Por Elaine Tavares – jornalista
A imagem fala. Cercado pela água, um dos mais importantes cientistas de Blumenau, Fritz Müller, deve se perguntar: o que é que os homens fizeram dessa cidade? Primeiro comentador da polêmica obra de Charles Darwin, Müller, que vivia em Blumenau desde 1855, mandou para o cientista britânico uma pesquisa com crustáceos da ilha de Santa Catarina, na qual comprovava a idéia evolucionista do colega. Fritz Müller foi também o primeiro cientista a apresentar modelos matemáticos para elucidar a chamada “seleção natural”. Chamado por Darwin de “o príncipe dos observadores”, o cientista, que atuava como professor na cidade catarinense, acabou citado mais de dezessete vezes nas edições posteriores do “Origem das Espécies”, e manteve correspondência por longo tempo com Darwin. Mas, naquela primeira semana de setembro ali estava ele, em bronze, ilhado, impotente, vendo a cidade encher mais uma vez.
Quem também esteve ilhada por alguns dias foi a professora Catarina Gewehr. Morando no quarto andar ela não teve nada de seus pertences tocado pelas águas, mas, do alto da janela, sem luz, sem água, viveu o que descreve como um sentimento de “total desolação”. Catarina conta que para onde quer que olhasse ali estava a água, tomando toda a região próxima à FURB. “Foi a primeira vez que vivi uma enchente aqui em Blumenau. Não dá medo, não dá pavor, o que dá isso mesmo, uma profunda desolação. E é o que a gente vê nos olhos das pessoas por toda a cidade. Quando a água baixou e eu saí para a rua, tentando ajudar, esse era o sentimento que eu via em toda a gente. Desolação e resignação. Como se aquilo tudo fosse coisa natural, triste, mas natural”.
Na região de Blumenau, antes de chegarem os colonizadores alemães, viviam os Xokleng e os Kaigangs. Eram comunidades coletoras, de cultura simples, mas conhecedoras dos segredos da natureza da região. Como era comum aos indígenas da época, nos tempos de chuva eles se moviam para longe dos rios, pois sabiam que as divindades das águas avançariam pela terra afora, tornando fértil o vale e fazendo com que nascessem mais bonitos os frutos locais. A relação com a natureza era de conhecimento profundo e harmonia. Mas, todo esse equilíbrio se quebrou com a chegada dos primeiros imigrantes, trazidos para o Brasil com o objetivo de colonizar os “lugares vazios”. Só que esses lugares não estavam vazios e o processo que introduziu o homem branco – a maioria de famílias alemãs e italianas – foi de violenta destruição dos povos autóctones. Não bastasse o genocídio, as famílias que chegavam, no sonho de uma vida melhor, foram fincando raízes nas margens dos rios, expondo-se elas mesmas aos caprichos das divindades aquáticas.
Quando em 1850, o doutor Hermann Blumenau chegou ao vale para fundar uma comunidade, ninguém imaginava que o lugar iria protagonizar, sistematicamente, longas batalhas com o grande rio (Itajaí-açu). A primeira delas já foi no ano de 1852, quando, no mês de novembro, o rio passou dos 16 metros (a maior cheia até agora), segundo dados do Centro de Operação do Sistema de Alerta (CEOPS), da FURB (Universidade de Blumenau). Desde aí, até o ano de 2005 foram contabilizadas 68 enchentes, ficando de fora a tremenda tragédia de 2008, quando a cidade praticamente ruiu, e a última, do mês de setembro de 2011.
O que parece intrigante é que, se desde os primeiros anos da colonização até hoje, as enchentes se sucedem, por que não houve e nem há uma prevenção efetiva, de não ocupação das margens, para que as famílias não tenham de viver cotidianamente os horrores do alagamento? Ainda segundo o CEOPS, historicamente, sempre que acontecia um grande desastre por conta das águas, como nos anos de 1911, 1927, 1957 e 1983, o poder público discutia com mais afinco a questão, inclusive propondo medidas de prevenção. Mais isso só fervilhava no pequeno período pós-enchente, arrefecendo na medida em que a cidade voltava à vida normal. Assim, o que os pesquisadores da FURB observam é que, apesar do impacto das tragédias, a população e o poder público tendem a manter inalterada a disposição de usufruir das medidas de defesa contra as enchentes, porque, afinal, não querem arcar com os ônus políticos/econômicos/culturais que isso acarreta.
