores conservadores e retrógados, como a bancada ruralista, e na defesa dos interesses da maioria da população.

No caso do Código Florestal, o que assistimos foi exatamente o contrário: o governo, desde o início, esteve comprometido com o agronegócio, um setor que se nega a aceitar as inovações técnicas e científicas que incluem o respeito à natureza e sua capacidade de suporte, e ainda insiste em reproduzir relações sociais e políticas que remontam ao que há de mais sórdido e desumano na historia do Brasil, como trabalho escravo, superexploração dos trabalhadores e deslocamentos de populações tradicionais. Queremos lembrar que o governo atual e sua base aliada apoiaram desde o inicio o Projeto de Lei de Aldo Rebelo, da bancada governista, e em 2011 deixou claro de que lado estava, apoiando com a maioria de seus votos este projeto que já tinha a contrariedade da SBPC, da Via campesina, do Comitê Brasil em Defesa das Florestas, do qual fazem parte entidades como WWF, Greenpeace, MST, CNBB, OAB,Via Campesina, Marcha Mundial das Mulheres, entre outros atores sociais.

Já naquela ocasião o governo recorreu a subterfúgios e jogo de cena, realizando audiências publicas onde imperou consulta a setores seletos e apoiadores da proposta do governo e/ou a surdez diante das criticas, não sem incluir manipulações dos pequenos agricultores, como se estes fossem –como agora de novo querem nos fazer crer- os principais beneficiários da dita reforma do código. Entre idas e vindas do Congresso para o Palácio, o que marcou este processo foi a falta de democracia ou falta de interesse no diálogo do governo com a sociedade organizada e a ausência de consideração com princípios básicos de direito à informação.

A nosso ver, a forma final a qual o dito Código Florestal assumiu nada mais é do que um Código Agrário que interessa apenas aos ruralistas e grandes proprietários, bem como ao capital imobiliário que diretamente é contemplado em seus interesses com as alterações, já que estas atingem diretamente as cidades e áreas urbanas.

Este verdadeiro show de horrores vivido nos últimos meses transmutou-se na pirotecnia do final de maio, quando o governo transformou o veto absolutamente parcial e limitado (12 artigos de 84, alem de 35 alterações) em uma grande vitoria, como se a presidente tivesse realmente atendido aos apelos da sociedade. Ao contrário, ao vetar irrisórios artigos (14 de 84) e ainda alterar 35, o governo Dilma, na esteira do desenvolvimentismo, consolida o seu projeto econômico de crescimento retrógado, cujos efeitos sociais e ambientais fazem coro com Belo Monte, Jirau, e as obras dos mega-eventos que já neste momento tem trazido consequências negativas para as cidades, para o meio ambiente e para as populações mais pobres.

Infelizmente o lugar ocupado pelos parlamentares catarinenses neste processo foi o mais lamentável possível: apoiado na experiência vergonhosa vivida em 2008 em SC, o governador LHS seguiu atuando nesta irresponsável “vanguarda” da alteração em âmbito nacional. Relembrando: o Código Ambiental de SC foi alterado radicalmente naquela ocasião pela maioria na votação da Assembléia Legislativa, e foi construído dando base aos interesses e a mesma perspectiva que inspirou a seguir a reforma nacional.

Até hoje motivo de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, este Código Ambiental foi alvo de bravatas do então ministro Carlos MINC (PT) que ameaçou intervir no estado para garantir a legalidade ambiental. No entanto, não só naquela data não o fez, como agora presta seu apoio às mudanças nacionais e em seus estados de origem. Infelizmente se pode ver que, como dizia Marx, a história acontece primeiro como tragédia, e depois, como farsa.

É importante destacar que a situação acontece num contexto de desmantelamento de outros direitos sociais, entre eles o direito às terras tradicionalmente ocupadas e a constituição de unidades de conservação, alvo da PEC 215 que tramita no Congresso, e também PEC 438, referente ao trabalho escravo, entre inúmeras outras atrocidades que estão ou estiveram na pauta neste mesmo contexto político.

Enquanto militantes, movimentos e organizações da sociedade civil, brasileira e internacional, reunidos conjuntamente na Conferencia da Cúpula dos Povos, diante a situação do mundo exige maior rigor na legislação ambiental e no respeito aos povos tradicionais e recuperação de seus saberes, o Brasil marcou sua participação governamental na Conferência Rio +20 com a patética roupagem de Brasil - 20, aos níveis de responsabilidade social e ambiental de 1972.

Não podemos esquecer esta experiência, muito menos podemos esquecer de quem está cometendo este crime ao lado do governo e do agronegócio: eles tem nome, partidos e seguem buscando nossos votos para permanecerem no poder.

Isso é importante, pois tudo indica que se não barrarmos no judiciário nacional este crime contra a população e nação brasileira, será em nossos municípios que os crimes ambientais se realizarão pelas mãos de prefeitos e vereadores, a serviço do agronegócio e dos setores imobiliários especulativos.


