quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Em breve, Cuba



Aguarde, em breve, textos sobre a viagem a Cuba feita pelas jornalistas Míriam Santini de Abreu e Marcela Cornelli, da P&N. E não se enganem! Apesar da presença da deliciosa cerveja Bucanero na foto, as meninas trabalharam! Ninguém é de ferro...
E vai uma música maravilhosa...
http://www.youtube.com/watch?v=tgSOTBAw2vI


quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

“Tudo que é sólido desmancha no ar” (e o escândalo do TJ-MT)

* Por Keka Werneck

Eu ainda estava na faculdade de Jornalismo, na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), onde me formei, quando fiz uma matéria sobre a desigual pirâmide salarial no Brasil. Isso já faz tantos anos, quase 20, duas décadas...O tempo voa! Mas nunca esqueci que os braçais, como garis, estão no assoalho da pirâmide: por isso vivem muito mal, comem mal, vestem-se mal, são mal tratados; e os magistrados, como juízes e desembargadores, no topo: portanto vivem muito bem, comem bem, vestem-se bem e são bem tratados. Quis refletir na matéria sobre o porquê do abismo salarial entre as duas categorias, que, para o mundo do trabalho, têm papéis tão relevantes. Tinha poucos elementos políticos à época. A matéria ficou limitada aos dados que consegui, a entrevistas, pesquisas e à voz do meu coração. Eu acreditava na imparcialidade. A escola clássica de jornalismo ensina e reforça essa idéia até hoje. Mas a imparcialidade é uma lenda. Não há imparcialidade. E não há motivos para tamanho abismo salarial, a não ser a luta de classes, claro!

Satisfez minha sanha por um tempo a explicação de que juízes e desembargadores devem ganhar muito bem mesmo, porque assumem tarefa hercúlea, de grande vulto social. Imaginem vocês o complexo que é dizer quem está certo, quem está errado. Ganhar bem significa para os magistrados cerca de R$ 30 a R$ 40 mil por mês.

Se é tarefa nobre julgar, os garis fazem o quê? Mal damos conta de cruzar com um caminhão caçamba na madrugada silenciosa da cidade, passando de carro, que é ato instantâneo acelerar um pouco mais e tapar o nariz. Quem cataria o nosso fétido? Esses homens que, para quem olha ao longe, de dentro de seus Corolas, talvez pareçam ser de fato de uma estirpe inferior, ao ponto de dialogarem com bichos de esgoto. E há uma naturalização disso. Então fica combinado que devem mesmo ganhar mal: um salário mínimo por mês, nada mais.

Mais se os juízes ganham tão bem para que não pequem e sejam justos, porque também são atentados a ganhar ainda mais, em escusas artimanhas, em enrolados esquemas, em ardilosas transações? E por que tantos garis, ganhando tão pouco, não saem por aí roubando, matando, devolvendo à sociedade o lixo imposto a eles todos os dias?

Após a última crise do capital, o intelectual alemão, Karl Marx, jornalista, fundador da doutrina comunista, a quem a elite neoliberal internacional tentou por um século jogar no calabouço dos loucos, agora ressurge, livre da camisa de força, com sua lucidez de sempre, para nos relembrar que a luta de classes está aí e explica muita coisa. Explica por exemplo o abismo salarial entre juízes e garis. E também indica saídas. “Sem sombra de dúvida, a vontade do capitalista consiste em encher os bolsos, o mais que possa. E o que temos a fazer não é divagar acerca da sua vontade, mas investigar o seu poder, os limites desse poder e o caráter desses limites”.

O Poder Judiciário, no Brasil, é um “simulacro”. Supera a realidade social. Se está sempre blindado, do outro lado da pirâmide, ou melhor, no subsolo dela, encontra-se o ladrão de galinha, totalmente exposto, sofrendo o "açoite" das penitenciárias, da opinião pública, da miséria humana. Roubou um pão? Que Morra!

Nesse episódio que macula o Poder Judiciário de Mato Grosso, devemos comemorar. Mostra a ante-sala das negociações. Não bastasse dinheiro de salários socialmente surreais, os olhos crescem também para o erário. Seria o sinal dos tempos?

Estariam em falta no mundo das togas homens e mulheres preocupados com a justiça social?

Disse muito bem o físico alemão, Albert Einstein, do alto patamar galgado pelo autor da teoria da relatividade: “Não tentes ser bem sucedido, tenta antes ser um homem de valor”. O problema é que isso não combina com o mundo do capital, onde ter é o que vale.

As coisas cheiram mal, diriam garis, que se assolam dia após dia, nessa rotina de mierda. Mas para Antônio Gramisci, político, pedagogo, filósofo e teórico marxista italiano, “contra o pessimismo da razão, o otimismo da prática”. Então, façamos um outro lugar para se viver!

É preciso denunciar! E a imprensa deve cumprir esse papel. Deve sair dos factóides rotineiros e cumprir sua função de aprofundamento e acompanhamento dos fatos.

Parece que, pela lama visível, a moralização é tarefa utópica. Mas não é.

“Mudar é difícil, mas é possível”, garante Paulo Freire, educador recifense, que se destacou pelo projeto de educação popular, voltada para a consciência, deixando um legado milionário para a construção de um povo.