No que diz respeito aos morros também já existem dezenas de estudos que comprovam a fragilidade destes espaços na região – com alguns deles propensos a deslizar mesmo sem ocupação humana - e ainda assim os morros seguem sendo ocupados, com as pessoas sequer sabendo desse “detalhe”, uma vez que a própria mídia acaba não cumprindo o seu papel de divulgar esses estudos. Se houvesse uma política de informação, muitas famílias desistiram de comprar uma casa ou um sítio em lugares vulneráveis, ou ainda, lugares vulneráveis não seriam vendidos. Mas, os estudos feitos sobre enchentes ou deslizamentos só aparecem, re-nascidos das gavetas empoeiradas, sempre depois dos desastres, e para as gavetas voltam assim que a população vai retomando seu cotidiano.
Segundo o engenheiro florestal, e pesquisador do CEOPS/FURB, Julio Refosco, a cidade tem a seu dispor soluções estruturais, tais como canalizações, reflorestamento, recuperação das matas ciliares nas margens do rio. Mas estas são consideradas muito caras. Para se ter uma idéia, tão logo a cidade se recuperou da enchente de 1983, em 1986 foi finalizado um mapa, chamado de primeira carta-enchente, no qual estão bem delimitadas as áreas que são atingidas assim que o rio chega aos 8 metros. Esse seria um instrumento que deveria nortear as políticas públicas de longo prazo, mas acaba não sendo levado em conta. Julio lembra o exemplo de Curitiba que decidiu criar parques ciliares nas margens dos rios, fazendo assim um trabalho de longo prazo, mas verdadeiramente preventivo.
No caso de Blumenau sabe-se que esse tipo de ação seria bastante complicado. Há muita gente morando nas áreas próximas ao rio, seriam necessárias muitas desapropriações e, numa cidade onde o poder público não tem um plano bem claro para o desalojo, fica bem difícil para as famílias aceitarem sair do lugar onde vivem desde há gerações. Mas a pergunta que não cala é: o que acaba sendo mais caro, realocar as famílias ou viver essa tragédia a cada dois, três anos? Julio Refosco concorda que talvez fosse mais vantajoso para a sociedade blumenauense apostar numa solução de longo prazo, com uma mudança radical na estrutura da própria cidade, mas também argumenta o quanto isso pode ser difícil considerando a realidade concreta das pessoas.
Na enchente desse mês de setembro, quando o rio chegou a 12 metros, as áreas atingidas foram bem maiores do que as da carta-enchente de 1986 e novos instrumentos deverão ser construídos a partir dessa realidade. Mas, outros problemas se avolumam na margem ocupada do rio, como é o caso da margem esquerda. Ali, além da invasão das águas, quando o rio cresce, está acontecendo o problema da instabilidade do terreno. Quando em 1990 a região passou por obras paliativas da enchente, houve uma canalização do rio. Isso fez com que as águas aumentassem de velocidade, retirando sedimentos das margens e causando instabilidade. Um exemplo típico de uma intervenção emocional, sem visão de longo prazo. “Medidas como muro de contenção, por exemplo, não são indicadas, porque acabam provocando problemas ainda maiores” diz Refosco. Ele também avalia que proteger as margens do rio com vegetação seria o mais adequado. “É certo que isso não é coisa para se fazer num ano, precisaria de um programa de no mínimo 50 anos, para retirada gradual de casas e construção de parques. Isso teria de ser um programa que envolvesse educação ambiental, reordenamento geral da vida, uma coisa muito mais ampla do que tomar medidas emergenciais”.
O fato é que, como ensina a escritora canadense Naomi Klein, existe sempre um grupo bem pequeno de pessoas que lucra muito com a “política do desastre”. Quando ocorrem catástrofes de destruição de cidades, logo vêm as empresas de reconstrução que movimento milhares de reais em materiais, cimento, etc... Há gente que lucra muito com a desgraça alheia. Talvez seja por isso que os instrumentos de conhecimento que a cidade já produziu através de seus cientistas e pesquisadores permaneçam escondidos nas gavetas. Ou isso ou os administradores estão falhando, como bem lembra a professora Catarina. “Não dá para a gente viver acreditando que isso é natural. O poder público tem que se responsabilizar por essa situação. Tem que propor saídas concretas e não paliativas. Os estudos existem. Há todo um contingente de pesquisadores que produzem informação de qualidade, que propõe soluções. Mas não são levados em conta”. Ela lembra a própria Universidade de Blumenau, que tem uma histórica produção sobre as enchentes. Se as soluções definitivas requerem um redesenho na cidade isso deveria ser encarado como uma possibilidade, senão de agora, pelo menos do futuro. Um bom planejamento e vontade política podem mudar essa dinâmica de tragédia atrás de tragédia.
