quinta-feira, 31 de julho de 2008

Líquida lua de Saturno


"Pelo menos um dos grandes lagos de Titã, uma lua de Saturno, contém hidrocarbonetos no estado líquido, segundo observações feitas pela nave internacional Cassini, informou hoje a NASA... Isso torna Titã o único corpo do nosso sistema, além da Terra, onde foi detectado líquido à superfície".
Será manso esse lago, sobre o qual nenhum olho pousa?
E é tudo sempre o mesmo, eternamente...
O mesmo lago plácido, dormente dias,
E os dias, sempre os mesmos, a correr...
Florbela Espanca





Nakba - O dia da catástrofe

Veja no link a entrevista de Elaine Tavares com Khader Othman, membro do Comitê Catarinense de Solidariedade ao Povo Palestino, sobre o Nakba:

ElaineEnlaces


A jornalista Elaine Tavares, editora de P&N, no Campus da UFSC, tendo aos pés Catatau, o cão revolucionário de Abya Yala. O bonequinho que está ao lado é a réplica da estatua do Che menino, localizada em Córdoba, criação do Leo. Momentos Pobres & Nojentas!

Urda Klueger lança romance pré-histórico

Por Elaine Tavares - jornalista
Quem imerge no turbilhão dos seus olhos claros sabe bem, o que a Urda mais ama é a sua Santa Catarina. Não é sem razão que seus romances sejam sempre um retratar arrebatado da vida que vive e se expressa nesta pequena extensão de terra do sul do mundo. Em cada texto, cada história, cada sentimento, está marcada a paixão por estas gentes catarinas. E, em toda sua vida, o que Urda Klueger tem feito é mesclar o seu conhecimento da história com a narrativa destas vidas que constroem o mundo das terras de baixo de “nuestra América”.
Pois agora a Urda entrega à Santa Catarina mais um romance, desta vez mergulhada na pré-história da nossa gente. É o Sambaqui, resultado de dias e noites de pesquisa e de vivência nas praias deste estado. Dormindo em barracas de lona, espreitando o mar nas noites de lua cheia, sentindo o cheiro de um passado longínquo à beira de fogueiras, caminhando solitária pela praia, Urda logrou estabelecer um encontro com a história mais remota do nosso lugar e, no dizer do escritor Viegas Fernandes da Costa, consegue, com o novo livro “mostrar a antigüidade, a diversidade e a riqueza das pessoas que há mais de 4 mil anos já andavam por aqui, que nestas terras sepultaram seus mortos e que nos legaram alguns vestígios das suas culturas preservados sob nossos pés.
Ao narrar a história de Jogu, Sanira, Calexo e tantos outros personagens que há quatro milênios organizaram suas vidas sobre uma montanha de conchas, que hoje chamamos de sambaqui, no litoral catarinense, Urda entrelaça ficção e arqueologia, arte e ciência, emoção e razão para compor, a partir dos fragmentos de um passado que se anuncia nas peças dos museus e nas pistas dos sítios arqueológicos, uma história repleta de humanidade, de descobertas e de paixão”.
O Sambaqui – 19º livro de Urda - é, então, resultado de longa busca por museus, bibliotecas, escavações, mas, fundamentalmente é fruto do profundo amor que Urda nutre pela história deste chão. Por isso, vale a pena conferir o lançamento no próximo dia 07 de agosto, na Livraria Livros e Livros, às 18h30min. Um único olhar para esta mulher branquinha, lá de Blumenau, e já se está prisioneiro, porque Urda, muito mais do que uma contadora de estórias, é uma mulher que, com sua insaciável paixão, nos carrega para dentro da história viva de Santa Catarina. Agora, são os sambaquianos que, com ela, pulam no nosso cotidiano, e nos fazem amar ainda mais estas largas extensões de areia que formam as praias do estado. Porque, ali, há milhares de anos, amaram e sonharam os nossos ancestrais. Agora eles voltam, e, de novo, nos ensinam...
Venha então celebrar com a Urda esse momento único. Livraria Livros e Livros, dia 07 de agosto de 2008, às 18h30min.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Violência moral no trabalho

O médico Herval Pina Ribeiro, da Universidade de São Paulo, em palestra realizada no início de julho em Blumenau, disse que, no sistema capitalista, é ilusão sentir prazer no trabalho. Isso porque, no trabalho, predominam relações de poder, e relações de poder são relações de violência. Por isso o médico usa a expressão “violência moral no trabalho” e não assédio moral.

Reflexão importante. No artigo “A explosão dos acidentes de trabalho”, Altamiro Borges, ao falar sobre o dia 27 de julho - Dia da Prevenção dos Acidentes de Trabalho - diz que não há o que comemorar no mundo e no Brasil. “Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em média, cinco mil pessoas morrem por dia em decorrência da negligência das empresas capitalistas – que abusam na exploração e não investem na segurança nos ambientes de trabalho. No Brasil, segundo o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), cerca de 500 mil trabalhadores foram vítimas de acidentes laborais no ano passado, resultando em 2.708 mortes.”


Festa de P&N e Desacato

Em 16 de agosto será realizada a primeira festa conjunta da revista Pobres & Nojentas e o Portal Desacato. A promoção busca recursos para viabilizar o evento de comemoração de um ano do Portal, nos dias 5 e 6 de setembro. Em breve vamos divulgar a programação! E faça a sua assinatura de Pobres & Nojentas. Meta a mão no bolso para, mediante o pagamento de R$ 23,00, receber em casa cinco edições. Pobres vive!!! Mas não é fácil...! Mande e-mail para misabreu@yahoo.com.br

Que lugar é esse?

Procure a resposta na próxima edição de Pobres & Nojentas, a número 14, que circula em agosto!

