terça-feira, 31 de agosto de 2010

Elvis, so blues!

Numa montagem interessante, o passado e o presente se unem!

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Na terra do Minotauro

Por Elaine Tavares - jornalista


Era manhã cedinho quando chegamos a Heraklion, capital da famosa ilha de Creta, espaço bendito do deus Taurus. Tudo ali evoca o sagrado. Desde o mar, azul demais, morada de Posseidon, até os corredores labirínticos do palácio de Knossos. Mas, foi difícil a tarefa de conectar com toda esta história antiga, repleta de mitos e lendas, devido ao burburinho dos turistas que mal escutam a fala das gentes locais, preocupados em tirar fotos. Depois de certo desconforto com tanta gente, tivemos sorte. A guia, que falava um fluente espanhol, era uma senhora de quase 70 anos, de nome Catarina. Experiente na profissão, ela levou o pequeno grupo do qual eu fazia parte pelo caminho inverso. Assim, enquanto todos os barulhentos turistas começavam o passeio pela porta de entrada principal, nós começamos pelo final, no anfiteatro.


A ilha de Creta é a maior ilha da Grécia e a quinta maior do Mediterrâneo. Transformada hoje num Centro Mundial de Turismo, tem 260 quilômetros de comprimento, variando de 12 a 60 na largura, e 650 mil habitantes que se dividem por entre três grandes cordilheiras. Está ao sul do Mar Egeu e tem sua economia baseada no turismo e na cultura da vinha, da oliveira e dos cereais. Segundo a história, ela já foi habitada desde o neolítico, há cinco mil anos antes de Cristo. Mas foi já na Idade do Bronze, no ano de 3000 a.C que na ilha floresceu uma das mais antigas civilizações da Europa: a civilização cretense. Por volta do ano 2000 a.C começa o período minóico, no qual foram construídos palácios gigantescos. Havia um profundo conhecimento da engenharia, da astronomia e o povo cultuava um deus personificado na figura do Touro. Conta-se que no ano de 1.700 a.C aconteceu um terrível terremoto que colocou no chão quase todos os palácios, mas, sob o comando do rei Minos tudo foi reerguido, com maior pompa e riqueza de detalhes, em alabastro, pedra e madeira.

A cultura minóica é reverenciada na Grécia como um dos momentos de grande desenvolvimento dos povos antigos. O povo de Creta dominava os mares e tinha a maior frota da época. Seu declínio começou por volta do ano 1.400 a.C. quando o vulcão de Santorini cuspiu fogo, seguido de um forte terremoto. Naqueles dias, uma onda gigante atingiu a frota e abriu caminho para a ocupação grega, que chegou sem guerra, uma vez que quase tudo estava destruído.


A descoberta dos palácios

O tempo passou e a civilização minóica virou lenda. Entrou para a cosmogonia grega como o território de um mito: o do Minotauro, monstro metade homem, metade touro, que vivia nos labirintos dos palácios do rei Minos e que só era acalmado com o sacrifício de virgens. Conta a lenda que ele – que era filho de Minos - só foi destruído quando Ariadne forneceu a Teseu o segredo para entrar e sair do labirinto. Ele entrou, matou o monstro e saiu seguindo um fio que deixara preso à entrada do palácio. Na verdade, conta Catarina, o mito do Minotauro surgiu por conta de que, na ilha, o Touro era reverenciado como um deus e nas festas de primavera havia celebrações onde os jovens dançavam e brincavam com um touro. Estes afrescos podem ser vistos com detalhes no Palácio de Knossos.


Até 1890, os palácios do rei Minos eram considerados frutos da imaginação dos contadores de história. Foi nesta época que um morador da ilha, coincidentemente chamado Minos, encontrou algumas cerâmicas com inscrições e percebeu que ali poderia estar um tesouro. Ele tentou levar adiante a escavação, mas, naqueles dias, o território estava ocupado pelos turcos, que não permitiram a busca. Foi em 1900 que um inglês chamado Sir Artur Evans, atraído pelas histórias dos palácios veio para Creta e comprou a colina onde Minos havia encontrado as cerâmicas. Não demorou muito e os palácios estavam descobertos, tudo sob a tutela do Museu Britânico. Hoje, o palácio de Knossos é parada obrigatória de quem vai à ilha e uma caminhada por ele torna bastante óbvia a origem da lenda do labirinto. O lugar é gigante e suas edificações são cheias de labirintos de salas e corredores.


A civilização minóica, que floresceu sob o comando do rei Minos era festiva e alegre. Tanto os homens como as mulheres passavam grande parte do tempo em atividades lúdicas, ao ar livre. Gostavam de dança, canto e touradas. Tinham uma escrita própria que demorou muito a ser decifrada. Na verdade, boa parte permanece inacessível, apenas se decifrou uma que trazia dados sobre o palácio, tais como detalhes da construção e controle dos armazéns. As diferenças de classe eram quase inexistentes e havia um equilíbrio muito grande. Minos era considerado um rei muito justo e no seu trono de pedra – o mais antigo da Europa – está estampado um glifo que representa um animal com cabeça de águia, corpo de leão e serpente, representando os três elementos da cosmogonia cretense: o céu, a terra e submundo.


Andando no labirinto

Sob o sol de quase 40 graus o palácio de Knossos adquire uma luminosidade impar e fica difícil imaginar um monstro meio homem, meio touro andando por ali em busca de virgens. Mais fácil pensar numa comunidade simples e prosaica, vivendo feliz à beira do mar. A estrutura tem um grande pátio central e um outro na parte oriental, próximo aos aposentos da rainha. Há grandes buracos com vasos gigantes, sobras de rituais e cerimônias sagradas. A sala do trono é pequena e muito singela. Há um pequeno trono de pedra e uma cabaça ritual, onde Minos fazia suas oferendas. Nela eram colocados óleos sagrados que fluíam para debaixo da terra, onde reinava a serpente, deusa do submundo, controladora dos terremotos. O teto é baixo e com pouca luz, para deixar mais profundo o ar de mistério. Já os aposentos pessoais, tanto do rei quanto da rainha são altos, arejados e cheios de luz, com pátios internos por onde crescem plantas.


Há dezenas de corredores de armazéns onde se guardavam o óleo, o ouro, a prata e os mantimentos. As paredes são pintadas com afrescos cheios de delicadeza e graça. Os homens são representados em marrom e as mulheres em branco, sempre com roupas frescas e vaporosas. Também aparecem com muitas jóias e em cenas de brincadeiras com o touro, danças e jogos.


O touro era sagrado porque a comunidade acreditava na antiga lenda de que o principal deus daquelas terras, Zeus, disfarçado de touro, havia raptado Europa e com ela gerara um filho. Este filho seria o rei Minos, daí a sua fama de homem sábio e justo, uma vez que era um semideus. Por conta desta lenda, todos os anos, acontecia a “taurocatapsia”, uma espécie de brincadeira com o touro, que reunia os jovens em jogos, acrobacias e festas, tendo nascido daí a lenda do Minotauro.