Comitê em Defesa das Florestas e da Vida de SC



segunda-feira, 25 de junho de 2012

Unindo forças por uma cidade para as gentes

Por Marcela Cornelli

Em um esforço de construção coletiva, na tarde desse sábado, dia 23 de junho, militantes de movimentos sociais e sindicais de Florianópolis reuniram-se no auditório do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFSC para debater um Projeto Democrático para a Cidade. Participaram também candidatos às eleições municipais. Todos os presentes acordaram ser necessário e urgente se contrapor ao projeto das oligarquias que hoje estão no poder em Florianópolis, elitizando cada vez mais a cidade e excluindo os empobrecidos.
Apesar das diferenças ideológicas e de estratégias políticas do grupo presente nesse primeiro bate-papo sobre a cidade, questões como a falta de segurança, de saúde pública de qualidade, de mobilidade e de infraestrutura urbana, como saneamento básico, foram consenso em todas as falas. Foi lembrado que esse debate é de extrema importância nesse ano eleitoral para desmascarar projetos políticos coniventes com o capital, que governam a cidade excluindo da participação nas tomadas de decisões a classe trabalhadora, que é a grande maioria da cidade.

A imagem da Capital com maior qualidade de vida, onde todos vivem bem e felizes, têm moradia em lugares com paisagens paradisíacas, onde há saúde e qualidade de vida para todos precisa ser desconstruída para que e a realidade das comunidades empobrecidas e de classe trabalhadora venha à tona.

Foi lembrado ainda há necessidade de que o processo eleitoral seja usado também, por quem quer mudanças na cidade, como um momento de conscientização e politização da população no sentido de tirar as massas da alienação política em que se encontram, pois hoje a classe trabalhadora não consegue enxergar o quanto está sendo explorada e como o poder político está nas mãos de poucos; poucos estes que decidem o que é importante para a cidade e seus moradores. Decidem, é claro, sob a ótica dos donos do capital.

Foi colocado que é necessária a construção de um projeto político que permita a participação efetiva da classe trabalhadora. Outro importante consenso foi que esse debate deve ir além do processo eleitoral e ganhar as ruas, sendo levado até as comunidades.

O bate-papo foi marcado por intensos debates e análise da conjunta local, nacional e das lutas da classe trabalhadora pelo mundo, lembrando sempre que o capitalismo vive hoje uma crise estrutural e que há necessidade de mostrar ao povo que outra sociedade é possível, uma sociedade mais justa e igualitária.

Houve, saudavelmente, pontos de discordância entre os candidatos e correntes políticas presentes, mas o mais importante é que todos ali mostraram-se abertos ao diálogo para a construção de um projeto para a cidade que não seja excludente e que é sim necessário amarrar os candidatos que se dizem contra o poder oligárquico atual na luta por uma cidade melhor, não só no discurso eleitoral, mas também em ações concretas antes e depois das eleições.

O bate-papo foi um primeiro passo que elencou algumas prioridades de discussão, mas ainda há muito o que ser discutido. Além disso, a necessidade de ser retomada a unidade das lutas com uma agenda conjunta dos movimentos e tomando as ruas é urgente para barrar projetos como a privatização do Hospital Florianópolis e do Hospital Universitário, que estão prestes a serem entregues ao capital privado, da venda da Ponta do Coral, entre outros projetos nefastos que o capital, em conivência com o poder legislativo municipal, estadual e mesmo federal, tem imposto para a cidade, como também a necessidade urgente de abrir a caixa preta do transporte coletivo, entre outras lutas, como a luta por moradia, valorização da educação e dos serviços públicos. 

Basta lembrar que recentemente o SAMU foi privatizado e entregue a uma empresa paulista e que pouco os movimentos conseguiram aglutinar forças para barrar esse processo. Nesse sentido um segundo momento do bate-papo foi marcado para dar sequência aos debates e encaminhamentos, já com pauta mais específica como segurança, saúde, mobilidade urbana, para o dia 21 de julho (sábado). Em breve esse segundo bate-papo será divulgado amplamente para os movimentos

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Hospital Universitário: comunidade luta para não privatizar


Por Elaine Tavares  - jornalista

Os lutadores sociais e os sindicalistas de boa cepa tem uma triste sina. São sempre vistos como os arautos da desgraça. Estão sempre a clamar que alguma coisa muito ruim está vindo, que algo terrível vai acontecer. E o pior é que é isso mesmo. A desgraça vem. Foi o que ocorreu no que diz respeito ao Hospital Universitário. Desde o ano de 2007 que as pessoas ligadas ao movimento de luta por saúde de qualidade vêm dizendo que o governo quer privatizar esse que é o único hospital totalmente público de Santa Catarina. Ninguém nunca acreditou.

Quando estávamos na direção do sindicato dos trabalhadores da UFSC promovíamos uma atividade chamada de “café com sonho”. De manhã cedo, esperávamos as pessoas que vinham do interior do Estado, para serem atendidas no HU, com um café quentinho e a informação sobre as propostas governamentais de criar uma empresa privada para dirigir o hospital, desvinculando o mesmo da universidade. No geral, as pessoas pegavam o panfleto, liam, conversavam, se apavoravam, e era tudo. Voltavam para suas cidades e esqueciam. O que é natural, porque quem está doente quer mais é resolver o problema que lhe aflige.

Mas, no caso dos trabalhadores do HU a coisa era ainda pior. Como grande parte não gostava - e ainda não gosta - de conversas de sindicato, nem dava atenção ao que se denunciava. Os panfletos ficavam nos lixos ou jogados no chão. Os apelos para mobilização eram ridicularizados. “Lula não vai fazer isso”, ou “ esse tipo de coisa nunca vai acontecer”. E o tempo passou e a fundação privada vingou.