segunda-feira, 28 de julho de 2008

A Escola Triste

Míriam Santini de Abreu
Nos anos 70 e 80 chamava-se “primeiro grau” a progressão de primeira a oitava séries. O primeiro grau eu fiz na Escola Estadual Clemente Pinto, em Caxias do Sul. A prédio fica a uma quadra da casa de minha família. Entrei na primeira série com seis anos. Era baixa, magra, míope. Todas as minhas roupas eram doadas por vizinhos e familiares. Usava uniforme azul com listras brancas, Conga e, no inverno, um casaco com pêlos em volta das mangas e do colarinho, que eu detestava. Mas havia um lugar onde a minha sensação de carência e de estranheza em relação a tudo e a todos desaparecia. Era na biblioteca da escola.
Bastava subir a escada ao lado da sala do SOE, o Serviço de Orientação Educacional, e o mundo era meu. As mesas eram baixas e redondas, os banquinhos também. Os livros, catalogados, pareciam me espiar, me desejar, aquietados nas prateleiras ou abertos, repletos de delícias, sobre as mesas. Não havia dia nem hora para retirá-los. A biblioteca me acolhia, me aquietava. E lá, fora, no pátio, havia concreto, mas também árvores, cantos misteriosos, reservados somente ao zelador. E lembrei-me da Clemente Pinto quando conheci a escola da Barra do Sambaqui, em Florianópolis. É tanta feiúra e decadência que só pude pensar em uma definição: a Escola Triste.
A entrada: paredes de tijolos mal-pintados de branco, com uma grade de ferro. Parece uma grande cela. O mofo está todos os cantos, principalmente onde as crianças fazem as refeições. O pátio para as brincadeiras é minúsculo, coberto de brita, sob encomenda para deixar a pele ralada ao menor tombo. Nas salas de aula – são duas - há aquelas horríveis janelas basculantes, que deixam o mundo lá fora fatiado em retângulos. A escola toda parece uma gambiarra, algo juntado às pressas, sem graça nem beleza.
Mas, nessa escola triste, o que há de pior é a biblioteca. As goteiras já causaram curto-circuito, e por isso não é seguro usar os computadores que seriam utilizados no aprendizado. Os livros – poucos – ficam apinhados em umas poucas estantes, a gritar a inutilidade dos discursos vazios sobre “qualidade de ensino”, “internet na sala de aula” e outras máximas que mascaram a precariedade cada vez maior do ensino público. Bonitas, ali, só aquelas crianças e aquelas professoras que, há quase um ano, esperam a reforma prometida.
O que os meninos e meninas aprendem, desde cedo, é que, num mundo de ricos e pobres, com suas escolas de ricos e pobres, o lugar que lhes cabe é aquele. Na Clemente Pinto, era na biblioteca que a minha pobreza se apagava. Na Escola Triste, nas salas cheias de bolor, sem mistérios nem magias, nada há para dar, às crianças, o gosto açucarado de uma promessa, de uma possibilidade. O gosto de um mundo onde os desejos possam ser compartilhados.






A minha Clemente Pinto

E por falar na Clemente Pinto... Que saudade! Foto da minha escola, que encontrei no blog da professora Jocemara, http://seriesegunda.blogspot.com/

O jornalista precisa mudar!

Elaine Tavares - jornalista

No Brasil é assim. Alguns logotipos de imprensa só causam exasperação. É o caso dos da Rede Globo e o da RBS. Para a maioria dos militantes da luta popular eles são símbolos da mentira, da opressão e da manipulação. E essa não é uma reputação conseguida ao acaso. O fato é que a nave mãe (Globo) conseguiu impor um jeito de fazer jornalismo que impregna praticamente todas as redes, principalmente as suas filiadas, como é o caso da RBS. Teoricamente poderíamos enquadrá-lo no campo do jornalismo funcionalista, ou seja, aquele que apenas responde as seis perguntas – onde, quem, como, quando, o quê e por que – sem maiores preocupações com a análise ou o contexto da notícia. Mas, para além da prática do chamado jornalismo liberal (o que pretensamente mostra os dois lados), há toda uma tradição de ocultamento e meias verdades que forjam a usina ideológica da elite e da classe média brasileira. A televisão, com a Globo à frente, é uma fábrica de mentiras, na qual os pobre só aparecem como bandidos e os lutadores sociais como baderneiros “terroristas”.

Para os jornalistas que atuam nestas redes fica colocado, então, um grande desafio. Muitos deles – senão a maioria - estão bem integrados ao jeito de fazer jornalismo que consagra cada uma delas. Mas outros há que buscam fugir destas malhas de desinformação e precisam de um longo caminho até serem recebidos com confiança pelos movimentos sociais e pelos moradores das periferias. Não é sem razão que, em campos conflagrados, como é o caso do Rio de Janeiro atualmente, os jornalistas sejam alvos do ódio e da revolta popular. O que parece interessante é que a maioria das redes e dos periódicos, bem como os órgãos de classe dos jornalistas, não se faça perguntas sobre os por quês dos ataques e do ódio. Há notas de repúdio, há declarações e editoriais virulentos, mas nenhuma linha sobre o tipo de jornalismo que se anda fazendo por aí.

Sempre defendi que o jornalismo não se presta a adjetivos, tais como jornalismo policial, econômico, político, etc... O jornalismo é feito de um único pacote: análise do dia, investigação, contexto, impressão de repórter. Pode-se fazer isso nas mais diferentes áreas, mas é sempre o mesmo fazer contextualizado, partindo de uma situação singular e buscando narrar os fatos de maneira a levar ao leitor/espectador/ouvinte a universalidade do fenômeno, para que cada um possa fazer sua interpretação e chegar a suas próprias conclusões. Narrativas abertas, que respeitam a inteligência do receptor, mas que não se furtam a deixar bem claro o ponto de vista a partir do qual o repórter está narrando. Isso é jornalismo, feito de forma honesta e respeitosa.

Mas, o que se vê, cotidianamente nas televisões, o que se lê nos jornais, revistas e páginas da internet, ou o que se ouve no rádio, não merece ser chamado de jornalismo. Costumo chamar a isso de “gosma”, alguma coisa assim como aquela “coisa verde” de um velho filme de Boris Karloff, “A bolha assassina”. Ou seja, um negócio que vai tomando e engolindo tudo e todos, numa gosma informe e mal cheirosa. Com boa vontade poderíamos chamar a esse tipo de informação que campeia pelas redes informativas de “boa propaganda”, porque quase sempre se prestam a incensar pessoas, empresas, autoridades, fontes oficiais, geralmente os ricos e poderosos. Estes são os que têm voz e vez nas emissoras e só o seu ponto de vista é passado com respeito. Os demais, a ralé, a malta, os empobrecidos, estes estão fora, e quando falam são os coitados ou os marginais. Os exemplos são muitos.

A guerra dos madeireiros contra os índios na região Amazônica é legítima porque os empresários são gente trabalhadora que lutou muito para grilar terras. Já os camponeses do MST são terroristas porque querem terra pra plantar e soberania alimentar. Sempre há dois pesos e duas medidas para as lutas. Quem viu a cobertura da recente crise na Argentina envolvendo os ricos fazendeiros que deixaram o país desabastecido e trancaram estradas por três meses, sabe do que falo. Eram trancamentos legítimos, desobediência civil. Mas imaginem se o movimento de tranca-rua fosse levado a cabo por agricultores sem-terra, desalojados pela monocultura da soja? O que a mídia diria? Desobediência civil legítima ou terrorismo? É, assim é a nossa mídia de cada dia. E o que é pior, com os jornalistas cada vez mais enquadrados neste esquema infernal. Poucas vozes se escutam contra essa prática criminosa de encobrir, enganar. A ditadura midiática parece não ter muitos opositores.