O escândalo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso é um canto a Karl Marx, que disse, sabiamente, no século passado: “Tudo que é sólido desmancha no ar”.

* Keka Werneck é jornalista em Cuiabá

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Ops, desculpa, foi engano!

Por Elaine Tavares - jornalista


Estas notícias, todas as noites, sempre me enchem de uma absurda perplexidade. Diz o repórter, em tom monocórdio: “Mais 45 mortes em Bagdá”. E isso acontece todos os dias, 45, 34, 27, 50, os números variam por aí. Já passaram cinco anos da ocupação estadunidense no Iraque. E isso é notícia noite após noite. Banalizou. Morrer, no Iraque, é coisa normal. Ninguém sequer pestaneja, segue comendo, ou varrendo, ou fazendo o que seja, enquanto ouve a terrível notícia. É que o Iraque está tão longe, quase ninguém tem algum parente lá, ou um conhecido. A dor dos iraquianos toca raras pessoas. Eu, por exemplo, me assombro a cada noite.

Outro dia, o locutor informou com voz impassível: 27 civis foram mortos por engano no Afeganistão. Putz! E ele nem pestaneja, e logo segue outra notícia, de preferência alegre, para que as pessoas não fiquem estarrecidas diante do fato de que, num outro país distante, também ocupado desde há nove longos anos, morrem civis todos os dias, vítima da violência da ocupação. E só volta e meia algum destes ataques a civis sai na imprensa. Como esse da semana passada. É que o Afeganistão “saiu da pauta”. Há outras desgraças a perscrutar.

Pois a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), que é nome pomposo do braço armado estadunidense naquela região, divulgou que matou por engano os civis pensando que eram terroristas. Pois assim é a guerra “cirúrgica” promovida pelo exército mais poderoso da terra. Recrutam garotos sem oportunidades nos Estados Unidos, transformam os mesmos em máquinas de guerra, mas tiram deles a visão do horror. No geral, estão lá em cima, nos aviões, apontando para pontos escuros na terra, como se fosse um vídeo-game. A guerra sem sangue, a “limpeza” clínica, cirúrgica, bem demarcada pelos radares.

Só que os radares são observados por humanos que erram, e tampouco podem dizer se os pontinhos no chão são terroristas ou gente simples, que tenta viver a vida naquela região conflagrada e ocupada há quase uma década. Bueno, para os estadunidenses isso parece coisa irrelevante, visto que basta ser afegão ou iraquiano para ser terrorista, é como um sinônimo. Então, vez ou outra, alguns soldados de outras bandeiras, ou mesmo algum estadunidense com consciência, percebem que essa versão de “terroristas” que eles tem cravada nas retinas não é tão verdadeira assim. Então se dão conta de que aqueles pontos lá embaixo são mulheres lavando, crianças brincando, velhos tomando sol, homens trabalhando. Então, ficam estupefatos. “São civis”! Aí uma boa alma admite o erro e pede desculpas.

“Foi um engano, desculpa”. Mas essas desculpas são para quem? Aos mortos? Estes já estão em outro plano, bem melhor, nos braços de Alá. Aos vivos? E para que? Para que os desculpem por antecipação, caso o radar ou os olhos falhem outra vez? O general McCrystal ainda tem a cara de pau de dizer que estão lá para proteger os afegãos. Proteger do quê, cara pálida?

Os Estados Unidos ocuparam o Afeganistão para, segundo seu governo, levar a democracia e a liberdade. Mas, quem, além da mídia cortesã, acredita nisso ainda? Lá estão para garantir as plantações de ópio, para manter bases militares capazes de incendiar a região a qualquer momento, para garantir seu poder de polícia do mundo. Pouco importa se para isso tenha que matar o povo inocente. A nós, aqui, cabe o assombro, a perplexidade diante do cinismo: “ops, desculpa, foi engano”. E assim segue a vida, na apatia de ver o ladrão entrando na casa do vizinho. Fecha-se a janela com vagar, para não ser visto. Até que um dia, o ladrão entra no nosso quintal...

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Trilogia Ser ou Não Ser (1) – Parte I – Eu Sou Ninguém?

1 - Palavras iniciais do conhecido monólogo do personagem Hamlet, de Shakespeare, na peça de mesmo nome.

