Míriam Santini de Abreu
Eu era auxiliar de escritório em uma rede de supermercados de Caxias do Sul em meados de 1990. Entrava na segunda fase de Jornalismo e decidi bater na porta do extinto jornal Folha de Hoje para pedir emprego. Consegui um estágio e lá fiquei durante dois anos. Como tantos outros que passaram pelo jornal, a minha relação com a Folha era um caso de amor.
Havia a Tríade dos Editores – Cancian, Ibanor e Braga. E trabalhava lá o Darci Demetrio, que sabíamos – os repórteres - ter ganho um Prêmio Esso Regional Sul de Jornalismo. Toda semana o Demetrio selecionava uma reportagem para colocar no mural da Redação e comentar. Lembro-me ainda hoje do dia em que a primeira que fiz foi “para o trono”, como dizíamos. Recortei o comentário, que fora datilografado em máquina de escrever, e o guardei.
A rotina na Folha dava a sensação de banho em dia frio. Suavemente cálida. Eu amanhecia plena de notícias a apurar e escrever, e anoitecia pulsátil, mesmo depois das acabrunhantes viagens diárias a São Leopoldo para cursar jornalismo na Unisinos.
Na Folha aprendi a adorar a Editorial de Geral, onde está a peonada do jornalismo: Repórter de Geral. Aprendi a adorar também as botas pretas de cadarço com sola pesada, confortáveis e aptas para qualquer solo e clima. Botinha de Repórter é como as batizei.
Toda manhã as pautas nos esperavam em tirinhas de papel. Cada saída com a equipe repórter-fotógrafo-motorista era uma celebração para mim, “foca” deslumbrada. Digitávamos os textos em PCs com monitor de fósforo verde em meio ao alarido da Redação, uma sala apenas dividida em Editorias com uns seis PCs cada. Os Editores ficavam no único aquário – a sala com divisória de vidro - e havia as salas menores de Fotografia e Arquivo, de recebimento de telex e de diagramação e finalização das edições. Ah, que grande azáfama! Papel, bloco, telefones, dicionários, “espelhos”, “bonecos”, fotos, canetas, pressa!
Quando o relógio apontava 17h30, eu, a Rosane Berti e o Samuel Frison corríamos Redação afora, sempre atrasados para encontrar, na Praça, o ônibus para a Unisinos. Havia histórias e risos nessas viagens, sempre tendo a Folha de Hoje como cenário. Em 2007 as pessoas que trabalharam no jornal organizaram uma confraternização em Caxias e houve um quase consenso em relação aos episódios mais marcantes da história da FH. Um deles foi o dia em que parte do prédio da Prefeitura da cidade pegou fogo.
Era final de tarde, mas o Cancian, nosso Editoral Geral, não precisou chamar ninguém de volta ao trabalho. Estávamos todos lá, uns nos carros do jornal, outros subindo às carreiras a rua Dom José Barea, no alto da qual está, ainda hoje, o Centro Administrativo. Eu e o Samuel chegamos juntos, e ainda hoje me lembro da gafe que cometi. Lá estava o prefeito Mansueto Serafini, uma expressão atordoada no rosto. Eu, afobada pela corrida, lasquei:
- Oi, prefeito, tudo bem!?
Atrás dele, as chamas destruíam parte do prédio!
Nem bem perguntei, me dei conta da gafe e saí dali rapidinho. Uma insensibilidade de Nero, a minha.
Uma hora depois chega à rua, esbaforido, o então secretário da Educação. Ele conta que uma criança quase fora esquecida no local porque dormia em uma das salas da Secretaria. A mãe havia saído e voltou desesperada quando soube do incêndio. Os detalhes da história hoje me escapam, mas eram muitos, e eu e o Samuel resolvemos fazer um texto assinado pelo dois.
Eu estava então imbuída do espírito dos manuais de redação e – temente àqueles preceitos ridículos - insistia em um texto protocolar. O Samuel, hoje mestre e doutorando em Letras, queria fazer uma narrativa quente como as chamas. O texto publicado foi um híbrido, e o episódio da criança, dias a fio, discorrido em nossas viagens a São Leopoldo.
A Folha fechou de forma melancólica em meados dos anos 90. Não sei se algum estudante de jornalismo da Universidade de Caxias do Sul contou a história do jornal. Espero que sim.
Eu era auxiliar de escritório em uma rede de supermercados de Caxias do Sul em meados de 1990. Entrava na segunda fase de Jornalismo e decidi bater na porta do extinto jornal Folha de Hoje para pedir emprego. Consegui um estágio e lá fiquei durante dois anos. Como tantos outros que passaram pelo jornal, a minha relação com a Folha era um caso de amor.