Apesar disso, muita coisa se fez. Matérias nos jornais sindicais, atos públicos, abraços ao HU. Um grupo de valentes lutadores - trabalhadores e estudantes - nunca esmoreceu. Mas não foi suficiente para barrar a tal da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, criada há pouco tempo. Na fala do governo federal – de onde saiu a proposta – vem a conversa mole de que é uma empresa pública. Não é. É de direito privado, portanto, vai atuar como tal. Seu objetivo é o lucro. E como se gera lucro no atendimento à saúde? A resposta vem do médico Pedro Carreirão Neto: “cortando serviços, diminuindo a qualidade e enxugando pessoal”. Então, imaginem o que vai acontecer se o HU for entregue a essa empresa. O que nem é tão bom, vai piorar.

A ideia do governo é de entregar mais de cinco bilhões de reais para criar a nova empresa. Se esse dinheiro fosse direto para os hospitais, quanto bem não faria. Mas não. Será criada toda uma estrutura gigantesca para administrar os hospitais universitários de todo o país. O objetivo do governo é diminuir custos. Mas, é uma incoerência. Como diminuir custos, criando mais gastos? Bueno, a resposta a essa questão é simples. O governo mente. A empresa de serviços hospitalares é uma exigência do mercado. Empresas, médicos, laboratórios, e mais uma série de abutres querem ganhar dinheiro com a saúde das gentes. E sem risco, porque vão ganhar tudo de mão beijada do estado. É um negócio espetacular.

Não é sem razão que o povo brasileiro vê, todos os dias, as grandes redes de comunicação lançarem matérias enormes sobre a falta de qualidade dos hospitais públicos. A campanha de demonização do que é público não é por acaso. Não acontece assim, de repente, a mídia se interessar pela saúde dos pobres. Tudo isso faz parte de uma campanha muito bem urdida de lavagem cerebral. Mostra-se, à exaustão, o horror dos hospitais, e depois vem a boa notícia: agora vai privatizar. Como se privatização fosse a solução para as coisas ruins que acontecem na saúde pública. É fato que o atendimento público não é bom, mas não há garantia nenhuma de o atendimento ser melhor na iniciativa privada. Pelo contrário. Se o que vai valer é o dinheiro de quem pode pagar, a coisa tende a ficar pior para os pobres.

Em Santa Catarina o governo do Estado já entregou vários hospitais para as malfadadas “organizações sociais”, espécie de ONGs que agora cuidam da administração dos mesmos. A lógica do lucro sobre a doença. Coisa muito perversa. Os sindicalistas estão aí, desde há tempos, denunciando, sem serem ouvidos. E a coisa foi se fazendo, urdida no silêncio, pois o que aparece para a população é que agora tudo vai melhorar. Quem precisa fazer uso de um hospital sabe que não é assim. Há algumas semanas os médicos de Santa Catarina vêm se mobilizando na denúncia dos horrores que estão vivendo nos hospitais. Áreas inteiras de hospitais são fechadas, atendimentos são centralizados na capital, há leitos desativados, equipamentos apodrecem sem uso por falta de pessoal. E agora? Dizer o quê? Muitos desses hospitais estaduais já estão em mãos privadas. Significa que o que alardeavam os “arautos da desgraça” era a mais pura verdade. Tudo ficou pior.

No último dia 19 de junho, o Sindicato dos Médicos denunciou mais um momento de horror. Uma pessoa sendo reanimada no chão, dentro do Instituto de Cardiologia de Santa Catarina, por falta de condições estruturais, ou seja, uma simples maca. Segundo o sindicato, não é raro que haja apenas um médico na emergência, o que inviabiliza qualquer atendimento de qualidade. O governo se faz de morto e ainda tem a cara de pau de dizer que não há falta de profissionais no sistema e que não irá chamar os novos concursados. Só no Instituto de Cardiologia seriam necessários mais 13 médicos e o dobro do pessoal de enfermagem. Mas, se a proposta das organizações sociais e agora a da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares é de cortar gastos, isso significa que essas reivindicações não deverão ser atendidas. Pelo menos, não sem luta.

No Caso do Hospital Universitário resta uma esperança. A universidade tem a possibilidade de decidir não aderir a essa proposta de ter o seu HU administrado pela empresa privada. O governo diz que cada universidade terá livre arbítrio, mas ao mesmo tempo trabalha pelas costas, espalhando o rumor de que aqueles que não aderirem à empresa privada poderão ter prejuízos na hora de buscar recursos. Segundo o doutor Carreirão Neto, essa chantagem é imoral e inadmissível: “O governo não poderá penalizar os HUs que não aderirem, isso seria por demais perverso”. A vice-reitora da UFSC, Lúcia Helena Pacheco, durante um seminário promovido pelo Fórum Catarinense em Defesa do SUS e contra a Privatização, disse que a nova administração ainda está tomando pé da situação, e que já pediu mais prazo ao governo para discutir o tema. “Nós vamos fazer um fórum, um debate, enfim, vamos ouvir a comunidade. Nenhuma decisão vai ser tomada sem isso”, afirmou.

De qualquer forma, ouvir a comunidade não é suficiente. A começar pelos próprios trabalhadores do HU, a maioria sequer sabe o que vem a ser essa empresa privada e quais os problemas que ocorrerão caso ela venha a administrar o HU. Assim, conforme sugeriu o professor Irineu Manoel de Souza, é necessário que as pessoas – trabalhadores, estudantes e comunidade – sejam informadas do assunto para depois, com clareza do que isso pode significar para a vida dos catarinenses, decidir. É bom lembrar que o HU atende pessoas de todo o estado de Santa Catarina, com mais de 30 mil consultas por mês, sem contar as internações. Assim, o certo é que também as prefeituras de todo o estado informassem à população. Com a nova empresa, privada, administrando o HU, estaria aberta a porta para o atendimento por plano de saúde e qualquer ser humano sabe que entre um “cliente” endinheirado e um pobre sem recursos, a escolha no mais das vezes tenderá a recair no que pode pagar, já que numa empresa privada o que importa é o lucro.