Quando o jornalismo é usado para o crime

Por conta de toda essa prática não causa surpresa nenhuma que as entidades sindicais da categoria dos jornalistas se mantenham silenciosas diante dos fatos abomináveis que aconteceram na Colômbia envolvendo o jornalismo. Nenhuma nota nos jornais, nenhuma fala na CNN. Silêncio reverente. Afinal o que aconteceu foi lá longe, num longínquo país do norte da América do Sul. Mas, o que aconteceu na Colômbia é paradigmático e deve ser debatido à exaustão.

E o que aconteceu? Pois o governo de Álvaro Uribe, durante o comentadíssimo resgate de Ingrid Betancourt, saudado e incensado como um golpe fatal nos “terroristas” das FARC, usou de dois subterfúgios que deveriam ter levantado a ira mundial. No helicóptero que baixou em meio à selva estavam pintados dois logotipos respeitados por todas as gentes desta nossa América profunda: o da Cruz Vermelha e o da Telesur. A Cruz Vermelha, todos sabem, é um símbolo da ajuda humanitária em tempos de guerra. É quem leva esperança de cura para os que estão sob fogo cerrado. Tem lá suas idiossincrasias, mas, enfim, o símbolo desta entidade é reconhecido internacionalmente como uma entidade confiável. Já a Telesur, apesar de jovem, criada há pouco tempo pelo governo venezuelano, se firmou entre os movimentos sociais como uma emissora de televisão que garante o espaço para as vozes marginalizadas pelo sistema. É uma rede latino-americana que se propõe a mostrar a verdadeira cara desta parte do continente, colocada ao lado da comunidade das vítimas.

Pois o uso do logotipo da rede latino-americana não foi debatido por ninguém. Talvez porque pareça incrível aos jornalistas brasileiros uma emissora de televisão ser respeitada, amada e receber a confiança das gentes em luta. O que é normal por aqui é ver os carros das grandes redes sendo apedrejado e os profissionais sendo rechaçados pelos movimentos sociais, porque as gentes sabem que estas emissoras servem ao grande capital, aos poderosos, à elite cortesã das multinacionais e do jeito colonizado de viver.

O presidente Uribe não se constrangeu em confessar que usou os dois logotipos alegando que era necessário para que a operação desse certo. Ou seja, assumiu a ação criminosa e praticamente nenhum órgão de imprensa discutiu esta questão. É que o presidente da Colômbia se encaixa naquilo que Noam Chomsky chama de “vítimas amigas”. Isso significa que quando alguém amigos dos Estados Unidos ou do poder constituído comete algum crime, por ser amigo do “império”, sua ação criminosa fica obscurecida, não é alardeada. A notícia é dada, mas muito sutilmente. E assim foi.

Nem mesmo as entidades dos jornalistas, que se apressaram a gritar contra o governo venezuelano quando este usou do legítimo direito de encerrar a concessão de uma empresa que não cumpria a lei, divulgaram ou soltaram notas de repúdio.

Este pequeno texto procurar abrir a cortina espessa que atravessa o olho da categoria que deveria ser o arauto da verdade. Apesar da penúria das nossas redes de informação, apesar da falta de compromisso público, do descarado posicionamento em favor das elites e dos poderosos, da mentira e do acobertamento, ainda se pode pensar na possibilidade da prática de um jornalismo libertador. Um jornalismo de verdade, capaz de estar ao lado das vítimas do sistema opressor, que possa entregar às gentes em luta o espaço onde se expressar. Esse jornalismo existe e é respeitado. E tão respeitado que foi usado numa ação de guerra. Então por que os jornalistas brasileiros, suas entidades de classe, não falam sobre isso? Por que não informam, não contam a verdade, não denunciam?

Arrisco um palpite. Denunciar esta trama é reconhecer nosso próprio fracasso. Fracasso como jornalistas, incapazes de lutar contra o titã, submetidos a uma razão empresarial, praticando auto-censura, vilipendiando a prática do jornalismo, transformando nosso fazer em propaganda de um mundo falido. A Telesur não é o paraíso do jornalismo, é certo. Mas é uma proposta em construção. O que a torna única é justamente esse compromisso com o outro, a vítima, o sem lugar. É a explicitação de um jornalismo honesto, que se posiciona e deixa claro, ao telespectador, que se posiciona. Não é enganador como o que se pratica por aqui, que se diz imparcial, enquanto só expressa a visão de mudo dos que detém o poder. Termino dizendo o que tenho levado a vida a dizer: o jornalismo é um lindo fazer, capaz da análise, da contextualização, da impressão. Ele não está em crise. Porque o jornalismo não é um ente com vida própria. O que está em crise, ou mal formado, é o jornalista. Estes homens e mulheres jornalistas são os que precisam mudar para que nós, no Brasil, possamos avançar para uma verdadeira soberania comunicacional.

sábado, 26 de julho de 2008

Editoras de P&N estão na chapa para o Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina

Elaine Tavares e Míriam Santini de Abreu, editoras de P&N, estão na Chapa Sindicato Forte é Sindicato Presente, chapa única para a direção do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina. A eleição será no dia 6 de agosto. Veja nos posts abaixo as propostas da Chapa e a nominata completa.


Quem é quem na Chapa 1


Propostas


Propostas - continuação


Floripaemfoto


Floripa: em cima, as pontes e a parte continental; embaixo, o que sobrou do Manguezal do Itacorubi. Fotos de Elaine Tavares

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Dia fora do tempo

Elaine Tavares
Quando a Europa ainda estava mergulhada na feiúra do tempo feudal, aqui, na nossa Abya Yala já viviam povos bastante prósperos e de vida plena, tais como os incas, astecas e maias. Estes últimos conheciam a astronomia e tinham um calendário bastante complexo. Nele, também existem os mesmos 365 dias, tal e qual o calendário gregoriano que é assumido hoje por grande parte da humanidade. Mas, a contagem do tempo baseia-se em 13 ciclos lunares de 28 dias por ano solar, perfazendo 364 dias.

O dia 365 existe, mas é chamado de “Dia Fora do Tempo”, uma espécie de hiato entre o Ano Velho e o Ano Novo que começa, então, no dia 26 de julho. O dia fora do tempo é celebrado com festa e meditação. Os maias consideravam este dia como uma grande oportunidade para reciclar, recomeçar, recarregar as energias, libertar o que já não é mais preciso, agradecer por tudo o que foi recebido no período anterior, e prepara-se para o ano seguinte.

Hoje existe uma vasta tribo que vive segundo as vibrações do calendário Maia, é a chamada comunidade da paz, e é essa gente que se junta à ancestralidade dos maias para celebrar e conspirar por um novo tempo. Neste dia 25, dia fora do tempo, recomeça um novo ciclo com o nascimento astronômico de Sirius, que se eleva no horizonte juntamente com o Sol, trazendo uma energia de limpeza e purificação interior, trabalhando nosso corpo e nossa alma.