O palácio de Knossos também tem um sistema hidráulico muito sofisticado. Pode-se perceber que os cretenses tinham vários banheiros e cultivavam o hábito do banho diário. Há um sistema de canais que dividiam as águas negras da água da chuva, esta última sempre seguindo o rumo do rio, para que fosse renovado o ciclo da água. É bom lembrar que os construtores de Knossos também estão imortalizados pela história grega: são os arquitetos Dédalo e Ícaro. Para quem não se lembra, foi de cima de uma das torres do palácio que, Ícaro – sonhando em voar como pássaro - alçou vôo com suas asas coladas com cera. Diz a lenda que tanto chegou perto do sol que a cera foi derretendo e ele caiu no lindo mar Egeu.


A saída do palácio fez-se pela entrada norte, que dá caminho para o mar. Era por aquele portão que entravam e saiam os trabalhadores que tornaram famosa a frota cretense. Não é sem razão que bem ali está um enorme afresco com a figura de um touro. É Taurus, o deus, guardando e vigiando a vida de seus súditos.


Pelo caminho de mais de dois mil anos, ainda bastante bem conservado, seguimos em direção ao porto com a profunda sensação de ter estado num lugar mágico. Apesar do buliço das gentes, as colunas pretas imitando o alabastro, os afrescos cheios de vigor e a figura do deus em todo o lugar, dão a oportunidade de um encontro único com um povo antigo que, há mais de cinco mil anos, ali viveu de maneira tão alegre e pacífica. A brisa fresca das árvores que margeiam a saída do palácio murmura bênçãos, o touro nos mira e nos despedimos com a certeza de que os deuses ainda guardam o lugar.


sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O jornalismo serve para fazer aflorar os conflitos

Elaine Tavares - jornalista

O Congresso Nacional dos Jornalistas, que aconteceu em Porto Alegre, de 18 a 22 de agosto, propiciou debates bastante ricos sobre a profissão, embora a platéia, naqueles momentos, fosse bastante esvaziada. Mas, quem ficou para a discussão, conseguiu aprofundar um pouco mais os temas que, depois, seriam disputados acirradamente nas plenárias. Conjuntura, exigência de diploma, regulamentação, formação, experiências alternativas, estas foram as questões que permearam as mesas de debate, ajudando a pensar o futuro do jornalismo no Brasil.

Na mesa de conjuntura, que abriu o congresso, a polêmica já apareceu no primeiro palestrante. Sérgio Murilo, presidente da Fenaj, avaliou que a conjuntura brasileira está muito rica e que há uma consolidação da democracia, embora a mídia não se mostre à altura destes acontecimentos. Segundo ele, há uma incapacidade por parte do mercado em responder positivamente diante destas “imensas possibilidades colocadas pela democracia”. Disse que, hoje, a mídia confunde muito o jornalismo com o entretenimento e que esta é uma aposta equivocada dos donos dos meios. “Eu acabei de fazer um roteiro pelo país junto com o Schröder e vi que as redações não têm as condições mínimas para o exercício do jornalismo. Os empresários não têm noção de para onde vai o mercado, não têm capacidade gerencial de perceber o avanço da concentração dos meios”. Por conta disso, afirmou, é necessário que os jornalistas ofereçam uma nova forma de fazer jornalismo.

Sérgio Murilo foi bastante criticado por esta análise uma vez que não explicou sobre qual democracia falava. A democracia liberal? A financeira? Se forem estas duas, sim, ele tem razão. Estão firmemente consolidadas, mas isso não é bom. Também foi questionado no que diz respeito a sua visão dos empresários. A delegação de Santa Catarina argumentou que não há nenhum equívoco na conduta dos patrões. “É da natureza do capitalismo agir assim, os empresários têm muita noção de para onde está indo o mercado e o estão gerindo muito bem. Assim é no capitalismo. Acreditar que os empresários estão equivocados e que é preciso ensiná-los no seu negócio não deve papel da Fenaj”.

O diretor do Jornal Já, de Porto Alegre, Elmar Borges, disse que os jornalistas mais velhos foram praticamente expulsos das redações, o que diminui a visão crítica, e compartilha da idéia de que há uma democracia consolidada e que as empresas se recusam a ver a realidade. Um dos criadores da idéia do Coojornal, cooperativa que brilhou durante a ditadura militar, ele acredita que hoje o que se precisa é fazer a luta tanto dentro dos jornalões e grandes mídias, como fora deles.

O representante da Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ), Gustavo Granero, disse que o que importa para o sistema mundial é o dinheiro e a concentração de riqueza, daí a necessidade de que tenha menos jornalismo, menos informação. “É por isso que eles apostam no lixo do entretenimento”. Segundo ele, por conta desta conjuntura é preciso que os jornalistas tenham claro sobre qual é o alvo da luta. “O jornalismo mundial está em crise, não há diversidade de fontes. Pelo menos em 40% das notícias que se lê não se consegue identificar quem está falando. Além disso, no México, na Colômbia, em Honduras, estão matando os jornalistas que falam. Na África não tem internet, não tem telefone, o povo está tratando de sobreviver. Na América Latina ainda temos de caminhar para encontrar um perfil próprio”.

Transformar o imaginário
O professor da Famecos, Juremir Machado, trouxe uma contribuição provocativa, apontando a servidão voluntária como um dos grandes problemas no jornalismo, seja por parte dos jornalistas ou dos patrões na relação com o empresariado. “Por isso a mídia é tão conservadora”, avaliou. Para ele, um dos grandes problemas da categoria na atualidade é a consolidação de um imaginário no qual as “pessoas boas” são aquelas que se apresentam como moderadas. E “as pessoas más” são os radicais. Esses não aparecem na mídia. “Mas, quem pode apostar que os ditos moderados sejam os portadores da verdade?”

Para Juremir o grande desafio é transforma esse imaginário que toma conta dos jornalistas na sociedade do espetáculo, na qual só aparecem as coisas que os jornalistas consideram “boas”. Se não aparecem os conflitos sociais, por exemplo, é porque os envolvidos são “maus”. Essa é a lógica. “No caso da América Latina o que a gente ouve? Que estes presidentes de esquerda são fanáticos, são perigosos. Mas, se pensarmos bem, quem pode ser mais perigoso que um José Sarney? Esse aí não seria um radical?” Provocativo e polêmico, Juremir nem abriu debate, estava atrasado para o seu programa de rádio. Ainda assim, não tergiversou: os jornalistas precisam transformar o imaginário.

A decisão do STF
O advogado Antônio Carlos Porto afirmou que o STF julgou a questão do diploma com base num conceito de liberdade típico do século 19. Segundo ele, o tempo de hoje é o da produção industrial de notícias, onde não cabe a concepção do indivíduo, tal qual entendem os ministros. “A questão da liberdade de expressão não está no campo individual, do jornalista, mas deve ser debatida na relação com o direito de propriedade. Afinal, qualquer pessoa pode ter um blog, mas só um empresário da comunicação pode produzir em escala ”.

O professor Manoel Chaparro, da USP, chamou a atenção para o fato de que os jornalistas brasileiros ainda não aprenderam a fazer jornalismo na liberdade e muito menos sabem qual a razão de ser do jornalismo. “O princípio básico do jornalismo é ser independente. Mas essa não é uma coisa fácil nem mesmo em relação a nós mesmos. Às vezes fracassamos, mas temos de seguir defendendo isso”. Chaparro lembrou que, antes, eram os jornalistas que andavam em busca das notícias num mundo que era silencioso. Hoje não, elas chegam aos borbotões. O mundo é falante. “Então a gente vê que os jornalistas trabalham com conceitos velhos. Não incorporaram os novos tempos”.