Assim, o encaminhamento do Fórum é de que a população se levante em luta contra mais essa selvageria capitalista que pretende tomar corpo agora no Hospital Universitário. Vários hospitais do Estado já estão em mãos de OSIPS – as tais organizações sociais – e a população está cada dia com menos opções de atendimento público. Assim, não basta só defender o HU, há que se fazer a luta pela retomada dos demais hospitais estaduais que estão orbitando o círculo do lucro com a doença.

Como fazer para se manifestar? Há várias maneiras. Organizar frentes de luta nas cidades, seja através de sindicatos combativos, seja através de associação de moradores. Pressionar os prefeitos, o governador. Participar das atividades chamadas pelos sindicatos de trabalhadores da saúde. Enfim, juntar-se ao movimento. Um sindicato sozinho não consegue muita coisa. É necessário que as gentes se mexam e ocupem as ruas. Nada no mundo vem de graça para os pobres, os trabalhadores, tudo é conquistado à duras penas. Há muita gente se organizando, então, encontre esse povo aí na sua cidade, e mobilize-se. A saúde pública é um direito das gentes. Vamos garantir, na luta, que ele seja exercido.

Basta de enganação e basta de abutres lucrando com a dor do povo. Fora empresas privadas da saúde pública do Brasil. As empresas que quiserem atuar na saúde privada, que arquem com seus riscos. Os recursos públicos precisam ser investidos na saúde pública.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Feliz solstício de inverno

Elaine Tavares
 
Hoje começa nova estação. É começo do ano para os povos originários das terras abaixo do Rio Bravo. Tempo de recolher, de limpar quintais, de podar árvores, de chá com mel, de sopa quente, chocolate. Hoje é dia sagrado, momento de celebrar. Desde os tempos imemoriais que os homens marcam o tempo na virada das estações. Tempo de plantar, de colher, de aquietar.
 
O inverno é tempo gris, de vento sul, de mar grosso, de virada para dentro. É estação do recolhimento, de repensar a vida, as escolhas, os caminhos.

Nesse primeiro dia do povo autóctone, na espinha dorsal da nossa América baixa começam as comemorações do Inti Raymi, festa mágica do povo andino. Na nossa terra Guarani é hora de aparecer no céu a grande Ema, o Ñhandu, bicho mítico que enche a terra e o céu, apontando um tempo de claridade.

É chegada a hora de retomar nossas memórias antigas, de oferecer um pago a terra, de render graças por estar vivo na entrada da nova estação, do novo ano. Porque, enfim, viver é um presente...

Feliz Solstício... Celebraremos com uma boa sopa de raízes, para lembrar da Pachamama, da Terra mãe, que dá vida e prato cheio.  
 

domingo, 17 de junho de 2012

Bate-papo Aberto e Franco em Defesa das Lutas Populares e Sindicais

Dia 23 de junho de 2012 - das 15 às 18h - Auditório do CFH na UFSC



Convite,



Nós, um grupo de militantes sociais, filiados ou não a partidos, porém cidadãos ativos nas lutas de nossa cidade e região dirigimos este convite para você por entendermos ser da máxima urgência estabelecermos um processo de debates, entre militantes do Movimento Popular, Sindical e Estudantil, de forma solidária, franca, aberta e fraterna, sobre a conjuntura política municipal e as perspectivas de luta por um "PROJETO DEMOCRÁTICO E PARTICIPATIVO PARA A CIDADE".



Partimos do pressuposto de que todos nós, participantes deste debate, independentemente de nossas opções político-partidárias, somos atores e referências para as lutas populares em Florianópolis, junto às bases sociais nas áreas de nossas atuações e, por isto mesmo, temos grandes responsabilidades pela transformação do quadro de hegemonia política, econômica, social e cultural exercido pelos setores conservadores e que predomina e submete a população à exclusão do direito a vida digna e a segregação social.



Sabemos que, historicamente, as elites vêm determinando o pensamento e as práticas políticas em todos os aspectos da vida, seja no quadro de nossas famílias ou de nossas relações sociais, na educação, no trabalho e até mesmo no nosso lazer, mas é no quadro concreto das lutas populares e sindicais dos trabalhadores que o embate se dá.



Enquanto nos mobilizamos desarticulados e agindo de forma pontual, pelas demandas específicas de nossos movimentos sociais, assistimos também à criminalização dos movimentos e a institucionalização da luta política dos trabalhadores por dentro das estruturas de governo, com avanços da direita fincados de forma absoluta, historicamente, no executivo, no legislativo, no judiciário e nos veículos de comunicação de massa.



Mas assistimos, também, à prática conservadora de grupos históricos da esquerda, privilegiando-se do poder ou digladiando-se pelas migalhas da participação nas estruturas burocráticas dos governos, os quais funcionam como verdadeiros instrumentos de cooptação de lideranças e movimentos, a serviço e manutenção do efetivo poder político instituído pelas classes dominantes locais e nacionais.



