quarta-feira, 22 de abril de 2009

Um pouco sobre tudo e tudo sobre o mesmo

Li Travassos
um café um cigarro um trago tudo isso não é vício
são companheiros da solidão mas isso só foi no início
hoje em dia somos todos escravos e quem é que vai pagar por isso?
Lobão e Bernardo Vilhena
Começa que, semana passada, uma amiga sofreu um aborto espontâneo, coisa que me coloca em depressão automática, e quando vi, no caminho pra casa tinha comprado um cachecol (preto,claro!) e um livro. Absolutamente dispensáveis os dois: estava lendo dois outros livros – um tanto mais indigestos, é verdade – e, em breve, deverei poder fazer uma cortininha de cachecóis pretos, na boa. Mas enfim, ambos de boa qualidade, o livro eu já estou no meio, o cachecol o tempo já está facilitando usar, mas a questão é o quanto estas duas compras, boas, mas totalmente desnecessárias, vieram preencher um espaço interno com o qual não têm nadíssima de nada a ver e, ainda por cima, em tempos de pouco dinheiro. Fiquei pensando nestas substituições neuróticas que a gente faz. E em quanto paga por elas. Afinal, continuo carregando quase todos os quilos que ganhei há uns 6 anos atrás, quando parei de fumar, vício que durou uns 27 anos, durante os quais eu consumi de um a dois pacotes de cigarros por semana (cada pacote, para quem não sabe, tem 200 cigarros)...
E fiquei, também, questionando minha fúria contumaz contra pessoas que compram, compram, compram, incentivando o tal do "capitalismo selvagem", em detrimento da produção daquilo que nos é realmente necessário, e que poderia ser para todos... Eu, que tenho um vestido indiano de 30 anos de idade (verdade que eu fiz, mais jovem, a estupidez de tirar as mangas, sem saber da importância das ditas cujas para uma mulher de meia idade, mas eu dou um bom jeito nisso...). Eu, que mando reformar minhas roupas ad nauseam (náusea esta da costureira, claro). Eu, que mantenho o mesmo celular até ficar impraticável, e assim por diante. E assim mesmo não posso dizer que não seja uma pessoa consumista, mas enfim, fiquei pensando o quanto algumas pessoas com muito dinheiro estão apenas tentando preencher o mesmo vazio que alguém que usa drogas, fuma, bebe, come demais... o que, é claro, eu já sabia, mas acabei "sentindo" melhor com esta situação, e não é que eu deixe de achar estas pessoas horríveis, mas me veio na mente a música de Cazuza: "Vamos pedir piedade, Senhor, piedade, pra esta gente...
"Hoje, a rede Globo nos brindou com duas histórias verídicas: a primeira, sobre a África de hoje, em parte miserável, em parte com desenvolvimento a pleno vapor, enfim, com cada vez mais desigualdade social. A África, agora, está sendo invadida pelos chineses que, segundo a reportagem da Globo, lá estão "montando um império": fábricas, estradas, etc. Além disso, para lá estão mandando pessoas para trabalhar, o que impede a diminuição do desemprego entre os africanos. Melhor que isso: para lá o governo chinês está mandando seus criminosos, que além de cumprirem pena trabalhando, o farão bem longe e ainda mais barato.
A segunda história é que há, no Brasil, lojas de produtos para cachorros promovendo um tipo de festa chamado "pet balada", onde, pela módica quantia de 600 reais (ou seria 666?) você promove uma festa para seu cachorro, regada a comidinhas e bebidinhas (exclusivamente para cachorros), à qual os cachorrinhos de seus amigos irão, todos cobertos de jóias, roupas de grife e perfumes. Troque seu cachorro por um africano pobre...
Para completar, como está virando hábito no Banco como qual trabalho, em vésperas ou pós feriados, hoje deu pau no sistema, e eu tive que pagar algumas contas com um cheque, no caixa, ainda assim tudo muito lento, tudo muito difícil, e eis que o caixa do lado começa a tentar puxar, de brincadeira, uma "Salve Rainha" ("gemendo e chorando neste vale de lágrimas"), oração que eu, com a minha memória de declamadora, sei de cor, então eu a desfio inteira, e completo dizendo: e olha que eu não sou mais católica, hein... ? Ao que a caixa que está me atendendo, surpresa, pergunta: "E dá pra deixar de ser católica?" Dá, sim senhora. Dá pra deixar de ser católica, deixar de ser grávida, deixar de ser fumante, deixar de ser jovem, dá para deixar de ser tudo. Tem gente que deixa (?) até de ser afro-descendente. Tem uns que deixam de ser seres racionais, outros preferem deixar de sentir, daí vamos nos entupindo de muito de tudo, e não vamos percebendo que o buraco é mais lá dentro.
Não faltasse mais nada, neste final de semana descobri, tarde demais (coisa de pobre) que o lá-no-alto-deste-texto-citado Lobão estaria hoje, segunda feira 20 de abril, cantando de graça aqui em Floripa. Por que descobri tarde demais? Porque primeiro foram avisados (e receberam convite) os já freqüentadores do local, que não deve de ser barato, além de não ser nada perto, enfim, ficava mais fácil se fosse a preços populares no Centro da cidade do que assim, mas vip é vip. E eu não queria ir mesmo, que o Lobão está verde e eu nem tinha uma roupa preta nova pra pôr...

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