Li Travassos, de Florianópolis

Uma campanha do MEC na TV veicula pessoas falando que acompanham os estudos dos filhos o máximo possível, o quanto isso é importante, etc. A campanha, intitulada "Eu, Você, Todos Pela Educação", mostra, além de apresentadores e atores famosos, também uma mulher que se diz diarista. Esta dita diarista conta que costuma dizer aos filhos que eles precisam estudar, porque QUEM NÃO ESTUDA NÃO É NINGUÉM. Isso, dito com lágrimas nos olhos, me faz deduzir que ela, diarista, não pôde estudar, e só por isso é diarista. E se é diarista, não é ninguém!?
Este blá-blá-blá do desvalor, do desrespeito, e da invisibilização do trabalhador e, mais ainda, da trabalhadora braçal, me dá náuseas. Tal postura, desenvolvida pela burguesia, e enfiada goela abaixo dos que realizam o trabalho braçal, que a repetem freqüentemente, é responsável por um número enorme de mazelas que atormentam a humanidade, que vão desde uma absurda desigualdade social, a resignação ou a infelicidade causadas por esta desigualdade, o trabalho escravo ou semi-escravo, o trabalho infantil, passando pelo excesso de pessoas em algumas profissões, pela maldição do tele marketing, por um número sem fim de histórias "futuristas" bizarras sobre máquinas e outros seres esquisitos fazendo o trabalho humano, e indo até a violência doméstica. Quer ver algumas destas ligações?
Então, vamos por partes e comecemos pelo começo: muitos antropólogos afirmam que o trabalho surgiu concomitantemente ao ser humano. Ou seja, o trabalho organizado, bem como a linguagem, que permitiu ensinar aos descendentes como fazê-lo, foi o que nos definiu como humanos. Ainda, com base no que nos dizem Simone de Beauvoir, Elizabeth Badinter e outras/os, acredito que a fêmea, ao propor ao macho a divisão de tarefas, permitiu a preservação da espécie humana, que de outra maneira não se daria. Por quê? Porque os filhotes estavam nascendo com cérebros menores, em função do estreitamento vaginal decorrente da posição bípede, e exigindo assim, maiores cuidados por um maior período de tempo.
Vale ressaltar que OS FILHOTES JÁ ERAM RESPONSABILIDADE DAS FÊMEAS, COMO É COMUM ENTRE OS MAMÍFEROS. Mas elas continuavam caçando e colhendo vegetais para alimentar a si mesmas (e aos filhotes quando desmamavam). Para cuidar melhor dos filhotes que nasciam com o cérebro pequeno, foi necessário que as fêmeas parassem de caçar, passando a "apenas" cuidar dos filhotes por mais tempo (há quem discorde desta hipótese, por considerá-la uma naturalização da divisão de tarefas que seria prejudicial às mulheres. Mas é justamente isso que ela é: natural. Ou como se explicaria o fato de que os homens mantiveram uma quantidade muito maior de pêlos no rosto e no corpo? Para que serviriam estes pêlos (especialmente a barba) senão para proteger o homem do sol (e/ou do frio)? A mulher não manteve tantos pêlos em função justamente de seu recolhimento, na maior parte do tempo, para áreas fechadas. O que importa não é como a divisão de tarefas começou, mas sim que esteja sendo mantida até hoje, apesar de todas as outras mudanças sociais) e colher os vegetais que eram consumidos pela tribo – e que ficavam mais perto dos abrigos.
Claro que, depois que organizou sua vida em sociedade, o ser humano não parou de criar, de pensar, de buscar e de desenvolver conhecimento, e surgiram várias formas de trabalho muito mais ligadas ao pensamento que à força e/ou à destreza físicas. De qualquer forma, foi o trabalho braçal, e a possibilidade dele ser ensinado, que nos diferenciou dos outros animais. O que mostra que o trabalho braçal já é uma atividade eminentemente humana, que exige reflexão e conhecimento.
Além disso, quase todas as formas de trabalho braçal são absolutamente indispensáveis para a manutenção da vida humana. Agricultores/as, pedreiro/as, marceneiros/as, lixeiros/as, faxineiros/as cozinheiros/as, costureiros/as, sapateiros/as, operários (de fábricas de tecidos, de calçados, de utensílios de cozinha, de eletrodomésticos), os/as que lavam nossas roupas, auxiliares de enfermagem, responsáveis pela manutenção da eletricidade, da água, do esgoto... Todas estas pessoas, e decerto mais umas tantas que eu devo ter esquecido, são simplesmente INDISPENSÁVEIS PARA O MANTENIMENTO DA VIDA HUMANA EM SOCIEDADE, especialmente se pensarmos em um mínimo de qualidade de vida. De quantas profissões que exigem "nível superior" podemos afirmar o mesmo?
Então, por que anjos nós não valorizamos o trabalho braçal? Por que as mulheres, em especial, se for para realizar serviço braçal, preferem fazê-lo apenas na sua casa? Pois tem este detalhe, né? Em muitas famílias, o homem vai trabalhar em busca de dinheiro, mas ele não caça, não planta, não constrói sua própria casa. Contudo, INDEPENDENTEMENTE DE SE A MULHER TRABALHA FORA DE CASA E RECEBE DINHEIRO OU NÃO, ainda se espera, em muitas famílias, que ela cozinhe para todos, que mantenha a casa limpa, que lave e passe as roupas, que cuide dos filhos pequenos... Se for capaz de pregar botões, fazer pequenos reparos nas roupas, decorar a casa com bom gosto, então, que mulher adorável...