Por isso, com o objetivo de fortalecer a organização das lutas sociais e buscando a construção de reflexões coletivas, enquanto atores políticos dos movimentos sociais, das entidades comunitárias, dos sindicatos, dos partidos, e das correntes políticas, entendemos que precisamos nos unir para traçarmos, conjuntamente, nossa ação política em relação ao processo eleitoral municipal de 2012, como espaço político importante na conjuntura atual, para impedir o aprofundamento do conservadorismo na Prefeitura e na Câmara de Vereadores por mais 8 anos.



Achamos ser necessário trabalhar para dar forma e unidade ao que, de fato, pelas nossas práticas e compromissos cotidianos, pode nos tornar um possível grupo social com identidade política, princípios e estratégias, em defesa de nossas demandas e políticas públicas, com instrumentos de participação e controle social de gestão da coisa pública, a ser apresentada ao conjunto da população, para a disputa na sociedade, seja no processo eleitoral ou fora dele.



Julgamos que esta articulação pode se tornar uma base sólida para a construção de caminhos transformadores, independentes e autônomos de organização das classes trabalhadoras, em oposição às atuais relações de governo e poder na Cidade e no Estado e pelo atendimento aos objetivos e necessidades das maiorias da sociedade, inclusive para além das próximas eleições.



Acreditamos e partimos da idéia de que as possibilidades políticas, objetivas e subjetivas, existem de fato para os que ainda acreditam nos valores da militância popular solidária, fraterna, voluntária, independente e classista, e não dos que se movem por cargos, empregos e salários. Isto depende, basicamente, da nossa disposição de luta, articulação e apresentação como campo de referência política, para conquista das demandas das famílias das classes trabalhadoras, nas disputas eleitorais de 2012 e nos embates da conjuntura municipal.



Assim, entendemos que a unificação das forças dos movimentos sociais, possa e deva ser construída através de um "PROJETO DEMOCRÁTICO E PARTICIPATIVO PARA A CIDADE", que se contraponha politicamente ao domínio e ação das elites e oligarquias de nossa cidade e, portanto, seja orientador do debate proposto para o dia 23/06/12.



Pauta Preliminar para o Bate-papo:

1) Apresentação dos participantes, informes e as primeiras impressões dos companheiros sobre a Conjuntura Política em Florianópolis;

2) O processo eleitoral municipal de 2012, suas alianças, candidaturas e projetos políticos;

3) Nossas demandas coletivas de luta, nossas pautas e organização, a partir do que os movimentos sociais e dos trabalhadores vêm se mobilizando na cidade;

4) Encaminhamentos.



Saudações Democráticas!



Assinam:

Movimento Popular: Albertina da S. de Souza, Alexandre Lemos, Angela Liutti, Ataíde Silva, Augusto Marques, Denise Siqueira, Elaine Tavares, Elisa J. Silva, Glauco C. Marques, Fernando R. Matos, Hélio Carvalho, Jeffrey Hoff, Loureci Ribeiro, Míriam Santini de Abreu, Nivaldo A. da Slva, Raul Fittipaldi, Rui A. P. Alves, Ruy Wollf, Telma Piacentini

Movimento Sindical: Denilson Machado, Dino Gilioli, Elenira Oliveira, Marival Coan, Ricardo Freitas, Wolnei Chucre

Universidade: Carmen Tornquist, Carlos Vieira, Luiz Eduardo F. Teixeira, Manoel Arriaga, Marco Borges, Maria Inês Sugai, Maria Teresa Santos, Paulo M. B. Rizzo, Raul Burgos, Valcionir Correa, Werner Kraus Junior



ESPERAMOS CONTAR COM SUA DIVULGAÇÃO, SUA PRESENÇA E DE SEUS CONVIDADOS!

"Bate-papo" dos Movimentos Populares e Sindicais

Sábado, dia 23/06/12 - das 15:00 às 18:00h - no Auditório do CFH da UFSC

Todo mundo mente

Míriam Santini de Abreu

"House", a série de televisão que acompanho há oito anos, termina nesta semana. Final de série é triste. É como se despedir de amigos que irão em viagem sem data para voltar. Foi assim com "Arquivo X", que vejo até hoje, em DVD, porque gosto de pensar que Mulder e Scully continuam a investigar a conspiração do governo para ocultar a verdade sobre a invasão da Terra por alienígenas.
"House" é tocante porque, importando-se, faz de tudo para que pensem que não se importa. E vive com dor. Há um episódio em que um dos médicos que trabalha com ele é esfaqueado por um paciente, fica semanas em recuperação e na volta ao trabalho se apaixona por uma noviça que busca tratamento. No final do episódio, o médico decide provar a ela que a suposta "iluminação" espiritual que ela teve durante uma cirugia não passa do efeito da noradrenalina em seu cérebro. House tenta impedir o colega: - Vocês transaram e mal se conhecem. Quando o efeito da oxitocina passar, você não vai sentir o mesmo por ela e ela vai odiá-lo por ter tirado a crença dela.
O médico, depois de afimar que deseja mudar, responde que House é infeliz e não consegue mudar sua forma de ser, e, pior, deseja o mesmo para os outros. E House responde: - As pessoas mudam quando acham que cometeram erros. Você só foi esfaqueado!
Fora outra série que acompanho, não tem nada parecido com House na tevê. E sua máxima é inquestionável: - Uma verdade básica sobre os seres humanos: todo mundo mente.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Eu odeio a Samsung