Havia a Tríade dos Editores – Cancian, Ibanor e Braga. E trabalhava lá o Darci Demetrio, que sabíamos – os repórteres - ter ganho um Prêmio Esso Regional Sul de Jornalismo. Toda semana o Demetrio selecionava uma reportagem para colocar no mural da Redação e comentar. Lembro-me ainda hoje do dia em que a primeira que fiz foi “para o trono”, como dizíamos. Recortei o comentário, que fora datilografado em máquina de escrever, e o guardei.
A rotina na Folha dava a sensação de banho em dia frio. Suavemente cálida. Eu amanhecia plena de notícias a apurar e escrever, e anoitecia pulsátil, mesmo depois das acabrunhantes viagens diárias a São Leopoldo para cursar jornalismo na Unisinos.
Na Folha aprendi a adorar a Editorial de Geral, onde está a peonada do jornalismo: Repórter de Geral. Aprendi a adorar também as botas pretas de cadarço com sola pesada, confortáveis e aptas para qualquer solo e clima. Botinha de Repórter é como as batizei.
Toda manhã as pautas nos esperavam em tirinhas de papel. Cada saída com a equipe repórter-fotógrafo-motorista era uma celebração para mim, “foca” deslumbrada. Digitávamos os textos em PCs com monitor de fósforo verde em meio ao alarido da Redação, uma sala apenas dividida em Editorias com uns seis PCs cada. Os Editores ficavam no único aquário – a sala com divisória de vidro - e havia as salas menores de Fotografia e Arquivo, de recebimento de telex e de diagramação e finalização das edições. Ah, que grande azáfama! Papel, bloco, telefones, dicionários, “espelhos”, “bonecos”, fotos, canetas, pressa!
Quando o relógio apontava 17h30, eu, a Rosane Berti e o Samuel Frison corríamos Redação afora, sempre atrasados para encontrar, na Praça, o ônibus para a Unisinos. Havia histórias e risos nessas viagens, sempre tendo a Folha de Hoje como cenário. Em 2007 as pessoas que trabalharam no jornal organizaram uma confraternização em Caxias e houve um quase consenso em relação aos episódios mais marcantes da história da FH. Um deles foi o dia em que parte do prédio da Prefeitura da cidade pegou fogo.
Era final de tarde, mas o Cancian, nosso Editoral Geral, não precisou chamar ninguém de volta ao trabalho. Estávamos todos lá, uns nos carros do jornal, outros subindo às carreiras a rua Dom José Barea, no alto da qual está, ainda hoje, o Centro Administrativo. Eu e o Samuel chegamos juntos, e ainda hoje me lembro da gafe que cometi. Lá estava o prefeito Mansueto Serafini, uma expressão atordoada no rosto. Eu, afobada pela corrida, lasquei:
- Oi, prefeito, tudo bem!?
Atrás dele, as chamas destruíam parte do prédio!
Nem bem perguntei, me dei conta da gafe e saí dali rapidinho. Uma insensibilidade de Nero, a minha.
Uma hora depois chega à rua, esbaforido, o então secretário da Educação. Ele conta que uma criança quase fora esquecida no local porque dormia em uma das salas da Secretaria. A mãe havia saído e voltou desesperada quando soube do incêndio. Os detalhes da história hoje me escapam, mas eram muitos, e eu e o Samuel resolvemos fazer um texto assinado pelo dois.
Eu estava então imbuída do espírito dos manuais de redação e – temente àqueles preceitos ridículos - insistia em um texto protocolar. O Samuel, hoje mestre e doutorando em Letras, queria fazer uma narrativa quente como as chamas. O texto publicado foi um híbrido, e o episódio da criança, dias a fio, discorrido em nossas viagens a São Leopoldo.
A Folha fechou de forma melancólica em meados dos anos 90. Não sei se algum estudante de jornalismo da Universidade de Caxias do Sul contou a história do jornal. Espero que sim.
Um comentário:
Bons tempos! Aprendi muito lá, Lembro do Folheto, caderno de cultura e variedades, onde Dinarte, eu, Ivonete tirávamos "água de pedra" para dar notas da cultura de Caxias Lembro que o Dinarten e a Iva (carinhosamente) sempre faziam a página da sociedade e eu me negava... fazia até horóscopo e a coluna da TV, mas social, jamais. Lembro das críticas de cinema, das coberturas do antigo cine ópera (queimado pelo desdém das autoridades que titubeavam em não tombá-lo como patrimônio)Ahh... bons tempos de FOLHA DE HOJE.
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