Contrário a exigência do diploma, ele disse que como bem lembrava Darcy Ribeiro, os avanços civilizatórios se dão por revoluções tecnológicas e não pela luta de classe. “Isso é duro, mas precisa ser levado em conta. Os jornalistas precisam passar um olhar humilde sobre o cenário em que trabalham. O direito de informação deixou de pertencer aos jornalistas, e hoje todos podem exercê-lo”. Chaparro alertou para o fato de que os sujeitos sociais da atualidade aprenderam a ver a notícia como parte do acontecimento. Há uma revolução das fontes. Elas se dizem sem precisar do jornalista. Elas comandam as agendas”. Na verdade o professor da USP deixou de lado o paradoxo que esta situação apresenta. Se, de fato, existe hoje um mundo falante, nada garante que este mundo possa de fato se expressar, afinal, a concentração dos meios é cada dia maior. Nesse sentido, o limite da fala é sempre dado pelos donos das empresas. Da mesma forma, o diploma. Se é fato que a informação saiu do controle do jornalista, isso não significa que o trabalhador, explorado nos meios de comunicação de massa possa ficar sem a proteção legal. Hoje, defender o diploma é fazer sim uma luta corporativa, mas isso não deveria envergonhar o trabalhador. Muito pelo contrário. É uma luta legítima diante da exploração promovida pelos donos dos meios.

Foi aí que o procurador de Santa Catarina, João dos Passos não deixou dúvidas: a decisão do STF carece de fundamentos jurídicos. Segundo ele, o decreto que foi colocado em questão não tem nada de inconstitucional, pois não há na Constituição Federal nenhuma norma que trate da regulamentação de profissões. “O STF judicializou um assunto que pertence ao terreno da política, do Congresso Nacional. Está muito claro na Constituição que é o legislador quem tem a competência para decidir sobre o exercício profissional. O STF aparentemente usurpou as funções legislativas interpretando de maneira tendenciosa. Seria como dizer que não precisa diploma para um advogado porque ele prejudicaria o direito a ampla defesa do contraditório, ou como se a Carteira de Motorista impedisse o direito de ir e vir”.

O deputado Ibsen Pinheiro também reforçou a idéia de que é o Congresso quem define em lei sobre a regulamentação das profissões, e o judiciário deveria se limitar a isso, ao cumprimento da lei, sem querer ser protagonista no campo da política. Ibsen também discorreu sobre o conceito de liberdade de expressão lembrando que este não é um direito absoluto. “Uma pessoa não pode gritar `fogo´ num teatro lotado se não houver fogo. O direito de expressão deve ser interpretado na convivência com os respectivos limites. E isso não é censura”. Sobre a PEC em tramitação no Congresso ele acredita que tem grandes chances de ser aprovada, embora venha a abrir uma exceção na lei. “Até hoje não se constitucionalizou a regulamentação das profissões”. Ele acredita que o processo não será tão rápido quanto acreditam algumas lideranças da Fenaj.

A defesa da profissão e o futuro do jornalismo
A mesa que discutiu o futuro da profissão trouxe o debate sobre a formação. Sérgio Gadini, do Fórum Nacional de Professores de Jornalismo contou que existem hoje 1.300 escolas de jornalismo que lançam no mercado mais de 400 novos profissionais por ano. O desafio, depois da decisão do STF, é definir por que se formar. Segundo ele houve um golpe na identidade e agora os alunos estão se perguntando as razões para a diplomação. Para ele, mais do que nunca os cursos deveriam fortalecer o olhar sobre a demanda social de informação, deixando de vê-la como mercadoria.

O repórter da Globo, Marcelo Canellas, reforçou esta posição lembrando que quando era estudante esteve metido no Centro Acadêmico, foi à Brasília lutar pelo diploma, se envolveu com o aspecto social da profissão. Hoje, como repórter, ele procurar “enfiar o pé na lama” para sempre encontrar boas histórias que desvelem as contradições da sociedade. “O jornalismo é uma forma específica de conhecimento, precisa de formação”. Canellas criticou a universidade por estar distante destes debates, e sem conexão com os sindicatos. “Longe da vida real, não é possível formar bons profissionais”. Lembrou ainda que, hoje, é o jornalismo que determina quais acontecimentos estarão na agenda do público e o jornalista tem obrigação de interferir nessa agenda. “Para isso o jornalista tem de ter posição sobre as coisas e também as ferramentas teóricas para bancá-las”.

O professor Antônio Holfeldt, da PUC/RG salientou a necessidade de a universidade formar um jornalista que tenha olho crítico, que seja humanista e tenha conhecimento dos grandes textos do jornalismo. Durante o debate foi levantado como argumento a incapacidade da universidade de trabalhar com o pensamento novo. Os jovens que hoje saem da universidade saem preparados tecnicamente, mas não sabem pensar. Há um afastamento dos professores do mundo real e das lutas sindicais. O povo passa a ser objeto de pesquisa, passível de vampirismo intelectual, enquanto suas demandas ficam silenciadas pelos profissionais que deveriam ser críticos. Foi lembrada a teoria de Adelmo Genro Filho sobre o jornalismo, que poucos professores conhecem, e os que a conhecem, no mais das vezes a esterilizam, esquecendo de que ela é uma teoria marxista, portanto, tendo como foco principal o desvelamento da realidade.

De todas as mesas, com debates de alta qualidade, ficou a certeza de que o profissional do jornalismo precisa encontrar tempo para estudar, conhecer as novas teorias, ser capaz de pensar o novo, de olhar criticamente para a realidade e narrá-la. Além disso, como bem lembrou Manoel Chaparro, o papel do jornalismo é fazer os conflitos aflorarem. Sem isso, os profissionais serão meros porta-vozes, e não encontrarão amparo na sociedade.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