Míriam Santini de Abreu

Há dois anos cometi a besteira de comprar uma câmera de vídeo usada da marca Samsung. Precisava de bateria nova, a velha estava viciada. Como a câmera não era de modelo recente, foi uma novela encontrar uma bateria na internet. Na autorizada Samsung de Florianópolis, a segunda que encomendei, quando chegou, era inadequada para o equipamento. Entregaram o modelo de outra filmadora. O pedido novo teve seu resultado concreto, o bateria, mas entregue quase dois meses depois do pedido. Mal usei o equipamento porque, do nada, a máquina pifou, e o sujeito no qual a levei para conserto disse que eu gastaria menos comprando outra. Dinheiro posto fora em filmadora, duas baterias inúteis e um microfone, que dei a uma amiga. Obsolescência programada. Que ódio.
Ano passado, em novembro, cometi a besteira de comprar um celular Samsung modelo GT-I5500B, 400,00, através de uma revendedora TIM. Pois no dia 23 de maio a engenhoca parou de carregar. Fui na TIM e me disseram que eu deveria apresentar nota e caixa do equipamento para ter outro celular. Ah, ah, a caixa!!! Então fui na autorizada Samsung em Florianópolis, pediram que eu apresentasse a comprovação da compra e assim voltei à TIM, que providenciou o documento, visto que o aparelho estava na garantia.
Deram prazo de cinco dias úteis; ligo; dizem que a bateria não é original, não é Samsung, e portanto terei que pagar 85 reais. Hora, como não troquei a bateria, imagino o que diabos aconteceu para a original desaparecer.
O fato é que, desde o dia 25 de maio, espero a chegada da bateria, que vem de Manaus – suponho que se segurando em cipós da floresta. Ligo para a autorizada e só ouço: não chegou. Hoje, 13 de junho, ligo novamente, exijo: “Me levem a seu chefe”, e informam: 4004-0000. Lá, fico sabendo que o pedido foi efetivado no dia 30 de maio, e o prazo é de 15 dias ÚTEIS, sem que haja qualquer definição de data para a entrega. Tenho um número de pedido, outro de confirmação, outro de protocolo... Só não tenho a bateria do celular e o celular.
Por isso essa campanha solitária: eu odeio a Samsung e nunca, nunquinha, compro outro equipamento desta empresa. Não comprem. Maldito sistema e suas “necessidades” inúteis.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Governo tripudia trabalhadores e espera pela greve

