Míriam Santini de Abreu - jornalista
Apresentei artigo no 31º Simpósio Nacional de História que examina como operam os mecanismos da ideologia na cobertura jornalística das ocupações urbanas e das remoções na pandemia de Covid-19. O material de análise é composto por dez reportagens, sendo oito do jornalismo tradicional e duas do jornalismo independente brasileiro. Analisa-se também como a alienação urbana aparece nas reportagens, que revelam o agravamento, pela pandemia, do processo que leva do aluguel instável à ocupação, e da ocupação à remoção e à situação de rua. Para milhares de pessoas, a cidade paulatinamente encolhe, restando tendas, barracas e pisos de viadutos.
As coberturas jornalísticas trazem à tona relatos das faces cada vez mais perversas da alienação urbana sob a crise econômica, o desemprego e a pandemia: a miséria se alastrando do centro para as periferias das cidades, a busca da rua para saciar a fome mesmo pelos que têm moradia e as omissões e coerções institucionais nos abrigos, nas arquiteturas excludentes e na criminalização de formas consideradas ilegais de sobrevivência. Um aspecto importante nos textos é a abertura à fala de quem experimenta, no cotidiano, o desespero e o abandono à espera de soluções que não aparecem. Faltam, porém, abordagens mais aprofundadas do papel do estado nesse processo, em especial sob o governo de Jair Bolsonaro.
Das análises destaca-se a posição do grupo de mídia catarinense ND, que desde 2018 – e de forma ainda mais intensa a partir do início da pandemia – sistematicamente criminaliza as ocupações urbanas e seus moradores em Florianópolis e cidades vizinhas. A ideologia posta em funcionamento credita aos empobrecidos a responsabilidade pela destruição da paisagem da cidade, valorizada como mercadoria turística, legitimando o discurso dos grupos dominantes e ocultando o papel deles nos processos ambientalmente insustentáveis provocados pela expansão do setor de turismo.
Na foto, pintura no prédio onde está a Ocupação Anita Garibaldi, no bairro Capoeiras, em Florianópolis, onde, desde o dia 17 de setembro, estão cerca de 100 famílias sem-teto. Trata-se de uma ocupação organizada por moradia inédita em Florianópolis, e talvez no estado, por ser em prédio abandonado. Historicamente, as ocupações organizadas na capital catarinense foram em terrenos.
O artigo completo está no link https://bit.ly/2YbvfAu
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