VOCÊ SABE O QUE ANDA COMENDO? PARTE III

Li Travassos

Em julho de 2009 escrevi um artigo, publicado aqui no site da Pobres... com este título. Falava principalmente de corantes, e de quanto podem ser nocivos à saúde. Mas passava também por carne vermelha (que eu não como), refrigerante (que, sim, eu ainda tomo de baldes) e outras coisinhas mais. Depois escrevi uma Parte II, bem curtinha, que era só para avisar que uma leitora havia encontrado um erro no meu primeiro texto. Por absoluta falta de tempo, só hoje consegui terminar este texto, que estou "parindo" faz dias...
Há pouco mais de um mês, descobri que o tal "glutamato monossódico", presente em grande parte dos alimentos processados, na verdade ativa as papilas da língua para que você perceba um sabor que não existe. Esta "ativação" constante poderia vir a causar câncer de língua. Mas não pára por aí. Embora vários sites afirmem que ele não faz mal (a quem será que eles servem?), se você for ao site
http://www.anovaordemmundial.com/2009/10/glutamato-monossodico-gms-o-sabor-que.html vai descobrir que ele pode ser responsável por males que vão da depressão à arritmia, podendo mesmo levar à morte.
O pior é que o glutamato está presente não apenas em produtos cuja base é ele mesmo, como os chamados realçadores de sabor, mas também em todas estas sopinhas prontas que facilitam nossa vida no inverno; em quase todas as comidas semi-prontas, que você só precisa esquentar; e até em comidas feitas especialmente para crianças pequenas. Ou seja: esta comida toda não tem gosto de nada, e por isso precisa do tal do glutamato para "tapear" os seus sentidos. Dá para piorar? Sim: a cada dia que passa, são inventados novos tipos de realçadores de sabor, que são puro glutamato monossódico. Coisas para deixar o arroz, o feijão, etc., parecendo ter gosto de que foram feitos por alguém que sabe cozinhar melhor do que você, em resumo.
Também descobri que o peixe mais metido a besta do mundo, o tal do salmão, além de levar, depois de morto, um corante à base de sangue, como eu já havia denunciado no meu primeiro texto sobre alimentação, está sendo criado em cativeiro, onde recebe doses de DNA de porco, para que se desenvolva com maior rapidez. Ou seja: quem come este tipo de salmão está comendo um animal transgênico. Se temos quase certeza de que vegetais transgênicos fazem mal à saúde, imagine um animal transgênico!
Fui ao supermercado dia 4, e fiquei meio biruta, tentando comprar alimentos sem corantes artificiais ou animais, sem glutamato monossódico... Acabei trazendo para casa uma massa super engordiet e ainda por cima cheia de gordura trans... Parece que o mundo (ou a industria alimentícia) te diz assim: tá legal, você mulher, resolveu sair da cozinha, ir trabalhar fora de casa, não sabe nem cozinhar? Então tá, a gente te alimenta, alimenta teus filhos, facilita tua vida na cozinha, mas depois não reclame se você ou teu filho tiver câncer, alergia, obesidade...
Queria escrever sobre isso, mas estava sem tempo... Então, quinta feira, dia 5, no jornal da globo da hora do almoço, escuto que "descobriram" uma nova "doença". Um estaduinense chamado Steven Bratman "descobriu" que existem pessoas viciadas em comida saudável, ora veja! E denominou a doença de "ortorexia". O sintoma seria a pessoa ficar procurando saber os componentes de cada alimento, a maneira como sua comida é preparada, a ponto de prejudicar seu convívio social...
Bueno, como eu vivo "metendo o pé na jaca" em meus cuidados alimentares, em festas como bolo, doces, todos os salgadinhos fritos que não levem carne, e no meu dia a dia não dispenso refrigerante, chocolate, e outros alimentos nada recomendáveis, fiquei furiosa. Eu, que já comi muito pão com salada em churrasco, só para não perder a companhia das pessoas, que nunca deixei de fazer nada na vida porque tenho restrições alimentares auto-impostas, que nunca deixei minha alimentação prejudicar meu convívio social, fiquei, realmente, de fato, furiosa.
Por que vou sim, para o supermercado munida até mesmo de lupa, para ver se enxergo as malditas letras minúsculas das embalagens dos alimentos, para tentar evitar o que há de pior na alimentação pronta ou semi-pronta, já que adoro comer e não adoro cozinhar... Para evitar ser assassinada lentamente, e ainda pagar por isso. E não acho que sofro de doença nenhuma em relação a isto, a não ser que seja doença a gente querer evitar colocar para dentro de nosso corpo substâncias comprovadamente nocivas à saúde. Daqui a pouco, vão dizer que quem evita tomar remédios sofre de algum tipo de doença também...
Certo, por suposto, seria consumir todo o lixo alimentar que nos disponibilizam. Certo seria aceitar o mundo como está posto. Certo seria, talvez, trocar de esmalte diariamente, como fazem algumas adolescentes "antenadas", que não tem noção de ser o esmalte (e seus removedores) um dos produtos mais nocivos ao meio ambiente que já foram criados – imagina então o que ele faz com as unhas... E a Globo, claro, estimula este comportamento absurdo, e questiona quem se preocupa com o que come... Certo, por suposto, é ser como todo mundo. Bueno, eu não sou! E espero que você não seja, e que seu vizinho não seja, e que a gente possa aumentar no planeta cada vez mais o número de pessoas "diferentes", "doentes", e inconformadas... quem sabe uma hora a gente não vira maioria e chuta o balde dos ditos normais?

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Penna Filho: um homem do cinema

Elaine Tavares

A figura do diretor de cinema geralmente vem associada a alguém excêntrico, vaidoso ou temperamental. Penna Filho não tem nada a ver com esse estereótipo. Ele é tranqüilo, doce e cheio de ternura. Aos 77 anos está em plena atividade, lançando seu mais recente filme “Doce de Coco”, vencedor do Prêmio Cinemateca Catarinense e que cumpre uma linda jornada pelo interior deste estado, apesar de ser olimpicamente ignorado pela mídia comercial. Penna Filho vive em Florianópolis e, dia desses, esteve na Rádio Comunitária Campeche falando do seu filme e de sua trajetória de homem da palavra e da imagem.

Penna Filho nasceu capixaba em março de 1936, mas se fez do mundo quando decidiu mudar para São Paulo em 1959, para fazer cumprir seu destino de “contador de histórias”. Ainda em Vitória ele, quase um menino, iniciou sua carreira de locutor, ator, repórter, produtor e diretor artístico. O guri magrinho era um dínamo e sua voz serena prenunciava a delicadeza das narrativas que ele construiria ao longo da vida.

Na capital paulistana ele dava os primeiros passos junto com a televisão, crescendo e aprendendo com esta nova forma de comunicação que iria revolucionar a vida humana. Seguia no rádio, mas a imagem já começava a mexer com sua cabeça criadora. O golpe militar o tira do circuito da rádio comercial, porque um texto seu sobre o fato, censurado na Rádio Bandeirante, o faz ser demitido. Impedido de dizer a palavra libertadora ele mergulha no cinema. A tela grande o chama e ele passa a trabalhar como continuísta e assistente de direção em filmes de gente como Ody Fraga, Ary Fernandes, Milton Amaral, Carlos Coimbra e Mazzaroppi, de quem guarda boas lembranças. Paralelo a isso atua em dublagens de filmes para televisão, como ator e diretor. No início dos anos 70 ele já era um dos profissionais mais incensados pelo povo do cinema e da televisão, onde voltou a atuar na área da propaganda.

No início dos anos 70 chegava a hora de Penna Filho dirigir seu próprio filme, e foi quando nasceu “Amores de um cafona”, feito em parceira com Osires Figeroa. Mas, o seu solo foi “O diabo tem mil chifres”, que a censura militar considerou imoral e iconoclasta. Esse filme não pode ser visto por ninguém até o final dos anos 70 e marcou a vida de Penna Filho como um período em que faltaram as possibilidades de trabalho. Por conta disso ele regressou à televisão para fazer reportagens, atuando em programas como o Fantástico e o Globo Repórter, na Globo.

Em 1977 entra para a TV Cultura de São Paulo e ali consegue produzir documentários e programas que, inclusive, são premiados. Foi um tempo de muita criação, no qual também dirigiu alguns especiais. É só nos anos 90 que ele volta para os 35 milímetros, com o filme Naturezas Mortas, ganhador de vários prêmios também. Em 2006 realiza um longa sobre a vida do jogador de futebol Ademir da Guia, “Um craque chamado Divino” e em 2009 finaliza outro longa, o “Doce de Coco”.