Por outro lado há que haver também um compromisso dos sindicatos e movimentos sociais da cidade em fazer esse debate de maneira mais profundo. O sistema capitalista de exploração da natureza já deu mostras do seu esgotamento. Ou se pensa a cidade de forma a atuar em harmonia com a natureza, ou ela vai seguir seu curso. E aí não será possível chamar a tragédia de uma desgraça natural. Ela é fruto da forma de ocupação pela qual se optou desde os tempos do Dr. Blumenau. A cidade está então colocada entre a cruz e a caldeirinha. Ou aceita a lógica de destruição/reconstrução permanente, ou se repensa, assentada em outra lógica, de uma vida segura em relação harmônica com o grande rio.
Segundo informações da CEOPS a prefeitura já chamou os pesquisadores para a feitura de uma nova carta-enchente, para saber quais espaços da cidade são alagados a 8, 9, e 12 metros. E o que se espera é que, em posse desses dados, a comunidade blumenauense, informada, possa decidir sobre seu futuro.
Agora vem aí mais uma Oktoberfest, a famosa festa que recebe turistas de todo o país. E, por conta dela, as ruas do centro e da região dos pavilhões já estão como novas, limpas e belas. As pessoas da cidade, conhecidas por sua fortaleza, se colocam em pé. Isso é bom, movimenta o turismo, traz dinheiro para a cidade, levanta a auto-estima. Mas, lá na frente, novas chuvas cairão, e o rio seguirá seu curso. Talvez fosse hora também de reinventar a cidade para que ali, sua gente pudesse bem-viver, sempre, e não só nos dias de festa.
A imagem fala. Cercado pela água, um dos mais importantes cientistas de Blumenau, Fritz Müller, deve se perguntar: o que é que os homens fizeram dessa cidade? Primeiro comentador da polêmica obra de Charles Darwin, Müller, que vivia em Blumenau desde 1855, mandou para o cientista britânico uma pesquisa com crustáceos da ilha de Santa Catarina, na qual comprovava a idéia evolucionista do colega. Fritz Müller foi também o primeiro cientista a apresentar modelos matemáticos para elucidar a chamada “seleção natural”. Chamado por Darwin de “o príncipe dos observadores”, o cientista, que atuava como professor na cidade catarinense, acabou citado mais de dezessete vezes nas edições posteriores do “Origem das Espécies”, e manteve correspondência por longo tempo com Darwin. Mas, naquela primeira semana de setembro ali estava ele, em bronze, ilhado, impotente, vendo a cidade encher mais uma vez.
Quem também esteve ilhada por alguns dias foi a professora Catarina Gewehr. Morando no quarto andar ela não teve nada de seus pertences tocado pelas águas, mas, do alto da janela, sem luz, sem água, viveu o que descreve como um sentimento de “total desolação”. Catarina conta que para onde quer que olhasse ali estava a água, tomando toda a região próxima à FURB. “Foi a primeira vez que vivi uma enchente aqui em Blumenau. Não dá medo, não dá pavor, o que dá isso mesmo, uma profunda desolação. E é o que a gente vê nos olhos das pessoas por toda a cidade. Quando a água baixou e eu saí para a rua, tentando ajudar, esse era o sentimento que eu via em toda a gente. Desolação e resignação. Como se aquilo tudo fosse coisa natural, triste, mas natural”.