Por Elaine Tavares  - jornalista
“Na federal é assim. Todo ano tem greve”, dizem, entre risos, alguns estudantes. É como se fosse um ritual a cumprir, e algo que nascesse da “vagabundice” dos trabalhadores públicos que não querem trabalhar. É certo que tem algum trabalhador que se comporta dessa forma, mas não é a maioria. Se fosse assim, as universidades não funcionariam e nem seriam as instituições mais importantes do país, onde se cria 90% da ciência. Algum mérito os técnico-administrativos têm de ter nisso aí, porque nenhuma pesquisa, estudo ou extensão acontece sem esses trabalhadores.
E, como é comum nas relações de trabalho, todo os anos os trabalhadores precisam ter seus salários ajustados, pelo menos no que diz respeito às perdas do período, como acontece com qualquer outra categoria. Mas, entre os trabalhadores públicos não é o que sucede. Não há data-base para eles. Os salários só se reajustam se existe luta. E olha que é lei. E, como também ocorre com qualquer outro trabalhador, os públicos igualmente comem, vestem seus filhos, gastam com saúde, educação e tudo mais. Logo, precisam recuperar as perdas e, de quebra, garantirem um aumento real.
Não bastasse esse kit-básico da vida laboral que diz respeito a salário, os trabalhadores públicos lutam desde há anos por uma carreira. E o que é isso? A possibilidade de, entrando numa instituição pública, fazer carreira lá dentro, mudar de posto, crescer, como também acontece nas empresas privadas. Mas, isso, igualmente está fechado para os trabalhadores públicos. Não há proposta de carreira e uma criatura, ao entrar num cargo, ali fica até morrer, mesmo que estude e se qualifique. Fora isso, ao longo dos anos, por conta dos governos de plantão, muitas outras desgraças se abateram sobre o funcionalismo – principalmente os do executivo. Cargos importantes foram extintos, funções iguais ganharam salários diferenciados, aposentados foram mal enquadrados na tabela salarial, enfim, um festival de horrores.
Tudo isso vem sendo discutido com o governo, sem avançar um passo sequer. Na greve do ano passado, os trabalhadores ficaram quase três meses parados e as negociações não avançaram em nada. O governo exigiu o fim do movimento para apresentar uma proposta. Os trabalhadores saíram da greve, derrotados. E o governo não ofereceu proposta. Desde 2007 já foram contabilizadas 52 reuniões com o governo, no que ele chama de negociação permanente. E o que de fato permanece é a completa indiferença com a situação dos trabalhadores. Os salários estão congelados, não foram feitas as mudanças de racionalização dos cargos, os aposentados perdem direitos. O caos.
Na semana passada os trabalhadores das universidades decidiram encaminhar um indicativo de greve. Mais uma. Porque também não dá para ficar aturando enrolação permanente de um governo que não se dispõe a oferecer qualquer solução aos problemas criados. Pelo contrário, existe até projeto propondo o congelamento dos salários em 10 anos.
Pois a última reunião com os representantes da Secretaria de Relações do Trabalho do Ministério do Planejamento foi uma tristeza. Usando da velha tática da chantagem, a funcionária do Planejamento, Marcela Tapajós, disse que era muito difícil o governo sentar com os trabalhadores que já estavam anunciando greve. Ao que foi respondido que a proposta de greve só nasceu por conta de essas reuniões não saírem do lugar. E o que se sucedeu não foi diferente de tudo o que os trabalhadores vêm vivendo desde sempre. Conversa fiada, chantagem e ameaças. Basta ver como o governo está tratando a greve dos professores, também se recusando a conversar. Nas mesas “de enrolação”, o governo aparece ora com a conversa de mudança no piso, ora com uma ideia de nova carreira, mas nada aparece como proposta real. Apesar de alardear crescimento no PIB nos últimos anos, a presidente Dilma não quer saber de dividir isso com os trabalhadores. Certamente o interesse maior é seguir pagando os escorchantes valores das dívidas externa e interna.
E, assim, o governo vai criando um impasse, deixando os trabalhadores num beco sem saída. Nas mesas, nada avança. Então, talvez, quem sabe, na luta. Mesmo com a derrota no ano passado, os trabalhadores acreditam que não dá para ficar inerte, vendo os salários congelarem e todas as misérias da carreira e da tabela salarial seguirem crescendo.
Isso significa que as universidades viverão nova greve dos técnicos administrativos. Em Santa Catarina, o movimento dos professores que assoma em todo o país, não chegou. Os sindicatos de docentes não chamaram assembleias nem deliberaram por greve. Há uma apatia e uma acomodação muito grande entre eles.  Mas, o dos técnico-administrativos acatou o indicativo da Federação Brasileira dos Sindicatos das Universidades Brasileiras e deve entrar em greve a partir do dia 11 de junho, assim como também os técnico-administrativos dos Institutos Federais.
Como sempre acontece, uma greve na universidade demora a tocar a sociedade. No geral, os movimentos duram de dois a três meses. Não tem a mesma força que uma greve de ônibus, que paralisa uma cidade e não passa dos três dias. Greve na educação é coisa que se arrasta, como se parar o processo de criação de conhecimento de milhares de pessoas fosse algo sem importância. Parece até que o governo lucra com a greve, já que muitos dos gastos acabam diminuindo. É uma coisa perversa. O governo deixa os trabalhadores sem qualquer aceno de negociação e passam-se os meses. Quando então aparece algum impasse, como a impossibilidade de um início de semestre, uma formatura, ou coisa assim, então a sociedade se volta contra os trabalhadores. Eles são os vagabundos que não deixam seus filhos se formarem, ou arranjarem um emprego. Toda a dor das famílias dos trabalhadores fica no vazio, diante da ira de quem precisa de um serviço que não é prestado.
Então, na queda de braço entre os trabalhadores e o estado – no geral sempre a serviço do capital – o cordão arrebenta no lado mais fraco. Até porque, desde o final dos anos 90 que os trabalhadores públicos vêm diminuindo seu ímpeto de luta. As últimas greves tiveram muita adesão, mas pouca mobilização. Isso significa que os serviços param, mas a força da luta não aparece em passeatas massivas ou atos de massa. Isso é ruim porque o governo percebe a fragilidade do movimento e aí deixa o tempo passar para que a greve vá se desmilinguindo.  
Esse ano está colocado mais um desafio. Muitos trabalhadores novos entraram nas universidades nos últimos tempos. Espera-se que esse sangue novo vibre na órbita da luta mesma, luta real, na rua, na mobilização. Muitos direitos que os trabalhadores mais antigos ainda têm, os novos não terão garantido. Entraram em desvantagem. Então, mais motivos ainda têm para fazerem a greve ferver. Vai ser um momento importante no qual esses novos trabalhadores mostrarão a que vieram: se são meros carreiristas, pulando de concurso em concurso, ou se tem mesmo o desejo de atuar na construção de uma educação universitária de qualidade e com compromisso social.  
A semana que vem aponta para esse novo embate com o governo. Educação parada. Universidade parada. Criação do conhecimento prejudicada. A eterna luta do trabalho contra o capital. Sim, porque quando um governo prefere pagar juros a banqueiros em vez de valorizar seus trabalhadores, ele está, de fato, representando o capital. A luta de classe outra vez se expressando. A ver como se comportam a sociedade, os trabalhadores, o governo, o capital.