Esta curta descrição da vida profissional de Penna Filho certamente não lhe faz justiça, mas já dá uma idéia do potencial criativo deste homem que segue enfrentando a máquina trituradora do circuito comercial de cinema, que conta hoje com apenas 2.200 salas em todo o país, menos da metade do número de municípios, embora o governo federal alegue que são mais de seis mil. Isso já deixa claro o quanto o cinema está em baixa no país e o quanto não há incentivo para este tipo de espaço cultural. No mais das vezes, as grandes cidades só têm salas nos centros comerciais (xopins) e a mágica do cinema não existe mais. E, no interior, já se pode falar de uma geração que nunca viu um filme em tela grande. Além disso, as salas que existem são praticamente prisioneiras da indústria estadunidense, com mais de 2/3 delas nas mãos de duas ou três megaempresas, dificultando a caminhada de produções cinematográficas que não estejam vinculadas ao sistema. Não bastassem todas estas dificuldades, a Globo ainda abocanha grande parte das produções nacionais, sendo subsidiária de uma empresa estadunidense. Por isso abundam os filmes “engraçadinhos” com atores globais. Tudo faz parte do mesmo esquemão. “A gente observa que estas produções são feitas só para o povo rir. Eu não, quero filmar para o povo rir e refletir”, diz Penna Filho.

Sua mais nova produção é assim. Doce de Coco é um filme que conta da vida da gente brasileira, o povo simples que batalha para sobreviver, mas que também é engraçado, sonha e faz planos para sair do sufoco da vida massacrante. Trabalho difícil de realizar por conta dos poucos recursos e tudo o que envolve fazer cinema na “periferia” do país, como é o caso de Santa Catarina. Mas, que, a despeito de tudo isso, o filme, rodado no Ribeirão da Ilha (patrimônio cultural de Florianópolis), se completou e seguiu seu caminho, sendo apresentado por todo o estado de Santa Catarina no projeto “Cinema para o povo sem tela”.

Penna Filho acredita piamente que o audiovisual no Brasil poderia ser auto-sustentável, mas para isso haveria que ter uma política pública real, que garantisse igualdade de condições aos profissionais. Hoje, da forma como está colocada a Lei Rouanet fica muito difícil. Os artistas precisam fazer romarias às empresas que, muitas vezes, não tem interesse em realizar os trâmites. “Agora tem uma proposta de mudança aí, em que as empresas terão de dar em dinheiro vivo de 10 a 30% dos recursos. Pode ser que dê mais certo”. Fora os editais públicos ou os trâmites da Lei Rouanet os cineastas independentes ficam em péssima situação. Aqueles que não se vendem ao esquema Global - que é subsidiário de grandes empresas estadunidenses - têm que penar muito para realizar um trabalho. Porque fazer cinema é coisa grandiosa, envolve muita gente, figurinos, cenários e tantos outros detalhes que demandam dinheiro.

Agora, tramita no Senado Federal uma medida provisória (a 491/210), do governo federal que, entre outras coisas, apresenta o projeto “Cinema perto de você”, uma proposta de criar salas de cinema nas cidades pequenas e nos bairros de periferia das grandes cidades. A idéia em si até é interessante, mas se não tocar na questão da distribuição dos filmes – sempre na mão estrangeira - e não garantir espaço digno ao cinema nacional será só mais uma sala a projetar o lixo ideológico estadunidense. A medida também avança para o estabelecimento de linhas de crédito, via BNDES, e com facilidades tributárias para as empresas que investirem no cinema. Mas, também isso não garante uma mirada mais autóctone para a cinematografia.

Apesar destas propostas pontuais, no Brasil há muito pouca compreensão de que o cinema deveria ser espaço de contação das histórias locais, dos personagens nacionais, dos fatos históricos, dos mitos, da realidade tupiniquim. Tirando alguns momentos, muito pontuais, o cinema nacional é mera reprodução do jeito de fazer estadunidense. Basta uma olhada no megassucesso Se eu fosse Você, com Glória Pires e Tony Ramos, que chegou a ter um segundo “capítulo”. Nada mais é do que a reprodução – mal feita – das batidas comédias românticas do cinema estadunidense. Colonialismo mental e cultural que vai se reproduzindo feito praga. E, nesse diapasão, a vida que vive neste imenso país encontra muito pouco espaço para ser narrada. Até porque o Brasil não é só São Paulo e Rio de Janeiro. Por isso, o catarinense Doce de Coco, dirigido por Penna Filho, filmado no interior da ilha, tem de ir rompendo as barreiras, punho em riste, como os próprios personagens, que precisam apostar num grande sonho para poderem se mover adiante. O sonho do Penna Filho, ele não disse, mas pude demandar no seu olhar misturado de ternura e força, que é o de ver, cada vez mais, o Brasil na tela grande. O Brasil de verdade, destes cantões, as gentes reais, se dizendo na beleza e na luta.

Já a política, bem, esta é outra seara, tão difícil de ser desbravado quanto fazer uma produção que seja independente do sistema internacional. Sem a ação coletiva e crítica da classe artística, as proposições governamentais continuarão a ser pontuais e sem conexão com uma proposta verdadeiramente nacional.

A filmografia completa e outras informações sobre Penna Filho podem ser encontradas no sítio: http://www.pennafilho.com/

AUDIÊNCIA PÚBLICA EM DEFESA DAS LIBERDADES DEMOCRÁTICAS

*19 de agosto, 18h30, no Auditório Antonieta de Barros *

*Assembléia Legislativa de Santa Catarina *

*_Convocatória _*

Em Santa Catarina, a repressão às manifestações públicas dos cidadãos, particularmente aos movimentos sociais organizados, se torna cada vez mais violenta e freqüente.

Trabalhadores rurais são ameaçados de expulsão e despejados de terras que poderiam ser suas por direito. Empresários contratam jagunços que ameaçam idosos, mulheres e crianças. O Estado, ao invés de impedir tais situações, usa da polícia para reforçá-la, como ocorreu recentemente em Taió e Imbituba.

Estudantes de Florianópolis há mais de cinco anos lutam contra o aumento da tarifa e pelo passe livre. A tarifa hoje de R$2,95 (em dinheiro) e R$2,38 impossibilita inúmeras famílias pobres enviar todos os seus filhos para escola e garantir outros elementos de subsistência. No entanto, a prefeitura utiliza todo o aparato policial para reprimir os estudantes e assim garantir o lucro das empresas do setor de transportes. Em 2010 mais de 20 presos (que sofrem inquéritos), com a UDESC e a UFSC invadidas. Essa realidade se repete todos os anos e nada acontece aos responsáveis por arbítrios que nos lembram a Ditadura Militar.



Em algumas empresas, os trabalhadores organizam chapas para seus sindicatos na clandestinidade, sofrendo com pressões de todas as ordens, inclusive de jagunços. O direito de greve não tem sido respeitado, pois sempre que elas acontecem os diretores dos sindicatos são processados. Acordos, mesmo assinados, não são cumpridos.

Inclusive os policiais sofrem repressão. Desde dezembro de 2008, 21 praças, participantes da APRASC, foram expulsos da PM por lutar por melhores condições de vida. Uma lei nacional anistia a eles e a outros no Brasil, mas o governo de Santa Catarina se nega em cumpri-la.

Em 2009 o Comandante da PM da Capital afirmou publicamente: “/eu combato os movimentos sociais/”. Ele continua no posto.