Se um casal compra um terreno e contrata pedreiros para construir uma casa, no caso do pedreiro faltar, irá o marido substituí-lo? Colocar um tijolo por cima do outro? Não! Mas todos sabemos o que acontece quando numa casa há empregada, cozinheira ou babá: se ela faltar, a mulher irá, quase que automaticamente, fazer o trabalho desta funcionária. No caso de haver filhos pequenos, ela poderá inclusive faltar a seu próprio trabalho porque a babá faltou. E o homem irá cruzar os braços, como se não fosse com ele. E que valor se dá para o trabalho da dona de casa? Nenhum. Alguns homens ainda ousam dizer que a mulher "não faz nada".
Apesar do trabalho doméstico ser tão desvalorizado, não podemos viver sem que alguém o faça. Em casas onde todo mundo trabalha, é comum ser contratada ao menos uma diarista. Fazendo este serviço fundamental, se fizê-lo bem feito e não tiver atravessadores, uma diarista pode receber uns R$:80,00 por dia. Se trabalhar de segunda a sexta irá receber R$:1600,00 por mês. Serão R$:1920,00 se trabalhar de segunda a sábado (considerando 4 semanas completas em um mês). Quantas pessoas "com nível superior completo" ganham isso?
Mas, graças à falta de valor social (vejam que, neste caso, não é nem financeiro) que recai sobre a profissão de faxineira, muitas mulheres preferem trabalhar com tele marketing, profissão em que agüentam desaforos do patrão e do cliente, recebem um pouco mais do que um salário mínimo, e colaboram para tornar a vida dos outros um inferno! Poucos homens suportam esta profissão, que surgiu há tão pouco tempo, e já se tornou eminentemente feminina. Os homens que estão lá, mormente se encontram em postos de chefia, ganhando bem mais (só para variar...).
Mas na verdade, na verdade mesmo, o sonho de muita mulher de baixa renda é não precisar trabalhar. É seguir (ainda!) o modelo da mulher burguesa, que depende totalmente do homem (verdade que também tem muita mulher de classe média, com diploma de curso superior, que prefere ser "apenas" dona de casa. Mas daí a motivação é outra, o assunto é outro, e não cabe aqui). Por isso, ela vai se ressentir do fato do homem não "conseguir" sustentar a família sozinho. E pode vir a demonstrar a falta de valor que dá ao marido. E há uma tendência de que esta novela acabe em tapas (antes de alguém me acusar de estar sugerindo que a mulher é responsável pela violência doméstica de que é vítima, sugiro a leitura do livro Cenas e queixas (Gregori, Mª. F. São Paulo: Paz e Terra), onde há diversas descrições de casos familiares assim. A idéia do livro – e a minha também – é de que a violência doméstica é resultado de uma relação, não apenas de uma pessoa malvada (que seria o homem). Relação esta que está inserida dentro de uma sociedade, e precisa ser vista através desta lente, sob o risco de buscarmos apenas punir os culpados, mas ficarmos impotentes para alterar verdadeiramente a realidade).
Um dos motivos para que as mulheres não vejam o trabalho de empregada doméstica como sendo uma fonte de renda como outra qualquer é o fato de terem tido que iniciá-lo muito cedo. Quer "trabalhe fora" ou não, a maioria das mulheres de baixa renda, que tem muitos filhos, irá atochar uma criança no colo da filha mais velha assim que ela conseguir segurá-la. Irá esperar que ela cozinhe, que limpe a casa, enfim, que faça todas as tarefas domésticas que deveriam ser executadas exclusivamente por pessoas adultas.
No programa Fantástico (se eu não estou enganada do dia 17/01/10), em um quadro chamado 4 por 4 (sem nenhuma utilidade pública, diga-se de passagem) que mostra casais que tiveram 4 filhos de uma só vez, foi mostrada uma família com 9 filhos (os últimos 4, claro, nasceram ao mesmo tempo). Trata-se de uma família de agricultores abaixo da linha da pobreza, onde uma menina de uns 10 ou 11 anos ajuda a cuidar dos gêmeos, a cuidar da casa, a cuidar dos outros irmãos menores, porque a mãe também trabalha na roça... O pai solicita a ajuda de filhos tão absurdamente pequenos para poderem fazer alguma coisa na agricultura, que eu fiquei assustada. Diante das câmeras, os menininhos não vão ajudar o pai. Penso se longe delas eles têm esta opção.
À menina nenhuma opção é dada: ela é filmada o tempo todo com um dos irmãos nos braços e a mesma cara de ódio e tristeza profunda que eu vejo em toda criança que é mostrada na mídia realizando algum tipo de serviço braçal. Mídia esta que, caso não esteja falando (com ou sem hipocrisia) diretamente sobre o trabalho infantil, não faz um bendito comentário, não questiona nada em relação a isso. Neste quadro do Fantástico, estes pais chegam a defender o trabalho infantil "porque mostra para os filhos que nada vem de graça na vida, blá-blá-blá..." Vou ali me cidar e já volto, e quando volto espero em vão que os apresentadores do programa façam algum comentário sobre isso, mas NADA! Acredito que as mulheres prefiram trabalhar como faxineiras de empresas, respondendo a firmas de terceirização onde recebem muito menos do que como diaristas em residências, só para não ter na patroa uma figura materna lhes dizendo como fazer o serviço!
