domingo, 30 de agosto de 2009

Milton na alma


Míriam Santini de Abreu

O mundo é outro para mim desde que conheci Milton Santos. O jornalismo é outro para mim. E no final da tarde de domingo, sentada em um dos bancos no parque de Coqueiros, pensei nele, que definiu o espaço como um conjunto indissociável e contraditório de sistema de objetos e sistema de ações.
Ali, na beira do mar, a natureza, o recorte alongado da Baía Sul, os morros ainda cobertos de vegetação, um vento salgado. Objetos naturais. Mas também, ali, as pontes ilha-continente, gigantesca prótese para um incessante ir e vir de automóveis; a faixa dourada da iluminação das casas e das ruas; um avião, ponto iluminado sob a lua crescente. Objetos artificiais. Na construção das pontes, uma intenção; nos veículos-objetos que as atravessam, outras múltiplas intenções. Objetos e ações, dois sistemas que se alimentam mutuamente.
Mas entregue à chegada da noite, ali no parque, lugar para desfrute da classe média de Coqueiros – parques são coisa rara em Florianópolis – a gente também pensa no primeiro homem que ficou à beira daquela baía, observando a maré, num lugar onde havia somente objetos naturais. Somente a natureza. O Primeiro Homem. Que terá ele pensado?
Nesse tempo de velocidade, de pressa, é em Milton que também abasteço o inconformismo:


"Estamos convencidos de que a mudança histórica em perspectiva provirá de um movimento de baixo para cima, tendo como atores principais os países subdesenvolvidos e não os países ricos; os deserdados e os pobres e não os opulentos e outras classes obesas; o indivíduo liberado partícipe das novas massas e não o homem acorrentado; o pensamento livre e não o discurso único. Os pobres não se entregam e descobrem a cada dia formas inéditas de trabalho e de luta; a semente do entendimento já está plantada e o passo seguinte é o seu florescimento em atitudes de inconformidade e, talvez, rebeldia."

Milton Santos em "Por Uma Outra Globalização - Do Pensamento Único à Consciência Universal"


Ter Milton assim, ancorado na mente e no espírito, faz a gente se sentir uma mulher em um banco, que vê ao mesmo tempo o mundo e a si mesma.

Para saber mais sobre o espaço como um conjunto indissociável e contraditório de sistema de objetos e sistema de ações:

http://books.google.com.br/books?id=JRvh0ebaIXoC&pg=PT38&lpg=PT38&dq=sistema+de+objetos+e+sistema+de+a%C3%A7%C3%B5es+a+natureza+do+espa%C3%B5&source=bl&ots=WN8f0TgM1j&sig=z0WSc2LAomK_NpITpDqrV0NC6j4&hl=pt-BR&ei=jPqaSsevL5S3lAf4hJi3BQ&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=1#v=onepage&q=&f=false

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