O novo ano maia que agora começa leva o nome de Tormenta Elétrica Azul e os amantes da paz hoje rezam para construir a grande ponte do arco íris que levará a humanidade a um tempo novo, de alegria e riquezas repartidas. Eu os convido a esse dia de purificação...

E que venha o ano novo!

terça-feira, 22 de julho de 2008

Eu quero acreditar!

As "nojentinhas" Elaine Tavares, Marcela Cornelli e Míriam Santini de Abreu estão em polvorosa! Está marcada para o dia 25 de julho a estréia de Arquivo X: Eu Quero Acreditar, o segundo filme da série. As três, nesta semana, estão novamente devorando episódios da série.


Leve feito o vento vem...


Míriam Santini de Abreu


Leve feito o vento vem
Já quase de manhã
Quase não acreditei
Nesse sonho
Pude até sentir você
Chegando pelo ar
E entrando em mim
Devagar

Começa assim uma música que amo... Roupa Nova, anos 80. Mas não havia uma coletânea sequer onde ela tivesse um pedacinho de faixa. Mas eu a canto, especialmente quando chega a Primavera e os delicados olhos-de-boneca me espreitam nos jardins. Eram esses os versos que me tomavam quando eu caminhava na João Pio Duarte Silva, a rua que fica ao lado do Parque do Córrego Grande, uma das poucas áreas verdes urbanas de Florianópolis. Eu passava ali todos os dias a caminho do Sintufsc, pássaros habitavam meu peito naquelas manhãs.

Os pássaros foram para outros ninhos, o inverno é pedregoso na minha alma, mas eis que aquele vento vem de outra forma, num lugar que, tantas vezes, me oferta presentes: o You Tube.
Pobres & Nojentas tem conta lá, e, quando aguardo longos minutos para carregar o que chamo de “filminhos”, é no desejo de partilhar com outros e outras as nossas interpretações da vida e das coisas. E é esse desejo de partilha, penso, que inspira tantas pessoas a levar cenas e sons para essa virtualidade que se torna absolutamente concreta ao nos carregar ao passado, ao nos fazer desejar um futuro. Porque o visto e o ouvido naquele retângulo muitas vezes enosam todos os meus sentidos. Os pássaros voltam, mesmo que brevemente, uma suficiência fugidia aplacando a eterna insuficiência.

Render-se ao futebol

Elaine Tavares
Mulher choramingas é coisa difícil de aturar. E mais ainda quando fica de beicinho por causa do seu homem. Boa parte delas, por mais que viva, não consegue aprender que não há competição possível entre elas e o futebol. O segundo sempre vence. E, por conta desta incapacidade compreensiva, elas recorrentemente enchem a paciência das amigas com suas queixas.Ora mulheres, homem é animal futebolístico. Não há o que fazer. Frequentemente eles conheceram a bola bem antes que a nós, portando, esta é uma competição a qual nunca venceremos. A bola sempre virá em primeiro lugar. É uma questão óbvia. Entender isso é o primeiro passo para a vida conjugal feliz. Mulher que não se rende ao futebol está fadada a sofrer. Aos domingos, as quartas, as quintas, as terças e até às segundas que, afinal, estas tabelas dos campeonatos são loucas demais.
Nesse rame-rame de bola, gols, campo, torcida, chuteiras e cerveja, as mulheres têm apenas um caminho: desencanar e viver à larga. Enquanto seu homem joga bola ou assiste ao jogo no bar, vá curtir a vida, ler um livro, encontrar com as amigar, ver um bom filme, jogar um pife, caminhar, cuidar do corpo, sei lá, faça qualquer coisa que dê prazer. Existe vida em solidão sim... E é vida plena.
Não adianta querer acompanhar o homem neste ritual da bola. Isso é coisa deles, magia pessoal. Não é espaço para ser invadido com nossas perguntas tolas, muito menos com nossa presença. Futebol é coisa séria, sagrada. Daí que esse sacerdócio tem de ser enfrentado a sós. O homem e seus iguais. É preciso entender isso. E olha que esse não é papo machista de mulher alienada. É só respeito, profundo respeito por estes momentos de sortilégios que emolduram o encantador mundo masculino.Eles, os homens, são por demais dependentes de nós. Por isso é bom deixá-los sozinhos nestas suas horas feiticeiras. Quando eles voltam, renovados e felizes, quão adoráveis são. É quando os pegamos!...

domingo, 20 de julho de 2008

De outonos e limões

Elaine Tavares

De repente, um ato comum e corriqueiro serviu para toda uma reflexão sobre a vida e a artificialidade que toma conta do mundo. Era domingo, o primeiro deste abençoado outono, que torna tudo cheio de cor e beleza. Na azáfama do preparo do almoço achei tempo de sair porta afora pegar uns limões. É que tenho por hábito fazer limonada, coisa que me remete à infância, aos avós, aos pagos do sul, à imensidão da fronteira onde cresci.
Então, já sob a sombra amiga do limoeiro, no átimo entre enlaçar o limão e despegá-lo do galho, parei para pensar sobre quantas pessoas ainda fazem limonadas com limões colhidos no quintal. Penso isso por conta das dezenas de garrafas de plástico que vejo nos lixos das casas vizinhas, todas as segundas-feiras de manhã. Mesmo naquelas que possuem enormes quintais e frondosas árvores. Ao que parece as pessoas preferem tomar o suspeitoso líquido refrigerante, feito sabe-se lá onde e com que tenebrosos ingredientes. Enquanto isso, limões maduram e caem do pé, sozinhos, abandonados, perdidos de sua função de encher de infância os olhos e almas das gentes, que cresceram e esqueceram...
Nas ruas arenosas do meu bairro, as crianças da vizinhança correm, brincam e gritam, embriagadas de meninice, esperando a hora do almoço que, por certo, terá um refri gelado e sinto que é preciso antes de tudo ensinar aos pais. É hora de as mulheres voltarem a buscar limões nas árvores que envelhecem sozinhas nos quintais. Porque mesmo nestes tempos de vida de plástico ainda existem quintais e, ainda que não se more em casa, as frutas estão nos sacolões, esperando, suculentas e saborosas.
Agarrada aos meus limões galegos, espio pelo muro as caras afogueadas da gurizada e peço aos deuses para que eles não se esqueçam dos quintais, das árvores verdejantes, carregadas de frutos. Peço para que não se intoxiquem desta vida de plástico que guia os humanos de tamanho grande. Peço para que estes meninos e meninas possam compreender o que significa o outono na vida do bicho-humano. Tempo de colheitas, de maduração. Tempo de limões, de gosto azedinho, de verde vibrante.
E, enquanto faço verter o sumo da fruta que invoca minha latina meninice, agradeço por ser alguém que ainda tem casa, quintal, outono, árvores e esse sentimento de que a vida é mesmo um grande jardim!

