quarta-feira, 31 de julho de 2013

O Petróleo é nosso



Por Marcela Cornelli

Está em tempo de sindicatos, centrais sindicais e movimentos sociais tomarem às ruas com o grito de “O Petróleo é nosso” e em defesa da soberania nacional. Postos de petróleos estão sendo entregues pelo governo federal ao capital privado, na sua grande maioria multinacionais, e junto com eles está entregando a soberania do nosso país. Já está marcado o leilão da maior reserva de petróleo do Brasil para outubro. Segundo informações da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) o governo realizará a primeira rodada de licitações de direitos de exploração na camada do pré-sal em outubro e o leilão de blocos de gás em terra, a 12ª rodada de licitações, está prevista para novembro.

Na 11ª rodada de licitações realizada em 14 de maio deste ano, o governo federal entregou ao capital privado 289 blocos de exploração de petróleo. O que, na opinião de José Álvaro Cardoso, economista e supervisor técnico do Dieese de Santa Catarina, é “algo muito sério e pouco discutido pela sociedade brasileira”. José Álvaro destaca que foram ofertados 289 blocos de petróleo em áreas fora da camada do pré-sal, localizados em 11 estados brasileiros e distribuídos em 11 bacias sedimentares.

A área envolvida nos leilões, 155 mil Km², corresponde a 60% da área do Estado de São Paulo. Somadas, as 11 bacias podem chegar a um volume de petróleo superior a R$ 40 bilhões de barris. “As áreas mencionadas tiveram ao longo das últimas décadas o investimento, por parte da Petrobrás, de centenas de milhões em pesquisa e que ficarão na mão, em sua maioria, de empresas estrangeiras. É fácil de entender porque a pressão internacional para a realização dos leilões era imensa. Cálculos de especialistas dão conta que, caso os 40 bilhões de barris sejam confirmados e considerando um fator de recuperação médio de 25% sobre os 40 bilhões, as empresas de petróleo (em sua maioria multinacionais) se apropriarão, nos 30 anos de vigência do contrato, de cerca de 10 bilhões de barris, um lucro de cerca de R$ 1,16 trilhões, R$ 40 bilhões de lucro ao ano, caso o óleo seja extraído no período de 30 anos”.

Em entrevista para a revista Previsão, o economista ressaltou que “em decorrência da  dependência que a economia mundial tem do petróleo e do fato de não ser uma energia renovável, ele é objeto de uma verdadeira guerra internacional”. Para José Álvaro, os argumentos usados pela ANP para justificar o leilão, não convencem, como por exemplo, o de permitir o conhecimento das bacias sedimentares. “Ora, não há empresa no mundo que conheça melhor essas bacias do que a Petrobrás, cujos profissionais pesquisam o assunto há décadas. Essas reservas deveriam ser tratadas como fator de segurança nacional no Brasil, como ocorre em outros países”.

Quem ganha e quem perde

Na opinião do economista do Dieese/SC, quem ganha com os leilões são as multinacionais do petróleo. “Elas fazem um verdadeiro negócio da China”. E quem perde “são os interesses nacionais, na medida em que o país oferece para empresas estrangeiras reservas fundamentais, que se formaram em milhões de anos, e que são motivo de permanente cobiça dos interesses estrangeiros, desde sempre. Não falta quem, na grande mídia, defenda os leilões, fenômeno que é fácil de entender na medida em que as multinacionais do petróleo dispõem de muitos recursos para “convencer” a opinião pública, de todas as maneiras possíveis. Ao mesmo tempo, a vozes contrárias não têm visibilidade na mídia, são abafadas e não chegam ao grande público. Isso nos remete para o debate da democratização da mídia no Brasil”, afirma José Álvaro.

“Um dos argumentos utilizados pela ANP é que os leilões vão reduzir as desigualdades sociais no Brasil. Este argumento não tem sustentação na história mundial. Onde as multinacionais tiveram acesso nas reservas petrolíferas não houve melhoria no perfil de distribuição de renda”, pondera. O economista cita os exemplos do México, Angola, Nigéria, países produtores de petróleo, com grande penetração das multinacionais e que mantém imensas disparidades sociais e pobreza. “Além disso, os leilões vieram num momento em que se aprofunda o processo de desnacionalização da economia brasileira, com o recorde, nos últimos anos, de empresas nacionais vendidas ao capital estrangeiro”. 

José Álvaro diz que “o fato de ser o Governo Dilma, com todas as suas contradições, ajuda”. “Vale lembrar que, no governo FHC a Petrobrás, fruto da luta de décadas das forças populares brasileiras foi alvo de um processo de ‘desconstrução’, inclusive com a venda pelo governo, de ações preferenciais da empresa no exterior, que geram dividendos para capitalistas estrangeiros. A empresa, como um todo não foi privatizada porque não deu tempo. Claro que os recursos do pré-sal, a maior descoberta de petróleo no mundo nas últimas décadas, estão na mira das grandes multinacionais do ramo. A destinação dos lucros do pré-sal é algo que está em disputa. As grandes empresas do setor têm recursos de sobra para manipular governos, mídia e opinião pública em geral. Não é um acaso que, entre as 10 maiores empresas do mundo, oito sejam produtoras de petróleo”. 

