sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Editoras de P&N publicam resenha

Elaine Tavares e Míriam Santini de Abreu, editoras de P&N, tiveram resenha publicada na Revista Acadêmica Semestral do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo e Mídia da UFSC, “Estudos em Jornalismo e Mídia”, Volume III, Número 2, referente ao segundo semestre de 2006. A resenha de Míriam é intitulada “Do lugar para o mundo: o caminho do jornalismo ambiental”. A de Elaine é “Jornalismo dissecado: para uma outra práxis”.

Leia a resenha de Míriam Santini de Abreu:

Jornalistas interessados em discutir a chamada questão ambiental encontram interlocutores na Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental. Para buscar notícias, reportagens e artigos com o mesmo foco, nutrem-se em páginas como a da Envolverde. Nos últimos dez anos, também encontram disponíveis publicações específicas – ainda que poucas - sobre a relação entre jornalismo e meio ambiente. Uma delas é Formação & informação ambiental: jornalismo para iniciados e leigos, da coleção Formação & Informação da Summus Editorial. A abordagem dos seis artigos do livro, organizado por Sergio Vilas Boas, revela os avanços que o jornalismo sobre meio ambiente experimenta, mas também deixa insinuadas as fraquezas.
A edição especial Nossas Cidades, publicada pela revista Realidade em 1972, é citada por Roberto Villar Belmonte, no artigo Cidades em mutação, para criticar a forma como a cobertura é feita hoje, com espaço restrito para investigações e análises. O autor também lista experiências que tiveram êxito em discutir e propor medidas baseadas no direito à cidade para todos. A idéia parece óbvia, nas não é. Morar em uma cidade é diferente de viver nela. Na população urbana brasileira, uma minoria tem acesso a tecnologias que permitem o aproveitamento pleno do tempo e do espaço.
Belmonte cita pesquisas que indicam a opinião dos brasileiros sobre o meio ambiente e observa que foi um avanço a percepção do papel do poder local na preservação: “Um desafio para os jornalistas a partir de agora é mostrar a responsabilidade de cada um, e não transferir o problema apenas para as ‘autoridades (in)competentes´” (p.28). O desafio, porém, é ainda maior: como medir a responsabilidade de cada um? E como refletir sobre isso sem tocar num tema maior, a transição da democracia representativa para a participativa?
Em Verde como dinheiro, Regina Scharf escreve sobre a incapacidade de parte da mídia de mostrar como a questão ambiental se relaciona com o político, o econômico e o social. Um enfoque interessante do artigo se refere à dificuldade de acesso a informações sobre o quadro ambiental brasileiro e ao conteúdo pouco crítico do noticiário sobre marketing ecológico. Tanto na televisão quanto nos meios impressos, é cada vez mais comum encontrar publicidade – algumas disfarçadas de jornalismo – de corporações que alardeiam “responsabilidade social” com o meio ambiente. Assim é que muitos mitos e miragens, como nomeia Scharf, são vendidos aos jornalistas como verdades.
Jornalista e biólogo, Eduardo Geraque leva o leitor a um passeio descritivo a sistemas ecológicos como os manguezais e a mata atlântica. Com a experiência de repórter, narra vivências e relatos de caranguejeiros de Vitória (ES) e moradores na Reserva de Mamirauá (AM), mostrando que o discurso jornalístico sobre meio ambiente precisa fazer a relação entre o singular, o particular e o universal, como ensina Adelmo Genro Filho. É nessa relação que reflexões e práticas do estar-no-lugar, estar-no-mundo vão adquirir sentidos mais plenos e capazes de instigar novas (outras) interpretações. Geraque é o único articulista a citar um aspecto pouco explorado nas discussões sobre o jornalismo ambiental: o texto. Para ele, é preciso “oxigenar” as formas de expressão das grandes reportagens que marcaram o chamado Novo Jornalismo, pensando-as no contexto do jornalismo brasileiro no século 21.
Água de uma fonte só, artigo de André Azevedo da Fonseca, discute o tema a partir de uma imersão histórica recheada de citações de documentos e de estatísticas. Traz exemplos do Brasil e de outros países da América Latina para mostrar como a água virou negócio na mão de corporações como a Nestlé. No caminho aberto por Geraque, Fonseca também critica a generalidade dos discursos jornalísticos, que “[...] carecem da concretude necessária para estabelecer um vínculo carnal entre o cotidiano das pessoas e a urgência da problemática da água”. (p.146)
Carlos Tautz constrói o artigo Oxigênio para a energia a partir do conceito de jornalismo para o desenvolvimento. O autor critica o jornalismo hegemonizado pelas grandes empresas de comunicação e, na outra ponta, os reflexos disso na cobertura jornalística da desregulamentação do setor energético nos anos 1990. O pensar crítico de Tautz se volta para a parcela da população – a maioria – historicamente deixada de lado nos projetos oportunistas de aproveitamento energético. O autor também discute os avanços e retrocessos na disseminação de informações e de experiências, cuja troca “[...] é um fator vital na constituição de um discurso comunicacional que expresse o desejo latente de outro país”. (p.175)
Engenheiro agrônomo, pesquisador e educador ambiental, Odo Primavesi é autor do artigo Dilemas da agricultura, que discute problemas e potencialidades baseadas no tripé água-solo-vegetação. A crítica incisiva que ele faz às políticas agrícolas – que geram divisas, tidas como necessárias para atender às importações – infelizmente pouco aparece na grande mídia: “Mas a quem atendem essas importações? Qual é o custo-benefício dessa troca? [...] Assim, vai-se deteriorando a estrutura energética de produção de alimentos da cesta básica e, sem alarde, aumentando nossa dependência de outros que os produzem”. (p.189)
Os artigos do livro insinuam alguns desafios e um caminho para o jornalismo ambiental. O fato é que a informação mais qualificada e os melhores textos estão em jornais e revistas temáticas, em páginas na Internet ou programas em emissoras de sinal fechado, inacessíveis à parcela da população que mais precisa delas. Sabe-se que 54,35% da população brasileira nunca utilizou um computador e 66,68% nunca usou a internet, conforme pesquisa do Comitê Gestor da Internet no Brasil divulgada em 2007. O melhor do jornalismo ambiental, portanto, está disponível para um público formador de opinião, exigente no discurso, que paga por informação de qualidade, mas não precisa dela para mudar condições ambientais adversas. Além disso, notícia publicada na Folha de S.Paulo em 27 de maio de 2007 revela que 93% das pessoas ouvidas em uma pesquisa nos Estados Unidos acham que as empresas são responsáveis por preservar o ambiente; os estadunidenses cobram medidas, mas não estão dispostos a abrir mão de hábitos e conforto.
Daí se tira uma conclusão possível, mas provisória: o caminho do jornalismo ambiental é fazer a ponte entre o lugar e o mundo, mas não um lugar qualquer: a crítica que os autores tecem, o discurso que eles propõem, precisa chegar àquela parcela da população que pouco tem para abrir mão e para a qual, hoje, é oferecida a sobra mais descarnada do jornalismo.

VILAS BOAS, Sergio (org.). Formação & informação ambiental: jornalismo para iniciados e leigos. São Paulo: Summus, 2004.

Um comentário:

Anônimo disse...

Míriam e Elaine, numa terra tão devastada pela falta de poesia e amor, vocês duas são jasmins rentes às águas ribeirinhas da delicadeza.

Parabéns às duas pela resenha publicada.

Abraço

Karl