quinta-feira, 17 de julho de 2008

A Bolívia vai decidir

Por Elaine Tavares - jornalista

Eis que em 10 de agosto, um domingo, a Bolívia viverá uma hora histórica, momento inédito, nunca antes vivido. O presidente do país, Evo Morales, o vice, Álvaro Linera, e mais oito “prefectos” (governadores de províncias) estarão submetendo-se à vontade popular outra vez, dentro de um mesmo mandato. São as gentes que vão decidir se eles seguem governando ou não, num referendo revocatório convocado pelo partido do próprio presidente. Para um país que tem registrado na história dezenas e dezenas de golpes, rebeliões, revoltas e ditaduras, esta é uma novidade radical. Assim, aquilo que poderia ser o grande trunfo da direita racista de Santa Cruz, acabou virando-se contra ela. Evo Morales, em meio a uma série de violências e desrespeito à Constituição, preferiu deixar na mão do povo o destino da nação. Uma decisão arriscada, é certo, mas definitiva. São os bolivianos, na sua totalidade, que tomarão nas mãos o seu próprio destino. Pela primeira vez, não será a mesma velha elite branca e agrária quem decidirá por todos. Ou sim?

Uma história de opressão
A história da Bolívia está visceralmente ligada à história da conquista, tal qual a dos demais países deste imenso continente. Com um passado autóctone ancorado em conceitos como a cooperação, a solidariedade e a posse coletiva da terra, o povo da região viu ser solapado todo o seu modo de vida com a invasão espanhola no século XVI. Em todos os lugares, a lógica da colonização foi submeter os povos originários, apropriar-se da terra, impor-lhes uma cultura alienígena e transformá-los em seres dóceis aos objetivos de domínio. Esse foi um fato político de extrema importância que, conforme diz Mariategui, mudou o cimento da vida dos povos que aqui viviam. Toda a proposta colonial, baseada na concentração da terra, não foi capaz de ser dissolvida nem mesmo nas guerras de independência, no século XIX. Apesar de todo o esforço de Simón Bolívar para incorporar os setores marginalizados da vida latino-americana, como os camponeses pobres e os originários, sua proposta foi derrotada e, ao final do processo de independência o que se viu foi uma América balcanizada, longe de corresponder aos ideais de unidade e soberania propostos no Congresso Anfictiônico do Pamaná, em 1826.

A vitória do grupo ligado à aristocracia agrária não alterou a estrutura da vida colonial. O poder mudou de mãos,mas seguiu na mesma classe. Saiu da coroa portuguesa e passou para a dos grandes proprietários de terra, brancos e ricos. A independência não destruiu o feudo, o latifúndio. Com isso, quem tem a terra segue tendo o mando e as riquezas. É nesse sentido que José Carlos Mariategui não consegue ver na questão indígena apenas um problema racial. Ele insiste que, a despeito de haver o racismo, o que também preciso ser superado é o sistema econômico que concentra terra e riqueza nas mãos de uns poucos, ou seja, a mesma velha lógica colonial. Esta análise, feita na década de 30, segue sendo bastante válida para os dias de hoje, observando-se os acontecimentos na Bolívia. A mídia – como sempre aliada dos poderosos – tem se esmerado em mostrar os conflitos como uma questão racial entre brancos e índios, esquecendo de mostrar o que se expressa por trás da aparência.

As raízes mais próximas
A atual crise que vive o governo de Evo Morales tem sua origem nesta história de invasão, domínio e colonialismo. E o que está em questão, muito mais do que o ancestral sentimento de superioridade dos brancos invasores, é a posse da terra, a forma de organizar a vida e as novas diretrizes econômicas, alavancadas a partir da eleição de um aymara como presidente da nação. Desde a colônia que meia dúzia de famílias tem mantido o controle das riquezas na Bolívia. Primeiro, rapinaram a prata, tendo como sócios os parceiros estrangeiros. Depois, foi o estanho, seguindo a mesma dobradinha aristocracia boliviana X multinacionais. Toda a riqueza foi, durante estes 500 anos, escoada da Bolívia para os bolsos de alguns “insignes empresários nacionais” ou para outros países. A grande maioria, marcadamente originária, seguiu sob o domínio desta política de “latifundiários”. Assim, um povo que era eminente agrário, e numa lógica comunitarista, de propriedade coletiva da terra, passou a ser escravo das minas, vendo sua cultura e sua forma de vida ser destruída de forma violenta e abrupta. Mas, é bom que se diga, todo esse processo de desmantelamento da vida não se deu de forma pacífica. Incontáveis são as revoltas, rebeliões e revoluções protagonizadas pelo povo boliviano. Todas derrotadas, é fato. Mas, ali, naquelas terras, os povos originários nunca deixaram de lutar.

O passado recente que acabou se expressando na eleição de Evo Morales, produziu movimentos de revolta e rebelião, sempre dentro da mesma temática: a reação das gentes frente ao domínio de uma aristocracia agrária e ao roubo das riquezas do país. Não foi à toa que os movimentos populares derrubaram um presidente que falava com sotaque gringo e exigiram o chamamento de uma nova constituinte para refundar o país. Gigantescos protestos foram feitos nos anos de 2000, 2002, 2003 e 2004. O povo boliviano queria a nacionalização das minas e dos hidrocarburos, além de uma nova lei magna que representasse todas as vozes e não só a dos ricaços latifundiários de sempre.

Evo e as mudanças
E foi a partir destas palavras de ordem que exigiam a recuperação da Bolívia para os bolivianos que um sindicalista camponês aymara, aliado a uma parte da pequena burguesia nacional, conseguiu vencer as eleições. Tinha como proposta essas demandas populares, além da promessa de discutir a autonomia das comunidades originárias dentro da nação, garantindo a elas, inclusive, a propriedade da terra e das riquezas subterrâneas. E esse, sem dúvida, é um dos pontos detonantes do movimento separatista iniciado pela aristocracia branca de Santa Cruz de la Sierra. Aos sempre eternos donos da terra boliviana resultou inaceitável dividir com os originários a posse da terra, disputando assim, finalmente, em igualdade de condições, um outro jeito de organizar a vida. Incapazes de abrir mão do poder, que julgam divino, sobre a posse da terra e das riquezas, não restou a eles senão a proposta de criação de um outro país, no qual eles não tivessem que dividir nada com ninguém que não sejam os seus velhos sócios predadores.