O portão do Pasto do Tio Júlio

Por Urda Alice Klueger

Lembro-me como se fosse hoje, mesmo que já se tenham passado umas quatro décadas. Era o portão do principal pasto do tio Júlio, porque o tio Júlio tinha diversos pastos, e suas nédias e mansas vacas holandesas faziam rodízio neles, alimentando-se sempre de grama nova e viçosa. O portão do pasto do tio Júlio era daqueles portões de madeira encarunchada e arame farpado que quase todas as propriedades tinham então, e era aberto sempre que se queria, por qualquer um, mesmo que fosse uma criança. Ele só era fechado por uma corrente que engatava num prego, e eu e meus primos podíamos abri-lo sem nenhuma dificuldade.

Lá no tio Júlio havia oito primos, fora três “anjinhos” que dormiam no cemitério e para quem a gente levava flores – mas os primos de idade mais próximas da minha eram o Jorge e o Afonso, a Ruth e a Darcy. Desde muito pequenos eles ajudavam tio Júlio em milhares de coisas no seu ofício de produtor de leite para o Hospital Santa Isabel, de Blumenau: colocavam gramão e cana na máquina de cortar trato, carregavam os balaios de trato para os cochos das mansas vacas holandesas, tinham seus próprios banquinhos de ordenha e tiravam baldes de leite de cada vaca, pois as do tio Júlio eram vacas premiadas, que produziam muitos litros de leite a cada dia. Era necessário, então, depois da ordenha, levar as vacas para o pasto daquela ocasião (elas freqüentavam um pasto de manhã e outro de tarde), e a Darcy, e o Jorge, e os outros é que o faziam, e muitas vezes abriam o portão mencionado, e acompanhavam mais de trinta vacas estrada abaixo, até o pasto escolhido para aquele dia, indo buscá-las de noitinha para a nova ordenha, abrindo e fechando o portão sem nenhuma dificuldade. No tempo em que eu era bem pequena, tio Júlio passava naquele portão com sua carroça; mais tarde, já lá pelos anos 60, entrava ali com seu carro. Em ocasiões em que havia um touro brabo no pasto, o portão ficava fechado o tempo todo – em outras ocasiões, quando as vacas já tinham saído para pastar alhures, o portão podia ficar aberto, com o cavalo Baio sozinho lá no pasto, que o Baio era tão manso que não fugia. E reafirmo o que já disse acima: o portão tinha tal simplicidade de fechadura que qualquer criança pequena podia abri-lo ou fechá-lo.

Mas então o tempo passou. Tia Fanny, e depois o tio Júlio, ambos acabaram viajando para outras plagas, e seus herdeiros tiveram que decidir o que fazer com aquela barbaridade de terra que tinha ficado. E ali no pasto principal do Tio Júlio cresceu um imenso condomínio cheio de prédios modernos, com um portão de entrada exatamente onde tinha sido o antigo portão do pasto. Meus primos moram lá, hoje, cada um num espaçoso apartamento, e cada um levou consigo para a nova morada algumas peças de mobiliário da antiga casa do Tio Júlio, e eu vou lá e tenho vontade de chorar quando as vejo e lembro daqueles tempos que ficaram lá tão longe. Meus primos tiveram o cuidado de mandar imortalizar por famosa pintora as fotos daqueles tempos em que eu era criança, e em que qualquer pequena mão infantil podia abrir o grande portão do pasto, e nas paredes dos seus apartamentos aqueles quadros são como que um soco no peito que o passado nos dá.
No Domingo passado eu fui lá lhes fazer uma visita. Minha mãe, que foi junto, telefonou antes, para confirmar estas coisas de bloco e andar, estas coisas que existem nos endereços contemporâneos. E então, que aconteceu? Minhas primas disseram:
- Olha, vocês trazem o celular e ligam lá do portão, que então a gente abre!

Santo Deus, há que se ter um telefone celular, agora, para se entrar no portão do pasto do tio Júlio! Levamos o celular, entramos – eu aproveitei para dar uma espiadinha no sistema de interfone que havia lá no portão, e que era complicadíssimo, desses que se criam para enganar qualquer ladrão, coisa de uso impossível para pessoas comuns. Sem celular, a coisa fica bem difícil!

E pensar que era um portão que qualquer mãozinha de criança abria!



segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Luta social segue sendo criminalizada

Presidente da Aprasc é excluído da Polícia Militar pelo comandante-geral

O presidente em exercício da Aprasc, sargento Manoel João da Costa, foi excluído pelo comandante geral da Polícia Militar, coronel Luiz da Silva Maciel, no final da tarde desta sexta-feira, 13, por causa da participação no movimento reivindicatório de dezembro de 2008. Para o sargento J. Costa, o ato do comandante é um desrespeito ao Decreto 3.433, assinado pelo governador Leonel Pavan no dia 3 de agosto desse ano, que suspende os processos administrativos em andamento, e a Lei da Anistia (Lei Federal nº 12.191/2010). “O coronel está desrespeitando a vontade do governador, que é o chefe supremo da Polícia Militar, de apaziguar a situação na corporação e anistiar os praças acusados injustamente”, critica.

O próprio comandante havia publicado nota, no dia seguinte ao decreto, em que garantia o retorno à normalidade das atividades dos policiais acusados nos processos referentes a dezembro de 2008.

A medida do comandante da PM vai na contramão da decisão do governador e do entendimento da Justiça estadual, que já determinou a reintegração de três policiais militares expulsos injustamente.

A decisão foi comunicada à assessoria jurídica da Aprasc, no final da tarde, depois que o comandante negou recurso. Logo, a portaria de exclusão deve ser publicada no Boletim do Comando Geral (BCG) e o presidente da Aprasc vai ter que passar por exame médico antes de assinar sua exclusão.

Ele é o 22º policial militar expulso da corporação por participar de manifestação reivindicatória. J. Costa está aposentado (reserva remunerada) desde abril de 2008. Ele ingressou na Polícia Militar em 12 de maio de 1981 e trabalhou em diversos setores.

Fonte: Aprasc

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Nildo Ouriques fala sobre Guerreiro Ramos

http://eteia.blogspot.com/2010/08/nildo-ouriques-fala-sobre-guerreiro.html

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Álvaro Uribe e os crimes de lesa humanidade

Por Elaine Tavares jornalista

A mídia brasileira é pródiga em falar do conflito armado na Colômbia, sempre na perspectiva do governo, até estes dias, de Álvaro Uribe. Este, geralmente foi mostrado como o grande democrata que estava fazendo todo o possível para acabar com uma guerra civil que perdura por décadas. Jamais se ouviu ou se leu na mídia comercial brasileira sobre a famosa “black list”, um documento produzido pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos, que mostra Uribe como um narcotraficante. O documento é explícito: Álvaro Uribe é um senador (isso em 1991) que colabora ativamente com o cartel de Medelin, recebe dinheiro por isso e é amigo pessoal de Pablo Escobar. Talvez por isso mesmo os EUA tenham apoiado o então senador quando este quis ser presidente da Colômbia e o foi por dois mandatos. Não é sem razão que Uribe permitiu a instalação de nove bases militares estadunidenses no território colombiano.

Durante estes anos em que esteve à frente do governo colombiano, Uribe certamente não deixou de ser um fiel servidor do narcotráfico e não é à toa que agora inicia um processo de guerra contra a Venezuela, alegando mentiras sobre a ligação do governo de Chávez com os “terroristas” das FARCs. Segue o mesmo exemplo de seu chefe, George Bush, quando quis fazer a guerra contra o Iraque, a partir de mentiras como a que o Iraque teria armas químicas.