Mas vamos voltar para a questão geral da baixa remuneração dos trabalhadores braçais, destes milhões de "ninguéns" que, no Brasil e no mundo, fazem todas estas coisas que são indispensáveis à vida e não recebem sequer a nossa gratidão, quanto mais um salário justo. Uma vez, me perguntaram se eu, que estudei um monte, gostaria de ganhar o mesmo que uma faxineira. Respondi que se ela ganhasse uns R$:4000,00 por mês, eu acharia ótimo. Acredito que todas as pessoas devem ser remuneradas com salários capazes de permitir um padrão de vida confortável, independentemente de quanto estudaram para isso. E acredito que isso é possível, especialmente em nosso país, tão grande e tão rico. Mas acaba que algumas profissões pagam salários astronômicos enquanto a grande maioria da população tem que viver com um salário mínimo que não possibilita sequer morar e comer com dignidade...
"Ah, mas se todo mundo recebesse o mesmo salário, ninguém mais iria estudar!" Não? Eu, se tivesse feito graduação e mestrado apenas em busca de uma melhor remuneração, já teria me enforcado em um pé de couve! Há pessoas que buscam determinadas profissões ou campos de saber por necessidade interna, por curiosidade apaixonada, porque sem isso a vida não vale a pena! Há quem insista que a solução da miséria e da pobreza está na educação. Se todos estudarem, vão ter um "emprego melhor", e vão ganhar mais. Mas então, quem ficaria com os "empregos piores"? Quem vai fazer o trabalho braçal? Vamos "fabricar" seres diferentes para cumprirem com estas tarefas, como no Admirável mundo novo de Huxley e outras fantasias futuristas estapafúrdias?
Pois eu penso exatamente ao contrário: o extermínio da miséria e da pobreza é que seria a solução para a educação. Ou seja, para resolver o problema, seria necessário que:
1. Todas as pessoas adultas recebessem um salário verdadeiramente digno por seu trabalho.
2. As pessoas trabalhassem um menor número de horas semanais, para garantir que todo adulto que deseja trabalhar pudesse fazê-lo.
3. Mesmo aqueles que não quisessem trabalhar pudessem ter uma vida digna.
Então, com certeza, o trabalho infantil seria extinto, e todas as crianças poderiam frequentar as escolas. Não gosto de criticar o programa "Bolsa Família", porque sei o quanto ele aplaca a fome e a miséria Brasil afora. Mas tenho certeza que o fato de ele ser voltado para a família e não para o cidadão, e ter a condicionalidade de, na família, haver crianças em idade escolar efetivamente estudando, só faz conduzir a um aumento da procriação nas famílias de baixíssima renda (que são aquelas beneficiadas pelo programa). O "Bolsa Família", assim como o programa de "Agricultura Familiar", mantido o respeito por sua ajuda efetiva no combate à miséria, são estimuladores do "proletariado", ou seja: estimulam pessoas a terem nos filhos (leia-se mão de obra extra) seu único bem.
Para além de tudo isso somos prisioneiros de um consumismo absurdo, que injeta na cabeça dos muito jovens ou dos muito sem juízo e sem auto-estima que "Se você não tiver o tênis-celular-carro-vestido-sapato do momento você não é ninguém!" De novo esta idéia! "Pobre menina, não [é] ninguém..." (corruptela descarada da – já triste – música de Leno e Lilian, que diz: pobre menina, não tem ninguém.... (peço desculpas a você que ficou chocado com minha brincadeirinha besta bem no meio do assunto, mas é para a gente poder rir um pouco, que também ninguém é de ferro, né?), tchu-ru-tchu, tchu-ru-tchu... Daí, aumenta o número de jovens roubando, usando drogas, traficando. E ser pobre vira sinônimo de ser bandido... Todos falam, ad nauseam, em maneiras de acabar com o tráfico de drogas. Mas ninguém pensa em maneiras de acabar com a NECESSIDADE que o ser humano tem das drogas. Eu, cá comigo, penso que a miséria e a falta de perspectiva são os principais estopins desta necessidade.
Está difícil de engolir e você quer mais um pouco de utopia? Então, em relação a esta supervalorização da educação, vamos pensar que bom seria também se todos tivéssemos, para começar, as mesmas oportunidades de estudo. Se só existissem escolas públicas, e se todas fossem de boa qualidade, e se todas funcionassem em período integral para todas as crianças, e se a locomoção até elas fosse gratuita, digna e segura!
Que bom se pudéssemos, todos, começar a trabalhar REALMENTE apenas depois dos dezesseis anos! Que bom se voltasse o ensino profissionalizante obrigatório no segundo grau. Não acredito que isso só serviria para "impedir que as pessoas oriundas de famílias de baixa renda fizessem faculdade e também para facilitar a contratação de menores de dezesseis anos", como querem alguns. Ora, até parece que curso superior é tudo isso de bom! Têm muito curso profissionalizante que leva a uma inserção no mercado de trabalho muito mais rápida, e com salários inclusive maiores do que muita gente com curso superior consegue – e isso agora, nesta realidade triste em que vivemos... Mas os cursos profissionalizantes são tão raros que só muito poucos conseguem fazê-los...
Continuando nossa "plantação de ses": se as Universidades fossem públicas, e o acesso a elas fosse igualmente fácil ou difícil para todos, e se os salários de todos fossem os mesmos por hora trabalhada, então só continuaria estudando para além do ensino fundamental quem quisesse realmente continuar estudando, não quem estivesse interessado em apenas ter um salário decente. Daí, todas as profissões continuariam sendo procuradas. E todos viveriam felizes para sempre? Pode ser que não, mas que chegaríamos mais perto disso, lá chegaríamos...
Gostou deste texto? Então, não perca, em breve, neste mesmo "canal" (no que depender de mim, ao menos), a segunda parte da trilogia SER OU NÃO SER...