Evo Morales, sendo eleito, levou a cabo as promessas feitas ao povo. Nacionalizou os hidrocarburos, nacionalizou as minas e convocou uma Assembléia Nacional Constituinte. Esta câmara também logrou representar as gentes que durante 500 anos tinham ficado de fora do processo decisório. E isso acabou gerando todo o pavor nos latifundiários e nos seus sócios estrangeiros. Com maioria na Assembléia, o povo boliviano iria dar uma cara muito mais plural ao país e poderia, inclusive, garantir, a refundação de uma nova Bolívia, popular, democrática e pluri-nacional.

O sobrevôo da águia
Outro fator que não pode ser esquecido, dentro da chamada crise boliviana, é o papel dos Estados Unidos e das multinacionais. Durante décadas o país esteve atrelado econômica e politicamente aos interesses estadunidenses, sendo a embaixada dos EUA o verdadeiro centro de poder, conforme documentos que estão sendo revelados agora pelo atual governo. Assim, para o capital estadunidense, seus sócios perderem o controle das riquezas significa perdas monumentais. Logo, o contra-ataque não se fez esperar.

O primeiro deles se deu no interior da Constituinte. A minoria, representante da oligarquia rural, conseguiu obstruir o trabalho por meses, criando conflitos, violências e garantindo alguns ganhos. E o segundo é o fomento das divergências raciais, prática muito conhecida dos agentes da CIA pelo mundo afora, para manter os povos divididos. Não é sem razão que os separatistas de Santa Cruz têm como assessor o embaixador gringo Phil S. Golberg, conhecido por trabalhar no Kosovo durante o processo que redundou na fragmentação da ex-Iugoslávia. Foi a partir disso que iniciaram a proposta dos referendos para aprovar a separação da Bolívia, infringindo, inclusive, a lei. E, com os referendos ilegais, aproveitaram para trazer também a violência, a mentira, o racismo, ingredientes indispensáveis num processo de destruição de um projeto, para eles, perigoso demais.

A participação dos Estados Unidos no aniquilamento de projetos populares das nações latino-americanas não é novidade para ninguém. A política de divisão tem sua origem na Doutrina Monroe, enunciada pelo presidente estadunidense James Monroe, em 1823, que ficou conhecida como “América para os americanos”, e aqui, América está entendido os Estados Unidos. Na época, esta doutrina apareceu como uma advertência à Europa, afirmando que os Estados Unidos não tolerariam qualquer intervenção ou ocupação européia no continente americano. Na prática, foi o início de um tempo imperial, que deu aos Estados Unidos o poder de se arvorar em “Tio Sam”, ou seja, irmão das nações americanas. Um irmão voraz, ambicioso e destruidor. Não é à toa que o cantador venezuelano Ali Primeira tratou de sentenciar o fim da expressão “Tio Sam” aqui pelas nossas terras: “Eu não te digo tio, Dom Samuel, porque irmão da minha pátria tu não és”.

O futuro
E assim caminha a Bolívia, acossada pelos interesses estrangeiros, pela aristocracia títere e entreguista, pelos negócios escusos do império. Por outro lado, se levantam povos, gentes, seres, que acreditam ser possível mudar a vida, virar o leme, cambiar o rumo. Estes são os projetos que entrarão em embate nas urnas no domingo, dia 10 de agosto, desde 2008. Para os pobres, os originários, os camponeses, as mulheres, os desvalidos, os marginais da Bolívia real, será um dia de lembrar Tupac Catari e seu grito inesquecível, que ecoa até hoje pelas veredas da vida profunda: “Voltarei, e serei milhões”. Será a escolha entre o falso-irmão do norte e a soberania, entre Sam e Catari, entre a morte e a vida. Não será fácil, mas pode acontecer de as gentes levantarem a cabeça e decidirem por recuperar coisas bonitas e profundas que lhes legaram seus ancestrais: cooperação, solidariedade, terra comunal e riquezas repartidas. Não resta dúvida de que o governo de Evo Morales comete equívocos, tem problemas e deixa de avançar em questões igualmente fundamentais. Mas, está claro que há um caminho, que é novo, que busca a soberania. Um caminho para construir, em comunhão. Que venha, então, o dia 10. E que seja bom!

domingo, 13 de julho de 2008

Prece

*San Ernesto de La Higuera
(Meu irmão, minha irmã, é para repetir cada verso)

Recebe, Irmão dos Pobres de Abya Yala
Comandante da gente desta terra
A humilde prece dum ateu cercado
Pelos demônios da Malinche mascarada
Ô, Carontes fugidios sob enxofre do tirano
Por que, te pergunto São Ernesto e Companheiro
- Aos teus olhos bem abertos me dirijo-
Me propões tão absurda penitência?
Iludir-me com traidores e covardes
Comandantes encagaçados, quartas-frotas
Sete séculos há, espreitando sem descanso
Distintos estudantes instruídos lá na Europa, perfumados
Patrocinam nossa Paz nos Cemitérios
E empunhando microfones, palavrórios
Troçam do fuzil dos libertários

Por que, meu Santo Ernesto, Camarada?

São Ernesto que ascendeste lá, em La Higuera
Até o Céu dos Imortais da Liberdade!
Libertai-me dos que aviltam tua imagem
Os traidores, os errados, os falsários
Que não invoquem mais em vão teu Santo Nome
Como invocam pelas razões de Estado
Nem discurso, nem frase, nem palavra
Que só Nós, o Povo Pobre, Os Terceiros
Libertemo-nos com as pernas, com os dentes
Com os braços, com a língua, com as unhas
Das correntes, os impérios, os lacaios
Que mandemos à merda o Inimigo
-não é nosso irmão, é o sicário-
E com armas, ovos podres ou pedradas
As Mulheres, os Homens da Tua Pátria, Abya Yala
Sem palanques, apenas Teus Olhos, CLAMO!
Levantemos a Bandeira do Mundo Livre
São Ernesto, Meu Irmão, te serei grato!

(Repita-se a cada companheiro traído por razões de Estado; não cura, mas, alivia)

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Palavras de Mao Tse–tung:

“ Uma grande revolução não pode evitar passar por uma guerra civil, esta é uma lei, se não se vê mais do que o lado negativo da guerra, e não seu lado positivo, não se tem mais do que uma visão parcial do problema da guerra. Falar unicamente do caráter destrutivo da guerra é prejudicial para a revolução popular”. (...) “ É bom si o inimigo nos ataca, pois isso prova que temos deslindado campos com ele, e melhor ainda, se o inimigo nos ataca com fúria e nos pinta de escuro e carentes de toda virtude, porque isso não só testemunha que temos deslindado campos, senão também que temos alcançado notáveis sucessos no trabalho”.

* No povoado boliviano onde foi assassinado o Comandante se acostuma acender velas à sua figura. Os camponeses asseguram que é o santo mais milagreiro do lugar.

