A Celebração do Dia Nacional do Saci-Pererê será no
dia 31 de outubro, quinta-feira, das 15 às 17 horas, na Esquina Democrática, em
frente à igreja São Francisco, na Capital. A promoção é da Revista Pobres & Nojentas, com
apoio do Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal do Estado de
Santa Catarina (Sintrajusc) e do Sindicato dos Trabalhadores da Universidade
Federal de Santa Catarina (Sintufsc). No dia também será lançado o novo livro
da jornalista Elaine Tavares, da equipe da Pobres & Nojentas,
intitulado "Olímpia Gayo visita o diabo". O trabalho conta a história
da freira franciscana Olímpia Gayo, que iniciou um fecundo trabalho de
organização das mulheres prostituídas em Lages. No dia haverá música, contação de
histórias, brincadeiras e distribuição de “sacizinhos”.
A lenda é assim! Basta que exista um bambuzal e, de
repente, de dentro dos caniços, nascem os sacis. É como eles vêm ao mundo,
dispostos a fazer estripulias. Conta a história que esses seres já existiam bem
antes do tempo que os portugueses invadiram nossas terras. Ele nasceu índio,
moleque das matas, guardião da floresta, a voejar pelos espaços infinitos do
mundo Tupi-Guarani. Depois, vieram os brancos, a ocupação, e a memória do ser
encantado foi se apagando na medida em que os próprios povos originários foram
sendo dizimados.
Quando milhares de negros, caçados na África e
trazidos à força como escravos, chegaram no já colonizado Brasil, houve uma
redescoberta. Da memória dos índios, os negros escravos recuperaram o moleque
libertário, conhecedor dos caminhos, brincalhão e irreverente. Aquele mito
originário era como um sopro de alegria na vida sofrida de quem se arrastava
com o peso das correntes da escravidão.
Então, o moleque índio ficou preto, perdeu uma
perna e ganhou um barrete vermelho, símbolo máximo da liberdade. Ele era tudo o
que o escravo queria ser: livre! Desde então, essa figura adorável faz parte do
imaginário das gentes nascidas no Brasil.
O Saci-Pererê é a própria rebeldia, a alegria, a
liberdade. Com o processo de colonização cultural via Estados Unidos – uma nova
escravidão - foi entrando devagar, na vida das crianças brasileiras, um outro
mito, alienígena, forasteiro. O mito do Haloween, a hora da bruxa e da abóbora,
lanterna de Jack, o homem que fez acordo com o diabo.
A história é bonita, mas não é nossa. Tem raízes
irlandesas e virou dia de frenéticas compras nos EUA e também no Brasil. Na
verdade, a lógica é essa. Ficar cada vez mais escravo do consumo e da cultura
alheia. Jeito antigo de colonizar as mentes e dominar. É por isso que a Pobres
& Nojentas quer recuperar o Saci, o brasileiro moleque das matas,
guardião da liberdade, amante da natureza que hoje está ameaçada de destruição.
Queremos vida digna, um país soberano na política,
na economia, na arte e na cultura. Cada região deste Brasil tem seus próprios
mitos. Caipora, Boitatá, Curupira, Bruxa, Negrinho do Pastoreio... São os
amigos do Saci que estão presentes na atividade do Dia do Saci Pererê, saudando
e buscando a liberdade.
SOBRE O LIVRO DA JORNALISTA ELAINE TAVARES
Prefácio escrito pela teóloga Ivone Gebara.
"Elaine Tavares tem o dom e a arte de contar
histórias de mulheres apaixonadas pela vida. Mulheres que são parte da história
oculta da bondade e da beleza e que atuaram intensamente para que esses valores
continuassem a se manifestar nas vidas sofridas e silenciadas.
"Olímpia Gayo visita o diabo" é mais uma
preciosa narrativa que revela o percurso de uma mulher que cresceu vencendo o
sofrimento que a vida punha em seu caminho. Desde criança vencia o sofrimento
preparando-se e lutando pela dignidade da vida de outras sofredoras e
sofredores.
O texto move o coração e convida a abrir os olhos
para as vidas ocultas, aparentemente sem valor, para a escória humana que somos
e criamos assim como para a salvação e libertação que também podem nascer de
nós. Sim, somos salvadoras umas das outras, somos a mão estendida, o abraço
apertado, o sentido da solidariedade, a misericórdia vivida. Somos a voz que
denúncia, que grita até que os corações de pedra comecem a palpitar de novo e
ver e ouvir o mundo ao seu redor.
Conheci Olímpia num encontro de estudos em Julho de
2013 em Lages. Sua
congregação religiosa me convidara para uma semana de reflexão sobre
espiritualidade ecofeminista. Desde as primeiras palavras que ouvi de Olímpia,
a cumplicidade nas ideias, nas visões e, sobretudo, sua forma de "sentir a
dor do mundo" ecoaram em
mim. Cada uma do nós, de seu jeito, vivia a paixão pela vida
manifestada através de muitas formas e expressa através de muitos nomes.
Tínhamos muitas coisas em
comum. Enfrentamos demônios parecidos, aqueles que atingem os
corpos de mulheres e querem silenciar seus gritos de liberdade.
Nas visitas e encontros de Olímpia com os
"diabos" da fome, da droga, da prostituição, seu nome, que faz
lembrar o Olimpo, moradia dos deuses gregos, espantava os algozes e trazia algo
apaziguador, algo ao mesmo tempo celeste e terrestre. Os diabos fugiam e se descobria sua face
oculta, sua beleza, sua momentânea integridade.
No encontro de coração a coração os diabos não ficam. Abrem o espaço
para o amor e a justiça. Por isso tantas pessoas marginalizadas encontraram na
presença de Olímpia a força para viver, levantar-se e seguir o caminho do
resgate da vida.
Ao final da leitura do livro um sentimento de
profunda gratidão e beleza tomou conta de mim. Gratidão à Elaine, à querida
Olímpia e a tantas pessoas que no anonimato sustentam a vida e anunciam a
grandeza do amor, único capaz de curar os corações partidos e renovar a face da
terra".
Ivone Gebara
Teóloga
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