Por Flavia Alli, jornalista - Matéria reproduzida: Jornal da
ASSUFRGS / Out. 2013
O PL 4330 é a nova armadilha do governo federal a serviço
das empresas.
O Projeto de Lei esconde a verdadeira face do
desmantelamento dos direitos básicos e sociais conquistados pela classe
trabalhadora no curso da História, com vistas a diminuir os custos de trabalho
para aumentar os lucros dos empresários.
O PL 4330 promete regulamentar a terceirização no país. Mas,
se mostra enquanto ideologia quando vemos, na prática, pois o modelo de
contratação permite que seja adotado em todos os setores da empresa, abrindo
caminho para que todos os trabalhadores sejam pessoas jurídicas. Na realidade,
o projeto permite uma flexibilização dos direitos trabalhistas: acabando com
13º salário, férias remuneradas, FGTS, vale-transporte e refeição, assistência
médica e aposentadoria, seja para trabalhadores do campo ou da cidade. Além
disso, a Emenda 3 prevê restrições fiscais do Ministério do Trabalho e da
Previdência para punir as empresas que mantenham vínculo empregatício como
prestadores de serviços.
O PL 4330 quebra a regra colocada pela CLT, no que diz
respeito a vinculação do empregado diretamente com a empresa, permitindo que
aumente a concorrência entre os próprios trabalhadores na venda da sua força de
trabalho. Com a alta concorrência entre a própria classe trabalhadora, diminui
os custos de produção, pois permite aos capitalistas que paguem salários
menores frente a carnificina em busca de trabalho para sobreviver.
Este fato não é agitação barata da esquerda: Segundo dados
do Dieese, os trabalhadores terceirizados ganham em média 27,1% menos que os
contratados diretamente – aumentando a desigualdade de renda.
A jornada de trabalho também sofre ataques, uma vez que
trabalham três horas a mais por semana para as empresas, em condições de
trabalho bem mais sucateadas: 8
a cada 10 trabalhadores que sofrem acidentes de trabalho
são terceirizados. Os dados são ainda mais estarrecedores quanto às vítimas de
morte por tais acidentes: a cada cinco trabalhadores mortos, quatro são
terceirizados.
TERCEIRIZADOS REALIZAM SUAS REFEIÇÕES NOS BANHEIROS
SANITÁRIOS E MATOS, NA UFRGS.
Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul o quadro não é
muito diferente. Para mostrar a degradante situação que são expostos os
trabalhadores terceirizados na Universidade, a imprensa da ASSUFRGS realizou
entrevistas com vítimas deste modelo de contratação.
A fim de evitar perseguições e retaliações por parte das
empresas e da reitoria, os trabalhadores tiveram seus nomes trocados. Mas a
situação é real e precisa ser acabada.
Para Amanda, o dia inicia no Colégio aplicação com a
ausência de sala/espaço para trocar de roupa e guardar seus pertences. Em um
banheiro em reforma, improvisado, misturam-se a materiais de construção
atirados, sem condições alguma de estrutura para realizar a troca de roupas.
Mas, o dia de trabalho não para por aí: Sem local adequado
para alimentação, Amanda é apenas mais uma entre tantos terceirizados que para
se alimentar e continuar trabalhando, precisa ir ao banheiro, mais
especificamente, no vaso sanitário, para fazer a refeição.
A história de Amanda se repete semelhante aos demais
funcionários do Campus do Vale. No setor 4 do Campus, muitos deles precisam ir
aos matos do campus para realizar suas refeições. “Se a GERT nos vê comendo no
mesmo espaço dos servidores, nos dá advertência, e depois a gente sabe: vem a
demissão”, diz Amanda.
Outra terceirizada, Débora, denuncia a questão do
vale-alimentação, que também prejudica a vida do trabalhador. “A empresa
fornece um cartão vale-alimentação. O campus tem o RU, mas não aceita este
cartão”, relata Débora frente a dificuldade de garantir os direitos
trabalhistas para manutenção de uma vida saudável.
Ponto Eletrônico, chuva e sucateamento das condições de
trabalho
Os trabalhadores terceirizados, ainda, sofrem com o
sucateamento das condições de trabalho. No Colégio Aplicação, por exemplo, o
ponto eletrônico foi retirado do local, sem explicações. Essa situação faz com
o que os trabalhadores se desloquem por uma grande distância, em uma estrada
esburacada, em meio ao mato do campus, que em dia de chuva vira um verdadeiro
lodo. Os uniformes ficam encharcados, e os trabalhadores precisam continuar nas
atividades da forma que estão, colocando em risco sua própria saúde.
Outra questão é a segurança do campus, uma vez que a
Universidade comporta três turnos, e os terceirizados à noite, principalmente
as mulheres, ficam à mercê da falta de iluminação e riscos à vida e integridade
do seu corpo.
“A gente se troca num banheiro em reforma, come num vaso
sanitário, e ainda sofremos com o deslocamento do ponto eletrônico em dias de
chuva, e os colegas com a segurança à noite. Porque temos que nos esconder? Não
somos seres humanos que nem todos? Estamos sendo tratados como lixo, na
verdade!”, relata Débora.
Em outros campi da UFRGS, recebemos relatos de falta de
estrutura, bem como a obrigação de trabalhar com roupas (uniformes) rasgados,
já que as empresas não garantem ao trabalhador terceirizado seus plenos
direitos.
Cerceamento da organização sindical
A diferenciação entre contratados e terceirizados no plano
privado corresponde ao serviço público como no caso acima, em que os
terceirizados tem direitos trabalhistas muito abaixo dos servidores, e até
mesmo dos garantidos via CLT.
O PL 4330 atua também na fragmentação das lutas da classe
trabalhadora, uma vez que diferencia os trabalhadores pelo regime, e
desvaloriza o trabalho sem respeitar a dignidade humana. Sem contratar
diretamente os trabalhadores, a terceirização fragiliza a organização sindical
dos mesmos, além de extinguir a responsabilidade quanto às obrigações
trabalhistas. Isso já acontece na UFRGS: segundo Amanda, quando os
trabalhadores reclamam ou reivindicam seus direitos à GERT, esta diz que é de
responsabilidade da empresa terceirizada; e quando questionada a empresa,
empurram à administração da Universidade o problema.
O trabalhador, já que se vê restrito na luta enquanto
indivíduo, acaba não reivindicando seus direitos, pois fica passível de
retaliação e demissão por parte da empresa contratada, uma vez que não consegue
se organizar enquanto classe trabalhadora na luta por seus direitos!
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