Por elaine tavares - Fotos Rubens Lopes
A noite de sexta-feira foi intensa na Casa da Outra, que é a
sede do portal Desacato, um espaço de notícias que, no mais das vezes, não saem
nos meios de comunicação comercial. Por isso, "a outra". Uma outra
informação, que faz do jornalismo aquilo que Adelmo Genro Filho ensinou: forma
de conhecimento.
O dia fora intenso, com as manifestações contra o golpe e
toda a montanha russa informativa vinda de Brasília e de São Paulo. Mas, ainda
assim, um pequeno grupo de jornalistas - e gente que trabalha com comunicação -
se reuniu para discutir jornalismo. Isso, por isso só, já seria muito, visto
que esse fazer está um pouco desacreditado. Hoje, jornalismo é sinônimo de propaganda.
Não há análise, não há contextualização, não há impressão de repórter. Tudo que
há é mentira e enganação. Não que eu defenda que o jornalismo deva ser
imparcial. Isso é bobagem. Toda forma de narrar é parcial. Mas, o que se espera
do jornalismo é que ele possa mostrar todos os lados possíveis de um fato, além
de apresentar o contexto histórico no qual o fato está imerso.
Mas, o encontro no Desacato não foi para chorar pitangas,
nem para criticar essa gosma que se nos oferecem alguns colegas de profissão. O
papo era outro. Como seguir fazendo jornalismo de verdade nessa selva
informativa de redes sociais e meios dominados pela classe dominante. Lembramos
que esse grupo, em especial, vem produzindo conhecimento com o jornalismo desde
sempre. Particularmente mais organizado desde o lançamento do projeto Pobres e
Nojentas, em 2006, que buscava através de uma revista de classe, mostrar a vida
e ação produzida nas margens do sistema. Da Pobres e Nojentas, que esse ano
completa dez anos de atuação , saíram companheiros e companheiras que foram
construir outros espaços - na mesma linha - como foi o caso do Portal Desacato,
nascido em 2008 e hoje conduzido por Rosângela Bion de Assis, Raul Fitipaldi, Tali Feld e Juan Luis Berterretche, entre outros. Logo depois, a partir do Desacato, vem o nascimento de uma Cooperativa de trabalhadores que passou também a viabilizar a vida dos que produziam a comunicação no portal.
Nesse mesmo tempo, o grupo da Pobres e do Desacato foi
articulando parcerias com companheiros e companheiras que estavam fora do eixo
da capital. E, a partir de cursos de formação em jornalismo comunitário e
popular, foram se apertando os laços com gente do oeste e do meio-oeste do
estado, juntando a Associação Paulo Freire de Educação e Cultura, a Rádio
Tangará, o Jornal O Comunitário, Agência de Notícias Contestado, jornal O
Taquaruçu, a Abraço e outros agentes dispersos em vários veículos do interior,
além de estudantes e agentes de comunicação popular. Um trabalho bonito demais,
que vem, lenta e inexoravelmente, gerando frutos suculentos.
Hoje, o Desacato, por exemplo, já pode contar com
correspondentes que escrevem a realidade dessas regiões, dando ao portal uma
qualidade que não se encontra em nenhum outro veículo. Porque narra a realidade
do estado de Santa Catarina a partir da comunidade das vítimas do sistema. A voz do povo encontrando
espaço para se expressar. E nessa vereda que está sendo aberta com extrema
qualidade assomam jornalistas como Claudia Weinman e Júlia Saggioratto, de uma
nova geração que decidiu atuar no campo do jornalismo de verdade, esse apontado
por Adelmo.
Por conta de toda essa história, o encontro de pessoas para
falar de jornalismo não podia mesmo ficar no mimimi. O debate seguiu o rumo da
análise dos tempos e na construção de propostas que permitam dar mais
visibilidade ao jornalismo que está sendo feito fora dos meios comerciais. Ali
vibrava a vontade de narrar a realidade com todas as cores que ela tem, e não
apenas aquela que interessa a classe dominante. Jornalismo comprometido com os
trabalhadores, os destituídos de direitos, os oprimidos e explorados.
O debate na Casa da Outra principia uma ação que
procuraremos manter sistematicamente. Encontros críticos, formulação teórica e
proposições práticas. Paulofreirianamente indo, como nos ensina o companheiro Jilson
Carlos de Souza. O jornalismo pulsa e vive nas narrativas dos
"velhos", como eu, e na dos "novos", como a Claudia Weinman,
que retrata o oeste de Santa Catarina como há muito tempo não se via na
imprensa. O jornalismo como forma de conhecimento, buscando formar, mais do que
informar.
E seguimos, as Pobres e Nojentas, Desacato e todos os demais
amigos da Rede Popular Catarinense de Comunicação, que vamos pavimentando pouco
a pouco, na solidariedade comunicacional, na alegria e no compromisso com
outro, caído.
O jornalismo vive e está aí!
Um comentário:
Obrigado Elaine por tua presença na nossa Casa da Outra, que também é tua. Vem mais por aí, e o faremos juntos, como desde 2006 com Pobres e 2007 com Desacato. O tempo nos fez indivisíveis. A multiplicar, a desalambrar!
Postar um comentário