Quinze pinturas de Fernando Karl

Exposição Nautikkon 2010.

Dedico esta exposição aos meus amigos de destino:
Joel Gehlen, Fábio Brüggemann, Péricles Prade, Dennis Radünz, Vinícius Alves, Antonio Carlos Floriano, Marco Vasques, Francine Canto, Everton Freitag, Adriana dos Anjos, Míriam Santini Abreu, Alceu Bett, Shânkara Lis Martins Karl e Matheus Nascimento Karl.

Escutar Cold Play enquanto estiver vendo as gravuras abaixo:
http://www.youtube.com/watch?v=dvgZkm1xWPE
Ver o blog Nautikkon:

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

A lição da RBS


Por Elaine Tavares – jornalista

Eu tinha pouco mais de 20 anos quando comecei a trabalhar na televisão. Era uma empresa da RBS em Caxias do Sul. Encantada com o mundo do jornalismo, o qual eu perseguia desde menina, “vestir a camisa” da empresa me parecia a coisa mais certa a fazer. O trabalho passou a ser minha própria vida. Não havia separação. E era comum fazer milhares de horas extras sem ganhar nada, trabalhar nos finais de semana, feriados. Eu amava o Otaviano, meu chefe direto, que era um competente jornalista e me ensinou quase tudo o que eu sei, tinha profundo carinho pelo diretor da TV, o seu Ênio e atuava com companheiros do mais alto gabarito, seja no nível da reportagem (Britto Jr) ou da imagem (Vaderlei, Dino, Luis). Não via qualquer contradição entre capital X trabalho. Era uma alegre e bem comportada funcionária da RBS. Até que um dia, e própria empresa me deu uma lição que jamais pude esquecer.

Dentre os trabalhadores da rede, havia um por quem eu tinha muita ternura. Não vou aqui dizer o seu nome, mas ele atuava na área da engenharia. Era um pouco assim como eu. A empresa era sua primeira pele. Tudo fazia por ela e os colegas diziam que ele tinha trabalhado com Maurício (o criador da RBS) desde os tempos de Passo Fundo. Amava a RBS mais que a si mesmo, mas era totalmente puxa-saco. Como ele vinha muito à Caxias a gente sempre conversava muito e eu, espevitada, me irritava um pouco com aquilo. A gente brigava.

Naqueles dias de 1983 eu já incursionava pelas reuniões de sindicato da cidade, por conta das reportagens e admirava uma mulher, presidente do sindicato dos gráficos, que iniciava a construção do Partido dos Trabalhadores por lá. Foi quando comecei a me enredar nestas coisas da política e a perceber que as empresas capitalistas existem para sugar o sangue dos trabalhadores. Comecei a observar melhor minha relação com a RBS. Entrei para o sindicato dos radialistas e passei a exercer a função de delegada sindical. Tudo mudou pra mim e nas conversas que eu tinha com esse amigo, ele me dizia: “Olha, tu deixa isso pra lá, tu vai te queimar. A empresa te dá um pé na bunda. Larga de política e vai trabalhar”. Óbvio que não larguei, ao contrário, e quem me incentivou a mergulhar nisso foi a própria RBS.

Ocorre que esse meu amigo estava para se aposentar. Ele fazia planos, mas sofria por se saber fora daquele lugar que era a sua vida. E a gente falava muito sobre isso. Então, um dia, sem mais, nem porquê, nos chegou a notícia: o companheiro havia sido demitido. Tinha mais de 25 anos na empresa, a um passo da aposentadoria. Ficou sem eira nem beira, no chão. A RBS era seu mundo. Estava acabado. Cheguei a vê-lo meses depois, um homem arruinado. Então, na aurora do despertar da minha consciência de classe eu percebi: quando a gente vende a força de trabalho para uma empresa capitalista, duas coisas podem acontecer.

1 – Tu luta, e é demitido.
2 – Tu não luta, se esforça, defende e ama a empresa, e é demitido também.

A empresa me ensinou. Nunca mais tive dúvidas. E desde então, onde quer que vá, estou sempre na luta, no sindicato, nos movimentos. Porque o sistema que nos oprime não tem compaixão. O grande jornalista José Martí já educava. Melhor morrer de pé que viver ajoelhado.

No último mês de janeiro deste 2010 vários companheiros jornalistas desta mesma empresa foram demitidos. Muitos deles com mais de 15 anos de casa. Gente que deu seu sangue, sua vida pela RBS. Foram mandados embora assim, sem mais, nem menos. Talvez a empresa os considere velhos, sem criatividade e afinal, há um exército de meninos e meninas à espreita, esperando uma vaga na prima-irmã da platinada. Estes companheiros e companheiras fizeram tudo certinho, trabalharam com afinco e dedicação, raros se meteram em lutas laborais. E esta é paga. Eu aqui me solidarizo com estes companheiros, por quem tenho profundo respeito e admiração. Posso imaginar a dor e a perplexidade, assim como senti naquele longínquo amigo.