Na região de Blumenau, antes de chegarem os colonizadores alemães, viviam os Xokleng e os Kaigangs. Eram comunidades coletoras, de cultura simples, mas conhecedoras dos segredos da natureza da região. Como era comum aos indígenas da época, nos tempos de chuva eles se moviam para longe dos rios, pois sabiam que as divindades das águas avançariam pela terra afora, tornando fértil o vale e fazendo com que nascessem mais bonitos os frutos locais. A relação com a natureza era de conhecimento profundo e harmonia. Mas, todo esse equilíbrio se quebrou com a chegada dos primeiros imigrantes, trazidos para o Brasil com o objetivo de colonizar os “lugares vazios”. Só que esses lugares não estavam vazios e o processo que introduziu o homem branco – a maioria de famílias alemãs e italianas – foi de violenta destruição dos povos autóctones. Não bastasse o genocídio, as famílias que chegavam, no sonho de uma vida melhor, foram fincando raízes nas margens dos rios, expondo-se elas mesmas aos caprichos das divindades aquáticas.
Quando em 1850, o doutor Hermann Blumenau chegou ao vale para fundar uma comunidade, ninguém imaginava que o lugar iria protagonizar, sistematicamente, longas batalhas com o grande rio (Itajaí-açu). A primeira delas já foi no ano de 1852, quando, no mês de novembro, o rio passou dos 16 metros (a maior cheia até agora), segundo dados do Centro de Operação do Sistema de Alerta (CEOPS), da FURB (Universidade de Blumenau). Desde aí, até o ano de 2005 foram contabilizadas 68 enchentes, ficando de fora a tremenda tragédia de 2008, quando a cidade praticamente ruiu, e a última, do mês de setembro de 2011.
O que parece intrigante é que, se desde os primeiros anos da colonização até hoje, as enchentes se sucedem, por que não houve e nem há uma prevenção efetiva, de não ocupação das margens, para que as famílias não tenham de viver cotidianamente os horrores do alagamento? Ainda segundo o CEOPS, historicamente, sempre que acontecia um grande desastre por conta das águas, como nos anos de 1911, 1927, 1957 e 1983, o poder público discutia com mais afinco a questão, inclusive propondo medidas de prevenção. Mais isso só fervilhava no pequeno período pós-enchente, arrefecendo na medida em que a cidade voltava à vida normal. Assim, o que os pesquisadores da FURB observam é que, apesar do impacto das tragédias, a população e o poder público tendem a manter inalterada a disposição de usufruir das medidas de defesa contra as enchentes, porque, afinal, não querem arcar com os ônus políticos/econômicos/culturais que isso acarreta.
No que diz respeito aos morros também já existem dezenas de estudos que comprovam a fragilidade destes espaços na região – com alguns deles propensos a deslizar mesmo sem ocupação humana - e ainda assim os morros seguem sendo ocupados, com as pessoas sequer sabendo desse “detalhe”, uma vez que a própria mídia acaba não cumprindo o seu papel de divulgar esses estudos. Se houvesse uma política de informação, muitas famílias desistiram de comprar uma casa ou um sítio em lugares vulneráveis, ou ainda, lugares vulneráveis não seriam vendidos. Mas, os estudos feitos sobre enchentes ou deslizamentos só aparecem, re-nascidos das gavetas empoeiradas, sempre depois dos desastres, e para as gavetas voltam assim que a população vai retomando seu cotidiano.
Segundo o engenheiro florestal, e pesquisador do CEOPS/FURB, Julio Refosco, a cidade tem a seu dispor soluções estruturais, tais como canalizações, reflorestamento, recuperação das matas ciliares nas margens do rio. Mas estas são consideradas muito caras. Para se ter uma idéia, tão logo a cidade se recuperou da enchente de 1983, em 1986 foi finalizado um mapa, chamado de primeira carta-enchente, no qual estão bem delimitadas as áreas que são atingidas assim que o rio chega aos 8 metros. Esse seria um instrumento que deveria nortear as políticas públicas de longo prazo, mas acaba não sendo levado em conta. Julio lembra o exemplo de Curitiba que decidiu criar parques ciliares nas margens dos rios, fazendo assim um trabalho de longo prazo, mas verdadeiramente preventivo.
No caso de Blumenau sabe-se que esse tipo de ação seria bastante complicado. Há muita gente morando nas áreas próximas ao rio, seriam necessárias muitas desapropriações e, numa cidade onde o poder público não tem um plano bem claro para o desalojo, fica bem difícil para as famílias aceitarem sair do lugar onde vivem desde há gerações. Mas a pergunta que não cala é: o que acaba sendo mais caro, realocar as famílias ou viver essa tragédia a cada dois, três anos? Julio Refosco concorda que talvez fosse mais vantajoso para a sociedade blumenauense apostar numa solução de longo prazo, com uma mudança radical na estrutura da própria cidade, mas também argumenta o quanto isso pode ser difícil considerando a realidade concreta das pessoas.