Por Raul Fitipaldi

No deserto chileno, os likan antay

Por Elaine Tavares - jornalista

Quando a civilização egípcia florescia no vale do Nilo, há mais de cinco mil anos, nas terras de Abya Yala também existiam povos organizados, com língua própria, deuses e rituais. Eram os homens e mulheres de Tambillo, um grupo de caçadores que vivia na região onde ficam hoje as quebradas (oásis) do deserto de Atacama. Tal e qual este grupo, muito outros já começavam a fincar raízes, buscando fugir das altas temperaturas invernais que chegavam a 20 graus abaixo de zero. Segundo registros do museu criado pelo padre Gustave Le Paige, em San Pedro de Atacama, Chile, estes caçadores, já, naquela época, tinham domesticado animais como a llama e a vicuña, e viviam em comunidade.
Dois mil anos depois, quando lá no oriente os gregos iniciaram a formular filosofias, na mesma região do deserto chileno, vicejaram as gentes de Tulor. Eles eram sedentários, formavam povoações, construíam casas circulares, conheciam os segredos para uma arquitetura no deserto, cultivavam a quínua (espécie de cereal) e rendiam homenagens aos deuses registrando seus rituais mágicos em placas de cerâmica. São deles as primeiras obras de arte rupestre daquela parte do deserto de Atacama. Escavações promovidas pelo padre Le Peige dão conta de que, naqueles dias, os homens deformavam os crânios com almofadas para designar sua identidade e seu status na sociedade. As mulheres usavam adornos de turquesa e malaquita, e fica bem claro que eles tinham toda uma rede de comunicação com outros grupos organizados como, por exemplo, com o povo de Tiahuanaco, que vivia na região próxima de onde hoje é La Paz, Bolívia, a 600 quilômetros dali. São incontáveis os registros destas viagens nas pedras do caminho.
Quando o império Romano chegava ao seu auge, dois mil anos antes do presente, os atacamenhos já haviam também sofisticado seu modo de vida, e isso muito se deve ao contato que tinham com a gente de Tiahuanaco e com os Inkas, que viviam na região onde hoje é o Peru. Naquele período é registrado um grande desenvolvimento cultural e social. A metalurgia fica mais complexa, surge a cestaria decorada e são elaborados artefatos em osso e cerâmica para o uso ritual de inalação de alucinógenos. Peças belíssimas podem ser apreciadas no museu, que não devem em nada as peças da cultura ocidental. A cerâmica também fica mais sofisticada, toda trabalhada com figuras antropomórficas que representam mensagens mágicas e falam da cosmologia daquele povo. Os jarros usados nas cerimônias religiosas trazem enigmáticos rostos humanos e o povo já se expressa numa língua que tomaria conta de toda a região: a kunza.
Durante o período que ficou conhecido no mundo europeu como Idade Média, os povos da região das quebradas do Atacama foram se fortalecendo, criando cidades e produzindo cultura. Por volta do ano mil antes do presente, os atacamenhos formavam uma nação independente, unida na língua e no modo de vida. A relação com os Tiahuanacos e Inkas já havia enriquecido sua cosmologia e eles contavam com todo um arsenal de cantos, danças rituais, textos litúrgicos e música. O uso do instrumento feito de bambu, a quena (uma espécie de flauta, ainda hoje usada), também já era habitual. Seu som primal era um chamado aos deuses, todos praticamente ligados às forças da natureza. O sol, as montanhas, os animais eram reverenciados e muitos são os artefatos que os representam nos rituais. O xamã comandava as cerimônias vestido com uma cabeça de felino, cuja força era muito respeitada.
Na quebrada de Tambores, caminho de saída para o comércio com outros povos, que fica em meio a Cordilheira do Sal, muitos são os petroglifos que revelam o cotidiano e as crenças dos antigos atacamenhos. Antes de saírem pela trilha das llamas em direção a Tiahuanaco e outras regiões, eles desenhavam nas pedras, realizando um ritual mágico de tributo à terra e de despedida do Licancabur, a montanha sagrada que se impõe sobre a paisagem. Contam os mais velhos que quando os viajantes perdiam o contato visual com a montanha era preciso fazer muitos rituais, pois significava que a partir dali estariam sozinhos, sem a sua proteção.
Várias múmias - de gente destes tempos antigos - foram encontradas na região, em excelente estado de conservação e algumas delas podem ser vistas no museu, em toda a sua plenitude. É impressionante a múmia de uma mulher, na qual ainda pode-se observar a pele. Bem no meio do museu - que fica em San Pedro de Atacama - logo à entrada pode-se observar como eram sepultados os mortos. Eles eram vestidos com suas melhores roupas e tinham o corpo amarrado com pedaços de pano. Há registros de que a comunidade os levava em procissão até o local do enterro. O morto era colocado sentado e rodeado de todos os objetos que amava. Depois de coberto pela areia, um pedaço de madeira era cravado para indicar onde estava. Até hoje parte destes costumes sobrevive. No cemitério municipal de San Pedro, são bastante comuns os túmulos feitos de adobe, com os objetos do morto enfeitando a lápide. Tal e qual no Egito, eles acreditavam que, na outra vida, o morto precisaria sentir-se confortável e seguro tendo a sua volta as coisas que amava e precisava no seu cotidiano.
Os espanhóis
Como o povo Likan Antay (que significa atacamenho, na língua kunza) comerciava com os inkas e, nos idos dos 1500 até pagava tributo a eles, tão logo os espanhóis ocuparam aquela parte do Tahuantinsuyo, eles ficaram sabendo que havia um povo estranho destruindo tudo e se prepararam para resistir. Um dos lugares onde fincaram a resistência foi em Pukará Quitor (fortaleza do alto). Este lugar é uma fabulosa fortaleza construída no século 11 da era cristã, para a defesa daquela região. É que naqueles dias também havia muitas lutas pelo poder envolvendo os povos mais distantes. O lugar oferece uma visão fantástica de toda a quebrada. Um dos lados é totalmente inexpugnável e o outro tem um campo de visão imenso, ficando muito fácil perceber qualquer aproximação.
Quando em 1536 os espanhóis Diego Dalmagro Valdívia e Francisco Aguirre realizaram expedições de conquista por aquelas terras, foi ali que os atacamenhos resistiram por mais de 20 anos. Assustados, eles viram chegar o povo Yanaconas - que era inimigo dos inkas e auxiliou os espanhóis na conquista – com uma gente feita de ferro, montada em estranhos animais. Eram os espanhóis vestidos de armadura, cavalgando seus corcéis. Apesar da resistência, os Likan Antay não conseguiram vencer as armas de fogo e acabaram se rendendo em 1557. Naqueles dias, 25 chefes locais foram degolados e tiveram suas cabeças penduradas nos muros para lembrar o que podia acontecer a quem não aceitasse a submissão. Pensavam os espanhóis que era o começo do fim daquele povo. Ledo engano. Apesar de tudo, eles sobreviveram e hoje se erguem, fortes, e recuperam suas velhas tradições. Do alto de Pukará Quitor, quem tiver olhos para ver consegue perceber que a cultura Likan Antay caminha segura na mente e no coração dos homens e mulheres da quebrada.
Nos caminhos dos oásis do deserto de Atacama as gentes seguem rendendo pago aos deuses, cultivando sua cultura solidária, agindo firmemente para mostrar ao mundo que os likan antay existem como etnia e lutando para ter suas reivindicações reconhecidas dentro de um estado pluri-nacional. O Chile, tal qual os demais países da América Latina está vendo as culturas originárias, como a dos atacamenhos e dos mapuches, mais ao sul, recuperando sua dignidade e, sem medo, dizendo a sua palavra. Quinhentos anos de ocupação não lograram apagar a cultura de um povo de pródiga beleza. E é por isso que quando chega o pôr-do-sol, lá no Vale da Lua, se ouve a voz antiga, em língua kunza, a sussurrar: aqui vive o povo likan antay!