Primeiro, as FARCs não são formadas por terroristas. São exércitos regulares que lutam, armados, contra o exército da Colômbia e tem um plano de libertação para o país. Segundo, Uribe tem todo o interesse em se manter fora da cadeia, já que é um narcotraficante reconhecido inclusive pelos EUA, então precisa criar sobre si uma cortina de fumaça. E terceiro, durante seus mandatos promoveu tantos crimes e atrocidades que igualmente deve ser julgado por crime de lesa humanidade.

Na última semana, uma fossa encontrada no pequeno povoado de La Macarena, a uns 200 quilômetros de Bogotá, região que é conhecida como uma das mais “quentes” no processo do conflito colombiano, revelou parte de toda essa atrocidade que o terrorismo de estado tem praticado ao longo dos anos. Mais de dois mil cadáveres foram encontrados, amontoados uns sobre os outros, alguns ainda com as mãos e pés amarrados. Este se trata de um dos maiores enterros coletivos de vítimas que se tem notícia na América Latina. Segundo as informações dos jornais colombianos, a fossa teria corpos desde o ano de 2005, sempre renovados.

O exército colombiano se apressou em dizer que os corpos eram de guerrilheiros que haviam morrido em combate. Mas, o povo da região não confirma isso. Pelo contrário, o que os moradores dizem é que aqueles corpos são de líderes sociais, camponeses e militantes populares que desapareceram sem deixar qualquer rastro.

A cova foi descoberta por conta da denúncia realizada por gente que esteve por anos atuando junto aos paramilitares e que se entregou sob a proteção de uma controvertida lei chamada de Lei de Justiça e Paz. Esta lei garante aos informantes uma pena simbólica se eles confessarem seus crimes. Durante estas sessões de “confissão”, um dos chefes de um grupo paramilitar chamado John Jairo Renteria revelou que ele e seu grupo chegaram a enterrar mais de 800 pessoas em uma fazenda na cidade de Puerto Asís. Também confessou que os seus comandados usavam estas pessoas (sindicalistas, militantes sociais, estudantes) para aprender como esquartejar uma pessoa e revelou que alguns procedimentos eram feitos com as pessoas ainda vivas.

A audiência e a localização dos corpos da cova de La Macarena aconteceram no mesmo dia em que o governo de Santos, atual presidente colombiano, pediu uma reunião urgente na OEA para denunciar a Venezuela como um estado que estava acolhendo membro das FARCs. Nada mais do que outra cortina de fumaça para tentar encobrir o horror da descoberta e das outras tantas atrocidades produzidas pelo governo de seu amigo e antecessor Álvaro Uribe.

O povo organizado da Colômbia quer que tudo seja esclarecido e exige ainda a punição de Uribe por estes crimes, imprescritíveis, de lesa humanidade.

Veja fotos da cova descoberta em La Macarena.

www.iela.ufsc.br

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Em defesa da memória cultural do Campeche

A comunidade do Campeche realiza, neste domingo, dia 8 de agosto, a partir das 10h, uma caminhada que sai da Rádio Comunitária (que fica na travessa em frente ao restaurante Alguidar) até o mega empreendimento imobiliário Essence Life Residence (que fica em frente ao Bar do Chico), para protestar contra a decisão do juiz Hélio do Valle Pereira de derrubar o bar que era um espaço comunitário e memória cultural do bairro.

A caminhada pretende questionar a decisão judicial diante de tantos empreendimentos que estão sendo liberados, mesmo em cima das dunas. É o caso do Essence, um conjunto de apartamentos de luxo que trará grandes impactos ambientais à região. Os moradores lembrarão também, com faixas e cartazes, que a derrubada do Bar do Chico não é um ato isolado. Faz parte de todo um projeto de ocupação do litoral por grandes empreendimentos empresariais (como o Estaleiro, em Biguaçu, ou a Votorantim, em Imbituba) e imobiliários. Para isso o governo, a justiça e os seus parceiros empresariais precisam destruir a cultura, a memória e a organização política das comunidades.

A derrubada do Bar do Chico é um golpe na organização comunitária e popular do Campeche e os moradores insistem na reconstrução. A caminhada deste domingo é um protesto e um ato organizativo. Venha celebrar esse Dia dos Pais de maneira criativa e inovadora, atuando politicamente contra a destruição da vida no litoral catarinense. Sua presença no Campeche, neste domingo, é fundamental.

Concentração na Rádio Campeche desde as 9h. Travessa Iracema das Chagas Pires (em frente ao Alguidar). Saída em caminhada às 10h. Esperamos você!!!

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Agosto, mês da Pachamama

Por Elaine Tavares - jornalista

O mês de agosto é um tempo sagrado na América andina. É o mês no qual se rendem homenagens à Pachamama, a mãe terra. Por todos os rincões deste espaço geográfico, lugar dos collas, aymaras, quéchuas e tantas outras etnias, os amautas (sacerdotes) preparam oferendas, as wajt´as, que vão desde doces e comidas típicas até fetos de llamas e ovelhas. Com as oblações vão os pedidos de saúde, dinheiro e trabalho. Apesar de mais de 500 anos de colonização e domínio da religião católica, não há quem não ofereça seu presente a Pachamama neste agosto que já começou.

Para os amautas ayamras este é considerado o período de “lakan paxi”, o mês da boca, porque é nesse período que a grande mãe abre sua boca para receber as oferendas dos seres humanos que sobre ela andam, vivem e amam. Muitas são as cerimônias celebradas por todo o território. Algumas são bem simples, feitas em casa, pelas famílias. Outras, realizadas pelos yatiris relembram os ritos ancestrais e invocam os antigos deuses do mundo andino, os achachilas, que moram nos cerros nevados do Illimani, Huayna Potosí, Mururata, Sajama e Chijcha. Nestes dias de agosto também é hora de invocar as forças que vivem nos rios e os espíritos dos animais.

Para quem crê nas formas anímicas e nos deuses antigos, nada melhor do que preparar uma boa cerimônia nestes dias de frio. O mês de agosto inteiro se presta a estas homenagens.

Em tempos de grande destruição da natureza, provocada pelo modelo de desenvolvimento do modo capitalista de produção, talvez seja hora de uma boa reflexão e de um encontro com o sagrado. Das montanhas nevadas dos Andes ecoam os cantos e sobe a fumaça dos incensos. Os deuses antigos esperam dos homens e das mulheres o respeito e a harmonia. E a Pachamama quer, ora quieta, ora em ebulição, que os seres humanos compreendam que são apenas uma espécie a mais pisando o lugar.

Neste dia primeiro de agosto, seguindo a tradição, fiz bolinhos de chuva e ofereci a mãe terra. Pedi proteção, saúde, alegria, para mim e para todos no mundo. Pedi que ela abrisse os olhos daqueles que a golpeiam para que possam ver o grande presente que é estar vivo, e pisando neste chão. Pedi piedade para os que não compreendem e pedi forças para enfrentar mais um ano, até que chegue o novo agosto.

Que viva a Pachamama, toda a honra a grande mãe!!!