Na enchente desse mês de setembro, quando o rio chegou a 12 metros, as áreas atingidas foram bem maiores do que as da carta-enchente de 1986 e novos instrumentos deverão ser construídos a partir dessa realidade. Mas, outros problemas se avolumam na margem ocupada do rio, como é o caso da margem esquerda. Ali, além da invasão das águas, quando o rio cresce, está acontecendo o problema da instabilidade do terreno. Quando em 1990 a região passou por obras paliativas da enchente, houve uma canalização do rio. Isso fez com que as águas aumentassem de velocidade, retirando sedimentos das margens e causando instabilidade. Um exemplo típico de uma intervenção emocional, sem visão de longo prazo. “Medidas como muro de contenção, por exemplo, não são indicadas, porque acabam provocando problemas ainda maiores” diz Refosco. Ele também avalia que proteger as margens do rio com vegetação seria o mais adequado. “É certo que isso não é coisa para se fazer num ano, precisaria de um programa de no mínimo 50 anos, para retirada gradual de casas e construção de parques. Isso teria de ser um programa que envolvesse educação ambiental, reordenamento geral da vida, uma coisa muito mais ampla do que tomar medidas emergenciais”.
O fato é que, como ensina a escritora canadense Naomi Klein, existe sempre um grupo bem pequeno de pessoas que lucra muito com a “política do desastre”. Quando ocorrem catástrofes de destruição de cidades, logo vêm as empresas de reconstrução que movimento milhares de reais em materiais, cimento, etc... Há gente que lucra muito com a desgraça alheia. Talvez seja por isso que os instrumentos de conhecimento que a cidade já produziu através de seus cientistas e pesquisadores permaneçam escondidos nas gavetas. Ou isso ou os administradores estão falhando, como bem lembra a professora Catarina. “Não dá para a gente viver acreditando que isso é natural. O poder público tem que se responsabilizar por essa situação. Tem que propor saídas concretas e não paliativas. Os estudos existem. Há todo um contingente de pesquisadores que produzem informação de qualidade, que propõe soluções. Mas não são levados em conta”. Ela lembra a própria Universidade de Blumenau, que tem uma histórica produção sobre as enchentes. Se as soluções definitivas requerem um redesenho na cidade isso deveria ser encarado como uma possibilidade, senão de agora, pelo menos do futuro. Um bom planejamento e vontade política podem mudar essa dinâmica de tragédia atrás de tragédia.
Por outro lado há que haver também um compromisso dos sindicatos e movimentos sociais da cidade em fazer esse debate de maneira mais profundo. O sistema capitalista de exploração da natureza já deu mostras do seu esgotamento. Ou se pensa a cidade de forma a atuar em harmonia com a natureza, ou ela vai seguir seu curso. E aí não será possível chamar a tragédia de uma desgraça natural. Ela é fruto da forma de ocupação pela qual se optou desde os tempos do Dr. Blumenau. A cidade está então colocada entre a cruz e a caldeirinha. Ou aceita a lógica de destruição/reconstrução permanente, ou se repensa, assentada em outra lógica, de uma vida segura em relação harmônica com o grande rio.
Segundo informações da CEOPS a prefeitura já chamou os pesquisadores para a feitura de uma nova carta-enchente, para saber quais espaços da cidade são alagados a 8, 9, e 12 metros. E o que se espera é que, em posse desses dados, a comunidade blumenauense, informada, possa decidir sobre seu futuro.
Agora vem aí mais uma Oktoberfest, a famosa festa que recebe turistas de todo o país. E, por conta dela, as ruas do centro e da região dos pavilhões já estão como novas, limpas e belas. As pessoas da cidade, conhecidas por sua fortaleza, se colocam em pé. Isso é bom, movimenta o turismo, traz dinheiro para a cidade, levanta a auto-estima. Mas, lá na frente, novas chuvas cairão, e o rio seguirá seu curso. Talvez fosse hora também de reinventar a cidade para que ali, sua gente pudesse bem-viver, sempre, e não só nos dias de festa.
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