Então escrevo essas linhas, para lembrar aos jovens esta triste lição: o trabalho duro e comprometido junto às empresas capitalistas não nos garante qualquer compaixão. Neste sistema perverso só a luta coletiva nos leva a conquistas de vida digna. Só a luta solidária nos aproxima e nos irmana na busca de um mundo novo. Estarmos juntos e em comunhão é nossa única opção contra a rapina do capital!

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Manifestação de trabalhadores na Bélgica

A Europa também sofre com a crise e o desemprego. O que mostra que o processo de super-exploração, antes restrito ao sul do mundo, também está chegando no chamado "primeiro mundo". Na última semana 35 mil trabalhadores sairam às ruas de Bruxelas, na Bélgica, numa manifestacao por emprego e respeito aos direitos dos trabalhadores. O ato foi organizado pelas três grandes centrais sindicais do país, os socialistas, os cristãos e os liberais.

Quem informa é Catarina Gewehr, uma "nojenta" que está na Bélgica. Ela conta que na manifestação, as agremiações ficam muito bem demarcadas. Os socialistas marcham de capas vermelhas, os cristãos de amarela e os liberais de capa azul. Havia ainda manifestantes com capas verdes, que ela não conseguiu descobrir de que agrupamento eram.

"Fico pensando é no significado desse tipo de coisa... no primeiro mundo os trabalhadores estão sentindo o influxo da onda... e estão se mexendo... Nos países periféricos parece que isso ainda não foi sentido, mas na medida que a estagnação do modelo capitalista for se tornando impossível de ser negada, o que podera acontecer? Nao sei! Mas Marx saberia dizer..."

100 mil pessoas recuperam a visão no Equador


No Equador, chegar a 100 mil operações de distintas patologias oftalmológicas exitosas e gratuitas pode ter sido fácil, mas para as pessoas de escassos recursos às quais as mãos cubanas devolveram a visão, o que aconteceu foram cem mil milagres. Esse trabalho é resultado da ação de Cuba que tem como objetivo levar a solidariedade concreta aos povos de Abya Yala (América Latina).

Os médicos cubanos que realizaram as cirurgias contam que escutaram cem mil vezes a expressão: "Santa mãe, um milagre!" no momento em que eram tiradas as vendas dos olhos operados que voltavam a ver, quando as pessoas agradeciam ao líder cubano Fidel Castro por criar esta humanitária missão, que não por acaso, chama-se MIssão Milagre.

Os primeiros oftalmologistas cubanos chegaram ao Equador em outubro de 2005 e no espaço de oito meses realizaram mais de 12 mil consultas na província de Esmeraldas, e destes, dois mil e 101 pessoas viajaram à Cuba, onde foram operadas sem nenhum custo.

No ano de 2006, uma equipe avançada, integrada por um médico e dois engenheiros reconstruiu prédios existente em Latacunga e Ballenitas, para convertê-los em 50 dias nos mais modernos centros oftalmológicos da região. Posteriormente foi construído outro em Machala.

O Centro "Eloy Alfaro", de Latacunga, na provincia Cotopaxi, inaugurado en 29 de maio de 2006, realizou 35.321 operações até esta semana. O Centro "José Martí", de Ballenita, província de Santa Elena, inaugurado em 16 de junho de 2006, fez 33.599 no mesmo período.

O Centro "Solidaridad Machala-Cuba", inaugurado em 26 de junho de 2007 na capital da província El Oro, realizou até agora 28.947 intervenções cirúrgicas, basicamente de cataratas, pterigio, glaucoma e outras patologias.

Estas cifras, incluindo os 2.101 iniciais, e os 32 pacientes programados para hoje completam os 100 mil pacientes equatorianos operados.

Até agora passaram pelo país 152 colaboradores cubanos. Hoje existem 45 deles distribuídos pelos diferentes centros e além da atenção médica especializada atuam também na aárea assistencial e científica.

A coordenadora da Missão no Equador, doutora Milagros Mata, felicitou os colaboradores atuais e os que já cumpriram seu papel naquele país, e reiterou o compromisso de Cuba em seguir atuando e dando o melhor de sí aos povos latino-americanos. Esse compromisso cubano mostra o quanto é diferente uma ação verdadeiramente humanitária. Enquanto os Estados Unidos mandam tropas, armas, tanques de guerra dizendo "defender a democracia", Cuba envia seus melhores quadros no campo da medicina, engenharia e outras áreas, para levar saúde, educação e segurança aos povos. Esta missão solidária que a ilha caribenha desenvolve, não encontra paralelo na história.