A luta de classe é sempre pedagógica

Elaine Tavares  - jornalista
A greve dos trabalhadores do transporte público foi uma linda lição de luta de classe, que durou três dias em Florianópolis. Nesses momentos de ruptura da ordem estabelecida é que se pode ver como todo esse pacto que os ditos liberais fazem de “colaboração e parceria” com os trabalhadores se traduz em nada. Basta que os trabalhadores exijam um direito, melhores salários e melhores condições laborais e o empresariado arreganha os dentes, acompanhado de toda a mídia comercial, mais os poderes da república. Tudo vira contra a luta dos trabalhadores. E eles ainda passam pelos grandes vilões.
Quem mora numa cidade grande, sabe. O trânsito mata. Não só por conta da violência dos acidentes, mas pelo caos diário que provoca estresse e selvageria. Nesse universo, um motorista de ônibus, que faz dezenas de viagens, iguais e repetitivas, está submetido a forte pressão. Não é à toa o pedido de redução de carga horária para seis horas. E a resposta dos empresários? “Isso é impossível, vamos ter de contratar mais gente!”. Mas, ora, e isso não é bom? Mais emprego, mais “colaboradores”? Pois ninguém fala sobre isso. A imprensa, feito papagaio, se limita a reproduzir à exaustão os argumentos pífios dos empresários.
Em todos os canais de televisão foram convidados os empresários do transporte, os lojistas, especialistas em economia e o festival de bobagens se espraiou. Reclamações indignadas dos comerciantes que estavam perdendo dinheiro. E a culpa, de quem? Dos trabalhadores. Declarações indignadas dos empresários do transporte sobre o prejuízo à cidade. E a culpa, de quem? Dos trabalhadores. Também a população era incitada a dar sua opinião, com os telefones abertos, para que reclamassem à vontade. E a culpa, de quem? Dos trabalhadores.
Uma reportagem da RBS mostrou um repórter, dentro de uma empresa de ônibus, no interior de um veículo que tentava furar o cerco que os grevistas faziam em frente ao portão. O espetáculo da defesa do direito daquele trabalhador específico que queria trabalhar, e não podia. Uma minoria entre os motoristas e cobradores, mas foi o que recebeu os holofotes. A maioria dos trabalhadores que enfrenta o trânsito maluco de uma cidade que prioriza o carro não teve sua história contada. As duas seriam boas histórias, as duas, e não apenas um lado da moeda.
Não teve repórter na casa de um motorista mostrando seu cotidiano, sua vida na periferia, seu acordar de madrugada, seu medo de assalto nos madrugadões, o sacrifício para criar os filhos. Não. A dor era a dos empresários que, desgraçadamente, estavam tendo prejuízos por conta do fato de que os trabalhadores estavam exigindo direitos.
Também os números eram manipulados na cara dura. “Os empresários estão dando aumento de 7%, o que querem mais?”, diziam os comentaristas, arvorados subitamente de defensores da ordem e das gentes. Mentira. A proposta era de recomposição salarial de quatro e pouco, mais dois de aumento real.  Os mesmos comentaristas, inflamados diante da ousadia dos trabalhadores não eram capazes de falar que em Florianópolis são apenas cinco empresas que cobrem o serviço de transporte, que há um monopólio de linhas, que as gentes não têm opção, que nunca houve licitação para a contratação das empresas, que tem gente graúda da política com ações nessas empresas. Nenhuma confrontação de dados sobre os lucros das empresas, do que a prefeitura joga de dinheiro público no serviço privado. Nada. Hélio Costa foi o único que fez alguma pergunta incômoda ao representante dos empresários, mas acabou incorporando o discurso de que o caos era culpa dos trabalhadores.
O prefeito Dario Berger, como sempre, foi um fiasco, agindo como se a prefeitura não tivesse nada o que fazer diante da “violência” imposta pelos trabalhadores. Seu único arroubo foi dizer que mandaria punir os donos de vans que estariam cobrando a mais dos quatro reais autorizados pela prefeitura. E nenhum repórter ou comentarista para questionar essa omissão.
A procuradoria foi rápida em dar seu parecer, lançando uma nota digna de “nota”. Chegou a propor a demissão de 10% dos trabalhadores de cada empresa, como medida de punição aos trabalhadores em luta. E a nota era lida e relida, como se fosse a verdade verdadeira. Lembrei-me do dia em que entramos na Justiça com pedido de suspensão do show do Bem Harper, no Campeche, que estava sendo proposto em uma área de preservação permanente. Nenhuma palavra da “justiça”. Contra os ricos não há ação “punitiva”. Não há. É fácil ser valente diante daqueles que só têm os “seus corpos nus”, como diria o grande contador de histórias do povo, o repórter Marcos Faerman.
Mas essa gente aguerrida fez a sua luta. Mostrou que esse papo de conciliação entre capital e trabalho não existe. Não há como existir. Os trabalhadores estarão sempre em busca de melhoria no seu fazer cotidiano que, dentro do capitalismo, sempre será de exploração. É uma corda esticada no limite. E nesse cabo de guerra, os empresários nunca – eu disse nunca – serão bonzinhos. Cada pequeno avanço só vem com luta, luta forte, luta renhida. Assim, quando a luta de uma categoria se faz, o certo mesmo é haver a união de classe. Os trabalhadores todos, juntos, apoiando a luta daqueles que tiveram coragem de fazê-la.
Aí, agora, os papagaios dos poderosos já estão atuando ideologicamente. Os trabalhadores venceram essa queda de braço, arrancaram mais uma coisinha dos patrões. Isso não pode ficar impune. Então, o braço duro da vingança vem com força. Já começam a falar em aumento da tarifa. E aí, a culpa será de quem? Dos trabalhadores que lutaram. Falar-se-á em conluios, em tramoias entre o sindicato dos trabalhadores e os patrões. Dir-se-á que foi tudo armado, que era jogada.  E mais uma vez os trabalhadores serão punidos, porque ousaram lutar e vencer.
Então, quem tiver ouvidos para ouvir, que ouça. A greve é a expressão da luta de classe. A greve é a ruptura da ordem que impõe a exploração aos trabalhadores. A greve é um dos poucos recursos de força que os trabalhadores têm para negociar. Ela é necessária para que os direitos avancem. Se vier aumento, não é por causa da greve. É porque os empresários não querem diminuir em um centavo sequer os seus lucros. Então, eles, não satisfeitos em sugar os trabalhadores, ainda sugam o povo. Se vier aumento, a causa é a ganância pelo lucro, a omissão de uma prefeitura que não se importa com os cidadãos.
E se ele, o aumento, de fato vier? Então, será hora de a população aprender com os motoristas e cobradores. Lutar e vencer!