Soberania nacional ameaçada Agnelson Camilo da Silva secretário do Sindipetro PA/AM/MA/AP e da Diretoria Executiva da Federação Nacional dos Petroleiros também falou à revista Previsão. Para ele, a venda dos postos de Petróleo “representa abrir mão de grande parte da soberania nacional privatizando nossos recursos naturais e abrindo mão de um montante que daria para ser aplicado na gratuidade do transporte, saúde, saneamento, educação e moradia”. Agnelson também observa que a população mais empobrecida só poderá ser beneficiada pelos recursos do pré-sal se houver união e luta dos trabalhadores para que o petróleo não seja entregue pelo governo aos países ricos para que estes se salvem da grande crise internacional criada por eles mesmos. 

“Para se ter uma ideia, só o campo de Libra na costa do Espírito Santo tem uma reserva garantida de no mínimo 14 bilhões de barris de petróleo, que, vendido hoje no mercado internacional ao preço de 100 dólares o barril, teríamos uma arrecadação R$ 1,4 trilhões de dólares”. O sindicalista também coloca que sem a união das centrais sindicais em defesa do petróleo não haverá avanços. “Infelizmente a CUT e a Força Sindical concordam com a política do governo. Somente os sindicatos ligados à FNP, CSP-Conlutas e movimentos sociais defendem a bandeira contra as privatizações do petróleo”, enfatiza. 

Mais investimentos em educação? Será?

Foi aprovado no dia 25 de junho na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei (PL) nº 323/2007, que destina à educação e saúde parte dos recursos provenientes da renda do petróleo. Um membro da base do governo chegou a afirmar que a aprovação deste projeto permitiria o aumento dos atuais 5% do PIB para 10% do PIB investidos anualmente na educação. Grande engodo! Segundo o site da Auditoria Cidadã da Dívida, verifica-se que somente em 2019 haverá o aporte de recursos em valor maior que 0,4% do PIB para a educação, ou seja, nos próximos sete anos, a educação receberá valores irrisórios. Em 2022, pelo PL, seria investido 1,23% do PIB na educação, valor este insuficiente para  aumentar de 5% para 10% do PIB. Não nos deixemos enganar!

Onda de privatização atinge também portos e aeroportos Na mesma semana que ocorreu o leilão dos postos de petróleo, o Congresso aprovou a MP 595, chamada MP dos Portos, que, na prática, entrega os portos ao gerenciamento do capital privado. Os Diretores do Sindprevs/SC e do Devisa/Fenasps, Giulio Césare da Silva Tártaro e Teresinha Maria da Silva, servidores da Anvisa em Santa Catarina, também falaram à revista Previsão sobre o tema. Para eles, “essa medida fortalece apenas o lado do capital privado, sendo que os servidores sempre são colocados em segundo plano, culpando sempre os trabalhadores pela ineficiência e demora nas atividades, ignoram a falta de pessoal para fazer frente à expansão comercial do setor. O governo opta por entregar a gestão para o setor privado que, por sua vez, tende a substituir os servidores públicos pelos privados, reduzindo ainda mais os salários dos trabalhadores. 

Para o país, a medida também é prejudicial, pois o capital privado não tem comprometimento algum com a população e em fiscalizar produtos como alimentos, medicamentos, produtos para saúde em geral entre outros de interesse público. Essa é uma prática comum por parte dos governos brasileiros, que sucateiam o setor para justificar a entrega para a iniciativa privada, omitindo o seu papel de controle e de soberania”. 

“Sempre defendemos o funcionamento dos postos da Anvisa com atendimento 24 horas, pois entendemos que não pode existir qualquer fiscalização em vigilância sanitária somente em horário comercial, no entanto, para isso tornar-se realidade é necessário antes adequar a força de trabalho e assegurar a infraestrutura ideal, segurança, condições de trabalho dignas para atender essa demanda”, avaliam os dirigentes. Para eles, na prática, foi imposto o regime de plantão 24 horas aos servidores, sem prévia negociação e prazo para adequação. Através da Lei nº 12.815 de 5 junho de 2013 ( Leis dos Portos), o governo Dilma e a direção da Anvisa determinaram aos trabalhadores o regime de trabalho 12 x 36 horas, diferente dos demais órgãos aduaneiros que é de 24 x72 horas. “O governo Lula/Dilma e os partidos aliados estão seguindo os mesmos passos da política neoliberal do governo Fernando Henrique Cardoso. O governo do PT está seguindo os passos da política neoliberal e pior ainda, está aprimorando os ataques aos trabalhadores, que sequer podem exercer direito de mobilização, sendo que decretos presidenciais impedem na prática o exercício de greve legítimo e tentam substituir trabalhadores qualificados por outros sem capacitação alguma, como ocorreu em 2012, com a edição do Decreto 7.777”, recordam Giulio e Teresinha. 

Para os sindicalistas, a única reação e resistência a esse modelo privatista do Estado surge de entidades sindicais autênticas e comprometidas com suas bases, como o Sindprevs/SC e a Fenasps. “Os movimentos sociais também têm um papel importante em mostrar através de manifestações populares a insatisfação da população a esse tipo de modelo. Cabe a esses movimentos e entidades sindicais informar a população sobre os prejuízos para o povo com a privatização dos setores estratégicos relacionados à saúde. É importante alertar para os riscos de entrada de doenças e produtos contaminados em nosso país”, finalizam.

A onda de privatizações do governo federal não deve parar por aí. O governo conta com os leilões de concessão de rodovias, ferrovias e portos ao setor privado para impulsionar os investimentos em 2014. Cabe aos movimentos sindicais e sociais se organizarem e defenderam a soberania nacional contra os interesses do capital.

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