Olha ela!

Pobres & Nojentas 13 traz na capa reportagem de Marcela Cornelli. Compre a sua a partir desta terça-feira, 15, na banca da UFSC ou na banca da Catedral, em Florianópolis.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

CARTA A UMA AMIGA QUE ESTAVA NO FUNDO ESCURO DO POÇO

Querida, a primeira coisa a fazer é apagar a frase:"A minha situação financeira é muito crítica".
É feito alguém que diz que está com "uma doença crônica" quando, na verdade, só está gripada ou nem isso.Tudo inicia no pensamento e, já sabemos, o pensamento é imaterial.
Antes do pensamento, apenas a consciência nos salva de todo e qualquer naufrágio.
Consciência: mente sem pensamentos --- eis o Silêncio.
Mente: consciência com pensamentos --- devemos ficar atentos feito um arqueiro zen.
Aquilo que chamam Diabolum (Demônio: ele é dual: bem e mal; crítico, não-crítico) é só o contrário de Symbolum (que é mais amplo, mistura o bem e o mal, e os depura; o Symbolum sabe que onde há sombra há luz).
O Demônio enfraquece a Vida, justamente porque ele não crê que possa haver algo mais que a matéria.
Já a Poesia (regida pelo Símbolo) considera a possibilidade real do invisível (sem desprezar a matéria) e exerce este invisível, reverente, de maneira soberana.
Se tua mente diz, de maneira consciente, que "A minha situação financeira é muito crítica". O que você pode esperar que aconteça?
Por isso temos a Voz do Silêncio (o Dáimon socratiano, lembra?) --- devemos escutá-la --- à Vox Silentium. E ela poderá dizer: "Minha situação esteve crítica até ontem. Nesse exato minuto começa uma abissal transformação. O dinheiro chega fácil às minhas mãos. O dinheiro e alguns ramos com chuvas".
Somos o que pensamos, minha amiga.
Eu tenho estudado muito os princípios filosóficos da Física Quântica. Um dos focos dessa ciência é que, para o Cérebro, não há diferença entre um pássaro de ouro que vemos na árvore perfumada e o ato de imaginar (ou escrever) um pássaro de ouro na árvore perfumada.
Se escrevo um pássaro de ouro na árvore perfumada --- ele, de alguma forma ---, já respira em mim e eu sou todo um pássaro de ouro na árvore perfumada.
E é esta a função da Poesia, dizer o desejo.
Servo reverente de Algo, ou Deus, ou Buddha, ou o Vazio, ou a Quintessência, eu devo aguardar que esse pássaro de ouro e essa árvore perfumada façam de mim o que quiserem.
Ninguém nunca que vai dizer: "Desejo uma faca enferrujada me furando o tímpano".
Somos o que falamos: e a Poesia é a arte de bendizer o maldito (o que está dito mal).
O grande insight de Freud para o século 20 foi que, no Inconsciente, não há o não.
Para Freud, o Inconsciente era o Lugar onde só pode haver o Amor, o Sim primordial, o Fluido Integrativo. E para ali devemos retornar o tempo todo: para o Amor, para o Sim primordial, para o Fluido Integrativo, para os ramos de chuva.
Mas você também pode dizer não (contudo esse não será um sim, porque afirmativo) à mentira, à situação crítica financeira, menos aos ramos de chuva.Sei, minha amiga, que tens virtú (força) para isso.
Havia uma deusa na Grécia Antiqua --- Dânae --- nela caíam chuvas de ouro.
Tu és uma deusa --- moça em flor --- em ti caem chuvas de ouro e pensamentos de luz.
Com Amor, Fernando José Karl

quarta-feira, 9 de julho de 2008

P&N número 13 chega na sexta!

Estará à venda na sexta-feira, dia 11, na banca da UFSC e na da Catedral, em Florianópolis, a edição número 13 de Pobres & Nojentas, que abre o terceiro ano de vida da revista. Na sexta também serão enviados os exemplares dos assinantes. Confira abaixo o Editorial da edição!
Pixurum que faz andar
A expressão “trabalho de equipe” é típica do mundo empresarial. Vamos falar de “pixurum da Pobres” para dar a idéia do espírito que nos anima a entrar no terceiro ano da revista, consolidado nesta 13° edição. É certo que a Pobres & Nojentas continua sua caminhada por um motivo precioso: quando uma de nós está desanimada, outra aparece plena de vontades e desejos, e assim se dá o pixurum, essa palavra de origem tupi que tem a ver com mutirão. Uma anima a outra e esse fazer coletivo das e dos jornalistas envolvidos na produção da revista é que a faz andar.
- Já saiu outra Pobres? – perguntam amigos e conhecidos que nos encontram nas ruas de Florianópolis. – Vai sair, vai sair! – respondemos, apostando que o jornalismo feito nas margens possa ser perene, caudaloso e insaciável no desejo de apontar um mundo outro, onde haja lugar para todos.
O pixurum para construir a Pobres alicerça-se igualmente no apoio cultural do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde e Previdência do Serviço Público Federal no Estado de Santa Catarina. Apesar de o discurso em defesa da democratização dos meios de comunicação ser comum nos sindicatos, o Sindprevs é um dos poucos que faz disso uma prática que frutifica. Basta ler o texto que inicia na página 14, assinado por Marcela Cornelli.
É graças ao fazer coletivo que está edição também chega exibida, com projeto gráfico renovado. Pelas mãos e idéias das jornalistas Rosangela Bion de Assis e Sandra Werle a revista tem novas artes, letras, tons, tudo a serviço da vontade que temos de cristalizar em palavras os feitos e ditos de quem só se percebe pleno na inteireza do outro.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Talento no traço

Camila Bion de Assis, filha mais nova de Rosangela, diagramadora de P&N, já revela talento para desenhar. Olha só o topete do jogador!