Para se ter idéia, também na Nicarágua, nos últimos três anos, quase meio milhão de crianças e adultos foram alfabetizados, também com a ajuda dos educadores cubanos. E só para lembrar, depois do triunfo da revolução em 1959, não demorou um ano para que Cuba estivesse totalmente livre do analfabetismo. Hoje, passados mais de 50 anos da consolidação de um governo socialista esse caráter internacionalista segue cada vez mais firme.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Mais de 50 entidades manifestam apoio ao MST de Santa Catarina

Mais de 50 entidades sindicais, representantes de universidades, professores, partidos políticos, deputados e juristas participaram, na tarde desta sexta-feira (29), do ato de apoio ao MST de Santa Catarina. A atividade condenou a prisão arbitrária do coordenador do MST de SC, Altair Lavratti, do militante Rui Fernando da Silva Júnior, e da líder comunitária Marlene Borges. Lavratti foi algemado e preso em Imbituba, quando participava de uma reunião com catadores de material reciclado, num galpão, na noite de quinta-feira. Marlene e Rui foram presos na manhã de sexta-feira, depois de se apresentarem voluntariamente. Rui também foi algemado.

As acusações envolvem esbulho possessório (tomada violenta de um bem), formação de quadrilha e incitação à violência, e segundo a PM, foram “preventivas”, ou seja, para evitar que os supostos crimes fossem cometidos. As investigações começaram em dezembro, no entanto, há mais de 10 anos o MST participa de encontros com a comunidade local, informando as famílias sobre seus direitos.

A área de 200 ha, principal motivação das ações, pertence ao Governo Federal e foi cedida ao Governo do Estado para formação de uma Zona de Processamento de Exportações (ZPE) em 1996, no entanto, desde então está abandonada. “O objetivo das reuniões era informar as pessoas sobre seus direitos e mostrar que o MST está solidário às lutas das famílias exploradas também nas cidades”, explicou o coordenador do MST, Lucídio Ravanello. O problema, segundo a comunidade local, é a privatização dos espaços, sem chance para que as famílias possam utilizar-se de uma área que é pública.

Denúncias descabidas

Uma das acusações que causou revolta ao MST é a denúncia, por parte da PM, de que pessoas estariam recebendo dinheiro para participar de mobilizações na região de Imbituba. “Isso nunca ocorreu. É um absurdo gigantesco que não tem qualquer cabimento. Respeitamos a vontade da comunidade local e é só. Gostaríamos de saber de onde a polícia tirou esse tipo de calúnia”, afirmou Ravanello, que desafiou a PM a apresentar provas de que esse tipo de ação ocorreu.

Prisões arbitrárias e ilegais

Juristas presentes ao ato destacaram as prisões como arbitrárias e ilegais, pela utilização de escutas consideradas criminosas pela Organização dos Estados Americanos (OEA), pelo uso indiscriminado de algemas, além do conflito de competências em razão da investigação realizada por uma polícia cuja atividade é amplamente questionada dentro do próprio sistema de segurança – a P2, serviço de inteligência da Polícia Militar de SC. “Acredito que esse é o momento de começarmos aqui uma discussão muito mais ampla, sobre as razões e motivações desses casos de criminalização que se repetem em diversos estados”, afirmou o doutor em direitos humanos e desenvolvimento, advogado Prudente José Silveira Mello, também conselheiro do Comitê de Anistia do Ministério da Justiça.

Em 6 de agosto de 2009, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA divulgou sentença condenando o Brasil pelo uso de interceptações telefônicas ilegais, em 1999, contra associações de trabalhadores rurais ligadas ao MST no Paraná. O Estado brasileiro foi considerado culpado pela instalação dos grampos, pela divulgação ilegal das gravações e pela impunidade dos responsáveis.

Prudente ainda destaca que Altair Lavratti não teve respeitado o direito de contatar um familiar ou qualquer conhecido, para informar sobre sua prisão. Autoridades locais, advogados e representantes do MST somente conseguiram localizar Lavratti às 8h da manhã da sexta-feira, quase 10 horas depois da prisão. “Ele foi isolado de forma ilegal. Ninguém o encontrava em qualquer local e as autoridades não informavam sobre onde ele poderia estar”, disse.

Em nota, o movimento em SC destaca que “a prisão de homens e mulheres ligados ao MST, além de líderes comunitários, quando realizavam uma reunião com integrantes da comunidade, em Imbituba, demonstra uma faceta controversa do Estado, do poder policial e de uma parcela do judiciário. Estas pessoas foram detidas mesmo sem cometer qualquer crime, apenas pelo fato de trabalharem junto às famílias no esclarecimento de seus direitos enquanto cidadãos e cidadãs.”

Outra questão controversa do episódio é a participação do Ministério Público nas investigações. Foi o MP quem solicitou à justiça a quebra do sigilo telefônico de integrantes do MST, e também quem organizou, junto da PM, a prisão preventiva dos representantes do movimento. “O MST, como já ocorreu com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), é vítima de uma ação orquestrada que utiliza como artifício a prisão “preventiva” por “suspeita de invasão”. Para a polícia e para o poder judiciário, pelo que se entende a partir desta ação, reuniões que envolvam sindicalistas e lutadores sociais passam a ser “suspeitas” e, sendo assim, são passíveis de interrupção e prisão”, destaca o movimento na nota divulgada na manhã de sexta-feira.

Durante o ato, os representantes de mais de 50 entidades assinaram uma moção de apoio ao MST, e de repúdio à ação da Polícia Militar e do Judiciário.