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Advice...

http://www.youtube.com/watch?v=Z1NP9aHqRGU


Escritos em que a gente se vê

Tenho a mão pesada, ela me está pesando tanto... não era pra ser assim, não era! Depois de um tempo a gente vai tendo umas coragens estranhas e imbecis. Eu não posso perder o medo. Não perdendo o medo terei menos coragem. Tendo menos coragem serei mais dócil. Sendo mais dócil serei mais condescendente e paciente. Sendo paciente não verei as pessoas sem as máscaras. As máscaras são tão necessárias. As pessoas não gostam que as vejamos sem as máscaras. Elas tem todo o direito de se mascararem e disfarçar suas vidas intranquilas. Para que me sinto no direito de palavreador? Para que as faço ver que estão sem as máscaras diante de mim. Que o façam sozinhas na calada da noite. Sinto-me mal...minha mão tem cheiro podre. Todo meu corpo dói.


"Não querer nada de diferente do que é, nem no futuro, nem no passado, nem por toda a eternidade.

Não só suportar o que é necessário, mas amá-lo".

Nietzsche


Do blog http://www.admiradoresdevarais.blogspot.com/

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Segue a luta pelo Bar do Chico

Novo ato político acontece no domingo, dia 8 de agosto

Elaine Tavares

Era a metade dos anos 80, a democracia brasileira andava com pernas bambas, a vida saía da escuridão, mas as coisas ainda estavam muito confusas. A luta popular conseguia se fazer às claras, mas persistia o medo, assim como o preconceito. Para quem atuava no movimento de esquerda em Florianópolis havia um lugar onde era possível se encontrar e sentir-se em casa. Era um pequeno barraco de madeira na praia do Campeche, que havia deixado de ser uma cabana de pesca para virar um bar. Ali, nas tardes de domingo, o povo se reunia para conversar, discutir política ou apenas tomar sol. Nas noites de inverno, ao redor da fogueira, o povo também se juntava para dançar e celebrar a vida.
Para quem era da comunidade, o lugar igualmente passou a ser uma espécie de porto seguro. Não havia nada na praia e a cabana de madeira passou a ser uma referência. Como o seu Chico, que cuidava do lugar, era pessoa conhecida no Campeche, de família tradicional, o bar foi virando espaço comunitário também. Ali eram celebrados os aniversários, as festas do bairro, por ali passava a Dona Nicota, a bandeira do divino, a folia de reis, e ali terminava a alegria do carnaval. Localizado ao lado da capela, no coração histórico do Campeche, o Bar do Chico rapidamente se entranhou no cotidiano. Não era só um bar, era lugar do povo campechiano e de boa parte dos militantes populares da cidade. Território liberado para a festa e para a política. Não foram poucas as lutas e ações populares que nasceram das conversas ali naquele trecho de areia.
No início dos anos 90 um filho do Campeche se elegeu vereador. Lázaro Daniel. Não por acaso, filho do seu Chico, o dono do bar tombado agora em 2010. E este foi um vereador que muito incomodou ao poder. Na época, a cidade fervilhava na luta pela moradia e eram constantes as ocupações de área urbana e as mobilizações populares. Lázaro estava metido nesta briga até o pescoço. Sua voz na Câmara de Vereadores estava a serviço do povo em luta e ninguém conseguiu dobrá-lo. Foi aí que começou a perseguição ao Bar do Chico. Aquele era um lugar que subvertia a ordem, que acolhia os “malditos”, que servia de espaço para a organização comunitária. E, não bastasse isso, era do pai do Lázaro. O poder encontrava um ponto por onde atacar o vereador.
Desde aí, a batalha foi grande. Longos anos de discussão na justiça e neste meio tempo, a comunidade foi consolidando o espaço como o seu lugar. O Bar do Chico virou patrimônio cultural, assim como o espectro de Saint Exupéry ou a capela São Sebastião. Já não era só um bar, era parte da alma campechiana. Tanto que a comunidade entrou com um processo de tombamento para o bar. Daí soar muito estranho o argumento do juiz Hélio do Valle Pereira ao dizer que o povo do Campeche não tinha se importado com o processo. Ora, pedir o tombamento como patrimônio histórico imaterial não é se importar?
Nos últimos anos o Campeche tem sido a ponta de lança na luta por um Plano Diretor que não seja predador, que respeite o ambiente, que se faça em harmonia com os recursos naturais. E o Campeche foi além, organizou seu povo e construiu seu próprio plano, o qual apresentou ao poder público. Os governantes se fizeram surdos, inventaram outros planos e o Campeche lutou. Agora, na era Dário, aconteceu o Plano Diretor Participativo e o Campeche de novo se organizou, melhorou seu plano e tem lutado para fazer valer sua palavra. É um bairro que tem tradição de luta, que mantém movimentos articulados e atuantes, que incomoda demais o poder. Por isso era preciso quebrar a espinha desta gente. Nada melhor então do que atacar um velho de mais de 80 anos, que teve a ousadia de colocar no mundo alguém como Lázaro e ainda criar um espaço onde o povo pode se organizar e conspirar.
É por isso que as pessoas que vivem no Campeche e que militam nos movimentos da cidade estão irmanadas na luta pela reconstrução do Bar do Chico. A pequena cabana de madeira foi derrubada numa manhã fria de julho, sem aviso, sem nada. Vieram os homens da Comcap, arrombaram a porta, tiraram as coisas de dentro e destruíram o lugar. Estraçalharam parte da cultura do bairro, pisaram na memória, destroçaram o patrimônio das gentes.
Mas esse crime cultural não ficará sem resposta. Uma delas já foi dada. Num ato público realizado sábado, dia 24 de julho, o velho bar ressurgiu numa obra de arte produzida pelo artesão Paulo Renato Venuto. Um gesto poético, simbólico, que serviu para impulsionar outras ações e idéias. A comunidade quer de volta o mesmo bar, concreto, real. Por isso, no último dia 31 o grupo de mobilização pela reconstrução do Bar do Chico esteve reunido, planejando ações para que o velho espaço comunitário possa ressurgir dos escombros.
Duas frentes de luta foram abertas. Uma delas será na justiça. Como estava em andamento o processo pelo tombamento do lugar, a Associação dos Moradores do Campeche vai dar seguimento ao pleito, exigindo, portanto, a reconstrução. A outra é política e de ação direta do povo. Uma nova manifestação está sendo organizada para o domingo, dia 8 de agosto, às 10h, com partida dos escombros do Bar do Chico. A comunidade mobilizada fará uma caminhada, pela praia, até um empreendimento imobiliário (Essence Life Residence) que está sendo erguido nas dunas do Campeche. Vão protestar contra essa invasão e exigir da justiça o mesmo tratamento que deu ao casebre de madeira que era o Bar do Chico.
O povo do Campeche discutiu e decidiu que se a cidade de Florianópolis é conhecida pela alcunha do “já teve”, por conta de já ter deixado sumir coisas importantes e históricas, como o Miramar, o Expresso, o Grupo Sul, o mesmo não vai se dar ali no bairro. As gentes não aceitam conviver com a idéia de que o bar do Chico não existirá mais. E vão reconstruir. Se quem mandou derrubar o bar achou que iria quebrar a espinha do Campeche, se enganou. Aqui vive uma gente-peixe, mágica, feita de areia, mar e sol. Uma espinha se quebra, outra vem, mais forte, mais viva...

Vozes contra o Estaleiro

Veja em

http://sambaquinarede2.blogspot.com/2010/08/blog-post_02.html